Título: Dividir para colher depois
Autor: Foreque, Flávia
Fonte: Correio Braziliense, 11/07/2009, Brasil, p. 12

Programa do governo que pretende conceder áreas da Amazônia à exploração da iniciativa privada quer arrecadar R$ 7 milhões por mês. Ideia é partilhar 2 milhões de hectares

Floresta Amazônica: dos 198,5 milhões de hectares em todo o país, apenas 12 milhões podem ser convertidos em unidades de manejo florestal

O governo federal pretende, até o fim de 2010, licitar dois milhões de hectares de florestas para empresas interessadas em explorar os recursos da região de forma sustentável. A extensão da área é pequena diante da estimativa de que 67,4 milhões de hectares na Amazônia serão regularizados a partir da lei sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no mês passado.

A nova legislação, com base na chamada MP da Amazônia, recebeu críticas de ambientalistas que viram na lei uma forma de regularizar a invasão de grileiros na região. ¿Era necessário alguma medida para resolver o caos fundiário na Amazônia. Acabou sendo um mal necessário¿, avalia o diretor-geral do Serviço Florestal Brasileiro, Antônio Carlos Hummel. Até agora, 1,4 mil posseiros já se cadastraram para ter as terras regularizadas.

Dos 198,5 milhões de hectares de florestas públicas no Brasil, apenas 12 milhões (6% do total) podem ser convertidos em unidades de manejo florestal (leia o para saber mais). Os critérios para definição das áreas para exploração sustentável foram estabelecidos na Lei de Gestão de Florestas Públicas, em 2006. A partir da lei, o governo federal pretendia ter maior controle sobre as áreas na Amazônia, sujeitas à atuação de grileiros e desmatadores.

Hoje, uma área de 140 mil hectares no Pará, na Floresta de Saracá-Taquera, está com licitação em curso para empresários interessados em explorar a flona (floresta nacional) de forma sustentável. O edital permanece aberto até o fim deste mês. O governo prevê uma arrecadação de R$ 7,3 milhões por ano com a área. O montante é dividido entre governo federal, estadual e municípios próximos à floresta. O secretário de agricultura de Faro, um dos municípios beneficiados, espera investir boa parte da nova receita no próprio meio ambiente, mas pondera que o montante de R$ 341 mil por ano poderia ser distribuído para outras áreas. ¿Tenho certeza de que nós temos muito onde aplicar o recurso¿, afirmou Everaldo Vidal.

Somente neste ano, a intenção do governo é licitar mais 700 mil hectares de floresta nacional, próximas à BR-163, no Pará. A diretora do Serviço Florestal Brasileiro, Thais Linhares Juvenal, explica que as ações do governo se concentram nessa área devido as altas taxas de desmatamento na região. ¿Uma vez que você reprime a ilegalidade, você tem que dar condições para a empresa trabalhar na legalidade¿, explica.

Criação de empregos O leilão para concessão de áreas na Amazônia teve início em 2007, quando 90 mil hectares da Floresta Nacional de Jamari, em Rondônia, foram licitados. A região foi dividida em três áreas de manejo florestal e a seleção das empresas seguiu critérios como o baixo impacto ambiental da exploração dos recursos e a criação de empregos. A expectativa de arrecadação com essa área é de R$ 3,8 milhões por ano.

De acordo com a lei de gestão de florestas públicas, fica proibida a exploração da fauna, de material biológico e de produtos de subsistência de comunidades locais. Somente empresas brasileiras podem entrar na disputa. ¿Os benefícios principais da concessão para nós são os relacionados à institucionalização das regras para manejo. Com a concessão, tudo fica mais claro do ponto de vista legal e a regulamentação e acesso às florestas mais transparente e regulamentado¿, afirmou Roberto Waack, sócio da Amata, empresa paulista de produtos madeireiros vencedora da maior área de manejo em Jamari, com 42 mil hectares.

Ainda não é possível mensurar o reflexo da licitação em comunidades próximas de Jamari ¿ a safra florestal tem início neste segundo semestre. Mas a avaliação é de que o impacto seja positivo. A Amata, por exemplo, prevê contratação de 180 trabalhadores para atividades florestais e de transformação da madeira. ¿O Brasil tem enorme potencial para a exploração sustentável da floresta amazônica e pode ser altamente competitivo¿, defende Waack.

Para saber mais Respeito à madeira

O manejo florestal consiste num conjunto de técnicas para exploração sustentável da floresta. Assim, respeita-se o ciclo de cortes da madeira e a exploração de recursos não madeireiros, de forma a garantir a recuperação da floresta (foto). A técnica não diminui os lucros da empresa. Ao contrário: há um aumento de produtividade do trabalho e redução do desperdício de madeira. Além disso, há um menor impacto sobre a fauna se comparado à exploração não manejada. ¿O maior delito no manejo florestal é a exploração mais intensa do que o recomendado pela norma técnica¿, afirma a diretora do Serviço

Florestal Brasileiro, Thais Linhares Juvenal. Ela afirma que o objetivo do manejo e do próprio sistema de concessão é mostrar que a floresta tem valor ambiental, social e econômico, o que justifica mantê-la em pé.

O governo defende que a concessão de florestas públicas permite às empresas implantar o manejo florestal a baixo custo. Isso porque a alternativa para o setor privado seria a compra de grandes áreas de floresta para tornar a técnica viável, o que exigiria um grande investimento. ¿É muito difícil encontrar na Amazônia uma terra contínua para compra¿, aponta ainda a diretora. (FF)