Título: 2006 será um ano decisivo para as PPPs
Autor: José Virgílio Lopes Enei
Fonte: Valor Econômico, 18/01/2006, Legislação & Tributos, p. E2

"Se os primeiros projetos forem executados com sucesso, a PPP deverá se consolidar no país"

Após meses de calorosos debates no Congresso Nacional, a lei federal que disciplina as Parcerias Público-Privadas (PPPs) - a Lei nº 11.079/2004 - já foi aprovada e completa um ano. Mais antiga, a Lei nº 14.868 de Minas Gerais - precursora das PPPs no país - completou dois anos, sendo seguida de perto pela legislação de São Paulo. No entanto, nenhuma PPP foi ainda concedida à iniciativa privada. A demora na implantação das PPPs é, contudo, natural. Mesmo na Inglaterra, onde as PPPs surgiram e experimentaram maior sucesso, pouquíssimos projetos foram implementados nos primeiros anos (um projeto no ano de 1987, nenhum projeto em 1988 e 1989 e apenas dois projetos em 1990). Com muito mais razão, tal implantação haveria de demorar no Brasil, onde as estruturas precisam ser mais complexas e as garantias mais fortes para compensar a menor credibilidade do governo e sua menor capacidade orçamentária. Isso para não falar na instabilidade política pela qual passamos neste último ano, o que, por si só, seria suficiente para fulminar qualquer programa governamental de maior ambição. Apesar de toda a instabilidade política e a proximidade das novas eleições, as PPPs vêm resistindo e já se revelam os primeiros projetos a serem licitados. Após passar por uma audiência pública, o edital e a minuta de contrato de PPP da Linha 4 do Metrô de São Paulo foram submetidos a um processo de consulta pública para colher contribuições de interessados e da sociedade em geral, tal como previsto na lei federal das PPPs. Concluída a consulta pública e analisadas as contribuições oferecidas, o edital de licitação foi publicado em 22 de dezembro passado, prevendo a entrega de propostas em 21 de março de 2006. O projeto da Linha 4 do Metrô de São Paulo, concebido sob a égide da lei federal das PPPs e da Lei nº 11.688 paulista, foi estruturado como uma PPP na modalidade concessão patrocinada, onde parte substancial das receitas do parceiro privado incumbido da operação e manutenção da linha, assim como do fornecimento do material rodante, advém da tarifa paga pelos próprios usuários, cabendo ao governo estadual complementar a tarifa caso ela fique defasada em relação a uma certa tarifa de referência (R$ 2,08 por passageiro), corrigida pela média do IGPM e do IPC-Fipe, nos primeiros 15 anos de operação, e apenas pelo IPC-Fipe a partir de então. Além disso, a depender das propostas formuladas, o governo poderá ser chamado a pagar uma contraprestação pecuniária adicional ao parceiro privado, dividida em 48 parcelas e limitada a R$ 120 milhões. A menor contraprestação exigida do poder concedente ou, alternativamente, o maior desconto oferecido em seu favor sobre as tarifas pagas pelos usuários, será classificada em primeiro lugar, passando-se então ao exame de sua habilitação, dentro do critério de inversão de fases autorizado pela lei federal das PPPs. Assim, a Linha 4-Amarela do Metrô de São Paulo se apresenta como um marco na história das PPPs no Brasil, constituindo o primeiro projeto de PPP a ser licitado.

Na Inglaterra, onde as PPPs surgiram, pouquíssimos projetos foram implementados nos primeiros anos

Paralelamente, o Estado de Minas Gerais já submeteu a consulta pública a minuta de edital e contrato do que provavelmente será a primeira PPP no setor rodoviário, compreendendo a recuperação e manutenção da Rodovia MG-050, com previsão para a publicação do edital em 16 de janeiro próximo. A MG-50 foi também estruturada como uma concessão patrocinada, integrando a remuneração do parceiro privado a cobrança do pedágio, fixado em R$ 3,00 por praça de pedágio, e uma contraprestação adicional limitada a R$ 30 milhões por ano e garantida pela Codemig, empresa estatal dotada da função de garantidora. Embora tenha largado um pouco atrás, com sua lei de PPPs aprovada apenas em dezembro de 2004 (a Lei nº 9.290), o Estado da Bahia já concluiu o processo de consulta pública de seu primeiro edital e contrato de PPP, desta vez no setor de saneamento básico, tendo por objeto a construção, operação e manutenção do Sistema de Disposição Oceânica do Jaguaribe (incluindo emissário submarino). Este projeto, que será contratado pela Empresa Baiana de Águas e Saneamento (Embasa), constituirá a primeira PPP na modalidade concessão administrativa, em que o serviço é prestado diretamente ao poder concedente, advindo deste 100% da remuneração devida ao parceiro privado. Tal contraprestação se dará na forma de cessão de recebíveis detidos pela Embasa ao parceiro privado. Além desses projetos que já se encontram estruturados e em fase de licitação ou consulta pública, diversos outros projetos vêm sendo anunciados e podem reforçar as estatísticas de PPPs ainda para o ano de 2006. Em nível federal, destacam-se os projetos de recuperação, manutenção e extensão do segmento baiano da Rodovia BR-116 - sendo estudado por meio de um convênio firmado entre o Ministério do Planejamento, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e International Finance Corporation (IFC), afiliada do Banco Mundial para empréstimos ao setor privado - e projetos de irrigação como o Baixio de Irecê e Pontal, já avançados em sua estruturação. Forte candidata, a Ferrovia Norte-Sul foi retirada do programa de PPPs por se entender que a mesma poderia ser viável dentro do regime comum de concessões de serviço público, com maiores responsabilidades à iniciativa privada e menor custo ao setor público. Todos esses projetos fazem-nos acreditar que 2006 será um ano decisivo para as PPPs. Se os primeiros projetos forem licitados e executados com sucesso, a PPP deverá se consolidar e proliferar no país, em todas as esferas de governo. Considerando o bom momento econômico que vive o Brasil, não abalado sequer pela crise política, é uma oportunidade que não pode ser mais uma vez perdida.