Título: 2011 é incógnita
Autor: Vidor, George
Fonte: O Globo, 09/05/2011, Economia, p. 16

Economia não é uma ciência exata (talvez até não seja apropriado classificá-la como ciência), pois embute paradoxos ainda não decifrados. O passado, retratado em séries estatísticas, permite aos economistas interpretar o que aconteceu e se aventurar a projetar o futuro com base nessa experiência. No entanto, a margem de erro costuma ser muito elevada.

Os paradoxos de mais difícil solução são aqueles relacionados à passagem para o desenvolvimento. Uma economia só cresce de maneira sustentável, como se diz, se contar com investimentos, que, por sua vez, somente se viabilizam com poupança prévia - por definição, é a parte da renda não consumida. Ora, se o subdesenvolvimento é caracterizado por insuficiência de renda e incapacidade para poupar, como então superar esse paradoxo?

Exemplos mais recentes de crescimento rápido tiveram como ponto de partida um empurrão vindo de fora exatamente pela dificuldade de se promover, no plano doméstico, os investimentos necessários à decolagem. A China passou a crescer aceleradamente quando o investimento em Hong Kong "transbordou" para a zona econômica especial vizinha. É claro que havia uma série de outros fatores que viabilizaram esse "transbordamento", que ganhou força própria a partir de determinado momento.

A economia brasileira está hoje também diante desse dilema. Precisa investir para ganhar eficiência - mas esse investimento contribui para pressionar a demanda interna e os preços domésticos, causando uma inflação preocupante. Qual é a fórmula segura para resolver o problema? Sem crescimento não se vence o subdesenvolvimento, mas esse processo também é incompatível com inflação em alta (e para amortecê-la geralmente é preciso crescer menos). Essa discussão, antiga, nunca foi superada no Brasil: basta se comparar as diferentes opiniões nos artigos sobre economia que saem nos jornais, revistas e outras publicações.

É meio bizantina, porque normalmente as saídas não são visíveis e só aparecem - quando aparecem - com a própria dinâmica da economia. O Comitê de Política Monetária (Copom), que se reúne a cada 45 dias, não raramente se depara com um cenário distinto do anterior, como um caleidoscópio.

Desse modo, a batalha contra a inflação não pode ser dada como perdida, e nem como ganha. Por essas e outras, o crescimento da economia em 2011, em pleno mês de maio, permanece ainda uma incógnita.

Em seus comentários sobre a miséria, Darcy Ribeiro citava o exemplo da Índia - na época, ainda mergulhada em um quadro assombroso de pobreza - onde em algumas grandes cidades (Calcutá, principalmente) gerações nasciam, viviam e morriam nas ruas, sem jamais pôr os pés em uma casa. Embora em menor escala, o Brasil, depois de décadas de crise econômica e social, também se defronta com esse drama. Mesmo com a economia aquecida, e as oportunidades de empregos e estudo se multiplicando, não são poucas as pessoas que não conseguem aproveitar os ventos favoráveis. Poucos dias após o governo divulgar a geografia da extrema pobreza e sua intenção de erradicá-la, presenciei uma cena comovente, passando pela Rua Mena Barreto (Botafogo, Zona Sul do Rio), ao lado da sede de Furnas Eletrobras: ao meio-dia, com tempo nublado e ameaça de chuva, um jovem casal (creio que na faixa dos 20 anos) se deitava num colchão velho e sujo, com um cachorro ao lado, e no meio dos dois um bebê recém-nascido. Tomara que os pais e essa criança encontrem um caminho para sair das ruas.

Nas ruínas da então próspera Éfeso (hoje o mar está a oito quilômetros de distância, pois o porto e o canal de entrada foram assoreados já na Antiguidade, o que levou ao abandono da cidade), é possível identificar os sistemas de distribuição de água e coleta de esgoto construídos pelos romanos, que consideravam esses serviços uma marca do império. Onde chegassem teria de haver necessariamente saneamento básico.

O desprezo que ainda temos por aqui pelo saneamento - como mostraram, mais uma vez, os dados do Censo de 2010 - vem do período colonial, como herança da Idade Média na Europa, quando a sujeira imperava nas cidades.

Em termos de coleta de esgoto, seria melhor voltarmos à Antiguidade...

Meu entusiasmo com a Turquia foi tanto que acabei atribuindo a ela, na coluna passada, um fato histórico que não ocorreu lá: evidentemente que Leônidas enfrentou os persas nas Termópilas (hoje Grécia continental) e não no estreito de Dardanelos. Na mesma confusão, vale esclarecer que Marco Antonio e Cleópatra desafiaram Augusto e não Júlio César (devo ter pensado no filme; sempre acho que o ator Rex Harrison interpretou Júlio César...).

Em compensação, deixei de mencionar Tróia e o famoso cavalo, Helena, o príncipe Páris, Aquiles...

A Câmara dos Vereadores do Rio promoveu na semana passada mais um seminário sobre as perspectivas das empresas de tecnologia da informação no município. É mais um capítulo de uma novela que se arrasta há vários anos em torno de um projeto para reduzir a alíquota de ISS sobre o setor. O projeto foi aprovado em primeira votação, mas, para entrar em vigor, precisa de uma segunda rodada, que nunca entra em pauta. Os mercados do Sul e do Sudeste respondem por cerca de 90% do faturamento com tecnologia da informação no país. São Paulo fica com cerca da metade e o Rio entra em segundo lugar, mas vem reduzindo sua participação percentual, porque cidades como Porto Alegre, Florianópolis, Curitiba e Belo Horizonte diminuíram alíquotas de ISS e têm programas de incentivo para a área.

O Rio cobra o mesmo imposto que São Paulo. Logo...