Título: Canhedo diz estar disposto a aceitar o fim dos vôos da Vasp
Autor: Daniel Rittner
Fonte: Valor Econômico, 09/11/2004, Empresas, p. B-3

O empresário Wagner Canhedo refletiu muito no último fim de semana e decidiu: está disposto a enxugar as atividades da Vasp e até mesmo a aceitar o fim das suas operações caso o governo insista muito nessa possibilidade. "Se isso fizer parte de uma solução que reestruture todo o setor, estamos dispostos", disse Canhedo ao Valor, durante a solenidade de posse do ministro da Defesa, José Alencar, no Palácio do Planalto. "Estou aberto a todas as possibilidades", ressaltou. A afirmação do empresário indica o reconhecimento da gravidade da crise pela qual atravessa a Vasp. Na sexta-feira, vários vôos saindo do aeroporto de Brasília foram cancelados. Fontes do mercado dizem que, por causa da dificuldade em pagar à vista o fornecimento de combustível e depositar antecipadamente as taxas aeroportuárias à Infraero, a empresa passou o dia operando com apenas dois aviões. Canhedo deixou claro, no entanto, que ainda lutará pela recuperação da Vasp e negociará com o governo o mesmo tipo de tratamento dispensado à Varig. "O que for dado a uma, tem que ser dado à outra", argumenta. Ele acredita que o governo deve anunciar medidas para revitalizar todo o setor aéreo, sem discriminação. "Senão, o plano não se viabiliza juridicamente." Para o empresário, é perto de zero a possibilidade de parar por completo as atividades da companhia aérea. Mas a empresa terá de recuperar o apoio dos agentes de viagens, "que viraram as costas para a Vasp", segundo afirma o vice-presidente comercial, Rodolpho Canhedo, ao próprio boletim informativo da companhia, divulgado no fim de semana. De acordo com ele, os agentes representam 70% das vendas de passagens e poderiam estar demonstrando mais solidariedade. Com a crise dos últimos meses, as vendas de bilhetes aéreos caíram de R$ 3 milhões por dia para R$ 800 mil. Depois que a Associação Brasileira dos Agentes de Viagens (Abav) mandou uma carta aos associados pedindo apoio à Vasp, as vendas subiram para R$ 1,6 milhão por dia. Mas já voltaram a cair para menos de R$ 1 milhão, segundo o informativo. Números divulgados ontem pelo Sindicato Nacional das Empresas Aéreas (Snea) reforçam o drama. A participação da Vasp no mercado de vôos domésticos diminuiu de 8,8% em setembro para 4,47% em outubro. No mesmo período do ano passado, a companhia ocupava 11% do mercado. Também a taxa de ocupação despencou. De cada cem lugares nos aviões da Vasp, somente 49 têm saído ocupados. Os passageiros migraram principalmente para a TAM e a Gol, que viram sua participação no mercado doméstico crescer significativamente no mês passado. A fatia da Gol subiu de 22,03% em setembro para 22,83% em outubro. Os números da TAM apontam aumento para 39,09% - índice mais de três pontos percentuais superior ao de setembro. A quantidade de passageiros nos vôos domésticos, como um todo, teve crescimento de 11,9% nos dez primeiros meses do ano. Ao transferir o cargo de ministro da Defesa para o vice-presidente José Alencar, o embaixador José Viegas mencionou o controle da oferta de vôos e o aumento da taxa de ocupação do setor - de 58% há dois anos para 68% atualmente - como indicadores de recuperação da aviação civil. Enquanto isso, já está à disposição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva um pacote de medidas para revitalizar a saúde financeira das empresas aéreas. Até agora, as concorrentes não foram sondadas para participar do capital acionário da nova Varig. O próprio Viegas, ainda no cargo, havia afirmado em entrevista a intenção de chamar as demais companhias para entrar na reestruturação da Varig. Os presidentes das empresas uniram o discurso e disseram estar dispostos a conversar com o governo sobre isso, como concessionárias de serviço público, embora enumerem restrições práticas para concretizar essa participação. "Se houver um chamamento do governo, vamos sentar e conversar", afirmou um empresário do setor, frisando que é difícil falar sobre o assunto por tratar-se de mera conjectura. O presidente da OceanAir, German Efromovich, disse que não foi sondado pelo governo para ter qualquer tipo de participação na nova Varig. O diretor-presidente da BRA Transportes Aéreos, Humberto Folegatti, adiantou-se a um eventual convite. "Nenhuma empresa vai fazer investimento em uma companhia com passivo tão grande, que pode superar inclusive o patrimônio de quem fizer esse investimento", raciocinou. Em outubro, a Varig alcançou participação de 31,98% no mercado doméstico - avançando quase meio ponto percentual em relação a setembro, mas mantendo-se abaixo da líder TAM. Nos vôos internacionais, porém, a Varig segue bem à frente: tem mais de 85% do mercado. Nesse segmento, o número de passageiros transportados cresceu 7,6% nos dez primeiros meses do ano.