Título: Alerta contra corantes
Autor: Marinho, Antônio
Fonte: O Globo, 31/03/2011, Ciência, p. 34

Aditivos em alimentos são ligados à hiperatividade infantil DOCES, balas, sucos e cereais são alguns dos alimentos que levam corantes artificiais, que, segundo especialistas, podem causar alteração de comportamento e alergia em crianças; e FDA discute o que fazer Antônio Marinho* Alimentos que levam corantes artificiais, um dos aditivos mais usados, estão na mira do FDA, o órgão do governo americano responsável pelo controle de alimentos e medicamentos. Isto porque aumentou o número de queixas relacionando o consumo de gelatinas, cereais, sucos e balas, entre outras guloseimas, a sinais de hiperatividade na infância e não só em crianças que já sofrem de alterações de comportamento, segundo reportagem no jornal "The New York Times". O uso de corantes artificiais (existem os naturais) é polêmico. De um lado, cientistas tentam mostrar que eles podem ser nocivos à saúde das crianças, piorando distúrbios de comportamento e alergias. Do outro, pesquisadores da indústria afirmam o contrário. E o FDA ainda não tem posição definida a respeito do tema. Mas, pressionado por organizações de defesa do consumidor, o órgão reuniu especialistas para aprofundar o debate. Dependendo dos resultados desse painel, que começou ontem, o FDA poderá pedir a revisão dos dados sobre o emprego de corantes ¿ e determinar medidas como incluir alerta sobre os riscos à saúde nas embalagens. Isso indicaria mudança da parte do órgão, que até hoje não via problemas nos corantes artificiais, muitos deles fabricados a partir de alcatrão de carvão e derivados de petróleo. Há mais de um século a questão preocupa o o governo americano, em parte porque alguns corantes sintéticos tóxicos foram usados no início do século para disfarçar a aparência de alimentos impróprios para consumo. Em 1950, crianças adoeceram depois de comerem balas contendo corante Orange nº 1. Na época, o FDA baniu a substância. Em 1976, foi a vez de o Red nº 2 sair do mercado por suspeita de ser cancerígeno. Muitos dos corantes usados hoje foram aprovados pelo FDA em 1931, incluindo o Blue nº 1, Yellow nº 5 e Red nº 3. Ainda nos anos 70, o pediatra Benjamin Feingold tratou os sintomas de hiperatividade em crianças com dieta que, entre outras coisas, eliminava corantes sintéticos. E em 2007, estudo na revista "Lancet", realizado na Universidade de Southhampton e no Imperial College de Londres, concluiu que "os corantes artificiais resultavam em aumento de hiperatividade em crianças". Para alguns pais americanos, os corantes parecem ser a causa principal de hiperatividade. Segundo Renee Shutters, seu filho Trenton, então com 5 anos, tinha grave problema de comportamento na escola até que ela eliminou corantes artificiais da dieta dele. ¿ Tenho certeza que encontrei a raiz do problema, porque você pode ligar e desligá-lo como se tivesse um interruptor ¿ contou. Pesquisadores sugerem que problemas com corantes podem ser semelhantes à alergia ao amendoim, ou são causados por intolerância específica para essas substâncias, e não devido a efeitos neurotóxicos. Mesmo assim, é quase certo que o painel pedirá mais pesquisas. Porém, investigar comportamentos na infância é difícil e custoso, pois requer avaliações periódicas e subjetivas por pais e professores. E como as patentes de corantes expiraram faz tempo, os fabricantes têm pouco interesse em financiar esse estudo. Reação alérgica não foi comprovada Mario Geller, professor visitante da Divisão de Alergia e Imunologia da Universidade Northwestern, diz que nos anos 70 acreditava-se na associação do corante artificial amarelo, o tartrazina, um dos mais conhecidos, com alergias e piora de asma e urticária. Houve quem afirmasse que alérgicos ao corante tinham reação ao ácido acetilsalicílico, mas estudos posteriores não comprovaram isso: ¿ Não se deve fazer conclusão precipitada ¿ diz Geller, lembrando que o pesquisador Ronald Simon acompanhou mil pacientes em estudo controlado com placebo e nada foi confirmado. ¿ A hiperatividade é influenciada por outros fatores, como o ambiente ¿ afirma. * Com The New York Times e agências internacionais PARA QUE SERVEM: Os corantes artificiais são aditivos sem valor nutritivo, usados em alimentos industrializados, como cereais, doces, geleias, bolos e bebidas, entre elas sucos e refrigerantes. A sua função é colorir os alimentos tornando-os mais atrativos e melhorando sua aceitação. Entre os mais conhecidos aqui estão tartrazina, amarelo crepúsculo, azul brilhante, vermelho bordeaux e vermelho eritrosina. Existem ainda corantes naturais, como carmin, urucum e cúrcuma; e o caramelo, obtido a partir de açúcares. PERIGO PARA SAÚDE: Segundo o pediatra Wellignton Gonçalves Borges, do Departamento de Alergia e Imunologia da Sociedade Brasileira de Pediatria, não há estudo conclusivo relacionando o consumo de corantes à hiperatividade e a alergias na infância. Ele reforça que isso é muito raro, lembrando que a alergia a laticínios é mais comum, atingindo quase 2% das crianças. Mais perigoso na infância, diz médico, são os agrotóxicos e o consumo de açúcar.