Título: Clima em Vila Velha é de tensão e insegurança
Autor: Assis Moreira e Juliano Basile
Fonte: Valor Econômico, 07/10/2004, Empresas & Tecnologia, p. B-1

O clima de tensão não é exclusivo dos corredores do Cade, em Brasília. A cerca de 1200 quilômetros dali, em Vila Velha (ES), o ambiente está tão ou mais nervoso. Angústia e preocupação são palavras recorrentes para definir o que se passa com os quase 3 mil funcionários da Garoto. Os últimos tempos não têm sido fáceis para eles. A indefinição começou em 1998, com o desentendimento da família fundadora da empresa. Depois de enfrentar uma cisão do grupo controlador e de mudanças no comando, em fevereiro de 2002 a Nestlé comprou a empresa capixaba. Não tardou e três multinacionais - a Kraft, Cadbury e Mars - iniciaram uma oposição insistente à Nestlé. Dois anos e oito meses depois, o Cade determina que a Nestlé venda a Garoto. Oficialmente, a empresa não se manifesta por determinação da Nestlé, a porta-voz do caso. Os funcionários não falam - por medo de perder o emprego, fala-se nos bastidores. Embora tenha colocado alguns dos seus gestores na Garoto, a Nestlé não fez grandes alterações na estrutura administrativa desde que adquiriu a empresa, até por conta da indefinição do Cade. Foram feitas apenas mudanças pontuais. "Os funcionários que já vinham de um processo desgastante por conta do desentendimento da família, tinham uma expectativa de melhora rápida, o que não aconteceu", afirma fonte próxima. "A Nestlé chegou com uma postura de superioridade", diz. Segundo a Nestlé, a Garoto melhorou depois que foi comprada pela multinacional suíça. De acordo com informações divulgadas pela empresa, o faturamento saiu de R$ 598 milhões em 2001 para R$ 858 milhões em 2003. O número de países para os quais a Garoto exporta saiu de 35 para 56 e o número de funcionários subiu de 2.361 para 2.537 de 2001 para 2003. O que preocupa e gera insegurança entre os funcionários é a manutenção dos empregos. "Tem gente que prefere que a Garoto seja comprada por uma empresa sem uma grande estrutura no Brasil para que, de fato, não haja cortes", diz a fonte. O posicionamento do sindicato é favorável à multinacional suíça. "Não defendemos a Nestlé, mas a estabilidade que existe hoje na empresa", diz Linda Morais, presidente do Sindialimentação. "Se for vendida para outra multinacional, queremos que a empresa seja mantida nos mesmos moldes." O sindicato classificou de insensata a decisão do Cade, em função do tempo que levou para se posicionar. "A Nestlé melhorou o resultado da Garoto, o medo agora é que ela deixe de cuidar da empresa por não saber se vai ficar com ela ou não", afirma a presidente do sindicato. "O clima é de ansiedade e insegurança por não sabermos quanto tempo isso vai levar."