Título: Acordo garante pacote de US$ 700 bi
Autor: Balthazar, Ricardo
Fonte: Valor Econômico, 29/09/2008, Finanças, p. C1

O ambicioso programa de socorro ao sistema financeiro proposto pelo governo americano ganhou um empurrão ontem, quando líderes dos dois partidos que controlam o Congresso dos Estados Unidos e os dois candidatos à eleição presidencial de novembro alcançaram um acordo para introduzir diversas mudanças no projeto.

O plano autoriza o Tesouro dos EUA a gastar US$ 700 bilhões para adquirir títulos associados a hipotecas e outros papéis de valor duvidoso que geraram a crise de confiança que travou os mercados de crédito há duas semanas. O governo acredita que dessa forma conseguirá restaurar a credibilidade dos bancos e estabilizar o sistema financeiro.

O coração do plano original do governo foi preservado e o Tesouro terá grande liberdade para executar o programa, contratando gestores privados para ajudá-lo a avaliar os ativos que serão adquiridos. Mas as modificações feitas pelo Congresso submetem o Tesouro a novos organismos de supervisão e estabelecem limites para a remuneração dos executivos das instituições financeiras que receberem ajuda.

O pacote estabelece ainda que dentro de cinco anos o governo poderá cobrar diretamente das instituições que entrarem no programa compensações pelas perdas que os cofres públicos poderão sofrer. O projeto determina que o governo calcule o prejuízo quando a hora chegar e proponha ao Congresso mecanismos capazes de recuperar as perdas.

O Tesouro poderá se desfazer a qualquer momento dos ativos que comprar por meio do programa. O governo acredita que dentro de alguns anos, depois que a poeira baixar, será possível vender em melhores condições os papéis que forem adquiridos agora. O mesmo poderá acontecer com as ações que o Tesouro receber das instituições que forem beneficiadas pelo programa.

Os US$ 700 bilhões destinados ao pacote serão liberados pelo Congresso em três etapas. Os primeiros US$ 250 bilhões ficarão disponíveis após a aprovação do projeto e US$ 100 bilhões sairão logo em seguida, depois que o governo cumprir uma formalidade prevista no projeto. O restante vai depender da análise que os congressistas farão de um plano detalhado que o Tesouro terá que apresentar para dizer como executará o programa.

A versão final do projeto, resultado de uma semana de negociações entre o governo e os congressistas, foi divulgada no início da noite no site da Comissão de Serviços Financeiros da Câmara de Representantes dos EUA. A procura pelo documento foi tão grande que o site ficou fora do ar por algumas horas. O plano original do governo tinha três páginas. A versão final produzida pelo Congresso tem 110.

Os líderes do Partido Democrata, que faz oposição ao governo do presidente George W. Bush e tem o controle do Congresso, esperam reunir o apoio necessário para aprovar o pacote no plenário da Câmara hoje e acreditam que ele passará no Senado ainda nesta semana, antes que os congressistas entrem em recesso para se dedicar à campanha eleitoral nos Estados.

"O acordo vai funcionar e será eficaz no mercado", disse o secretário do Tesouro dos EUA, Henry Paulson, ao anunciar o desfecho das negociações ao lado de líderes partidários nos primeiros minutos da madrugada de ontem. "Não fico feliz com essa situação toda, mas agora temos algo que podemos defender", disse a presidente da Câmara, a democrata Nancy Pelosi.

Congressistas republicanos que lideraram a oposição ao pacote nos últimos dias disseram ter ficado satisfeitos com o resultado final depois de examinar os detalhes do projeto. Mas os líderes do partido foram dormir sem saber se teriam como garantir os votos necessários para aprová-lo hoje no plenário.

Os candidatos presidenciais dos dois partidos manifestaram apoio ao pacote. "Isto é algo que todos nós vamos ter que engolir a seco e seguir em frente", afirmou o senador John McCain, candidato do Partido Republicano, em entrevista a um programa de televisão pela manhã. "Temos um plano que inclui proteções para os contribuintes", disse o senador democrata Barack Obama, num comício em Detroit. "E parece que vamos aprovar esse plano muito em breve."

Nas negociações dos últimos dias, os democratas enfatizaram especialmente a necessidade de impor limites à remuneração dos executivos dos bancos. Eles acreditam que isso poderá facilitar a aprovação do projeto no plenário, diminuindo a rejeição com que o pacote foi recebido pelo eleitorado e assim deixando os congressistas mais à vontade para aprová-lo. O Tesouro teme que as restrições reduzam o interesse das instituições em participar do programa.