Título: Posse de Chávez adiada
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Fonte: O Globo, 09/01/2013, Mundo, p. 25

Cerimônia de juramento não é remarcada; oposição pede intervenção da Justiça

A apenas um dia da posse de Hugo Chávez para o quarto mandato, marcada para amanhã, o governo da Venezuela admitiu que o presidente não poderá comparecer ao juramento perante a Assembleia Nacional. Numa carta aos congressistas, o vice-presidente venezuelano, Nicolás Maduro, pediu que a posse seja adiada - mas sem estabelecer qualquer data para a realização da cerimônia. E a determinação promete acirrar ainda mais as tensões entre governo e oposição, imersos numa disputa sobre as interpretações da Constituição em caso de ausência do chefe de Estado no dia da posse. A batalha também elevou ao centro do debate político o Tribunal Supremo de Justiça (TSJ), pressionado a emitir um parecer claro sobre as divergentes interpretações do Artigo 231 da Carta, que regula a abertura de seu novo mandato.

"O comandante nos pediu para informar que, de acordo com as recomendações da equipe médica, o processo de recuperação pós-cirúrgica deverá se estender para além do dia 10 de janeiro", dizia o texto da carta enviada por Maduro e lida pelo presidente da Assembleia Nacional, Diosdado Cabello, aos deputados.

TSJ PENDE PARA O PRESIDENTE

Enquanto a bancada governista irrompia em aplausos, a minoritária oposição mantinha-se em silêncio. Afinal, o posicionamento oficializa o que já vinha se delineando dentro do governo bolivariano: Chávez continuaria no cargo, numa extensão do atual mandato, até recuperar-se e voltar de Cuba. Para os aliados do presidente, a cerimônia de posse na Assembleia Nacional é uma mera formalidade e pode ser cumprida posteriormente, diante do TSJ.

O país ainda espera uma definição sobre quem, de fato, vai governar a Venezuela a partir de amanhã. À tarde, porém, o chavismo teve a primeira vitória quando o TSJ deu o parecer sobre uma das três petições relativas às interpretações do artigo polêmico: o juiz Francisco Carrasquero declarou inadmissível que Cabello assuma a Presidência temporariamente.

Todas as interpretações distintas acerca da ausência do presidente se devem, principalmente, a uma lacuna no Artigo 231 da Carta Magna. O texto diz que o presidente eleito deve tomar posse no dia 10 de janeiro após o pleito e, se por algum imprevisto, isso não for possível, o juramento pode, então, ocorrer no Supremo Tribunal de Justiça. Os chavistas alegam que, como o artigo não especifica data nem local para a posse diante do TSJ, a cerimônia poderia ser feita numa ocasião posterior.

A oposição, por sua vez, insiste em outra interpretação. O bloco anti-Chávez acredita que a data da posse é uma só e não pode ser alterada. Ou seja, Chávez tem que assumir no dia 10 se quiser continuar sendo presidente. E, para os opositores, o correto seria o presidente da Assembleia Nacional - no caso, Cabello - assumir o cargo interinamente por 90 dias que podem ser estendidos por mais 90 com a declaração da ausência temporária de Chávez.

Ontem, o governador do estado de Miranda e líder da oposição, Henrique Capriles, pediu que a Justiça se posicionasse claramente. Mas, diante de um Poder de orientação predominantemente chavista - amplamente denunciado até por organismos internacionais pela falta de independência - crescem, ainda, os rumores de manobras para perpetuar o chavismo e aniquilar de vez a oposição. Segundo o diário espanhol "El País", no último dia 6 de dezembro, foram destituídos sete dos 32 magistrados do TSJ. O grupo, formado pelos mais antigos juízes da instituição, era considerado também o mais independente. Eles foram afastados sem sequer esperar a nomeação de seus sucessores, conforme a tradição. E o governo, à ocasião, assegurou que "não haveria surpresas nas considerações sobre o comandante Chávez".

- Não há nada novo, certo? Aqui há um fato muito importante, que é a continuidade do mesmo presidente, por uma reeleição, certo? - indagara a juíza Luisa Estella Morales, presidente do TSJ e partidária de Chávez, sem esconder a inclinação do Judiciário.

OPOSIÇÃO FALA EM GOLPE E PEDE AJUDA EXTERNA

O principal bloco opositor venezuelano, a Mesa de Unidade Democrática (MUD), enviou uma carta à Organização dos Estados Americanos (OEA) alertando para os riscos de "uma ruptura democrática" no país. A indignação cresceu após o anúncio do adiamento indeterminado da posse de Chávez. O deputado Omar Barboza, líder do partido opositor Um Novo Tempo, questionou o porquê de os governistas não aceitarem a nomeação temporária de Cabello:

- Se (Chávez) não for juramentado, continua sendo o presidente (eleito), mas é necessário buscar uma solução que respeite sua condição sem deixar a Constituição vulnerável e respeite a vontade popular. Evidentemente há uma ausência temporária irremediável e, se há ausência temporária, o presidente da Assembleia Nacional deve se encarregar da Presidência enquanto o presidente Chávez estiver ausente.

Pelo Twitter, o prefeito da região metropolitana de Caracas, Antonio Ledezma, uma das principais vozes da oposição, pediu ajuda externa: "Aos países do mundo que devem apoiar as democracias, alertamos que na Venezuela está se desenvolvendo um golpe de Estado!"