Título: Ala mais conservadora do BC decidiu os juros
Autor: Duarte, Patrícia
Fonte: O Globo, 12/09/2008, Economia, p. 25

BRASÍLIA. O racha dentro do Comitê de Política Monetária (Copom) - tornado público na última quarta-feira, quando a decisão de elevar a Selic de 13% para 13,75% ao ano teve cinco votos a favor e três contra - deixou ainda mais evidente as divergências na cúpula do BC. De um lado, o grupo considerado mais "conservador", liderado pelos diretores Mário Mesquita (Política Econômica) e Mário Torós (Política Monetária), e que conta com o apoio do presidente da instituição, Henrique Meirelles. De outro, encabeçado pelo diretor de Normas, Alexandre Tombini, que tem uma visão um pouco mais próxima da chamada ala "desenvolvimentista" do governo.

O grupo mais "conservador" teria puxado a defesa dos 0,75 de alta na Selic. Nesse grupo, os analistas de mercado incluem o nome do diretor de Liquidação, Gustavo Matos do Vale. Para essa ala da diretoria, a divulgação da expansão de 6,1% do PIB (soma de bens e serviços produzidos no país) no segundo trimestre e o crescimento da demanda interna em ritmo chinês - de 8,5% - teriam sido decisivos para a subida menor dos juros.

Entre os três votos favoráveis a uma alta de apenas 0,5 ponto, estariam o de Tombini e o da diretora de Assuntos Internacionais, Maria Celina Arraes. Em conversas que tem mantido com o mercado, de forma muito sutil, ela passa a mensagem de que enxerga os riscos de inflação um pouco menores.

Decisão de julho pode ter sido precipitada

Maria Celina teria chegado a citar, por exemplo, o arrefecimento dos preços das commodities como um fator a ser observado, segundo interlocutores que estiveram com ela. Com as cotações em baixa, os alimentos ficam mais em conta e ajudam no combate à inflação.

- O Mesquita (Mário Mesquita, de Política Econômica) praticamente não toca neste assunto (commodities) - disse um economista com acesso aos diretores do BC.

A posição dos diretores Anthero de Moraes Meirelles, de Administração; e Alvir Alberto Hoffman, de Fiscalização, é desconhecida. Um deles teria sido atraído para o grupo "conservador" e outro optado pelo aumento menor da Selic.

A falta de consenso desta semana no Copom, para parte dos especialistas, emitiu alguns sinais dúbios. Entre eles, a decisão de puxar com mais força a Selic na reunião de julho - de fazer aumento de 0,75 ponto, depois de passar os dois encontros anteriores optando por 0,5 ponto - pode ter sido precipitada, uma vez que os indícios de inflação não mudaram muito de lá para cá. O BC quer trazer as expectativas de inflação de 2009 mais próximas ao centro da meta, de 4,5% pelo IPCA. Hoje, elas estão em 5%.

Alta do dólar também representa risco à inflação

No BC, o grupo que defendeu o ajuste agora de 0,75 ponto percentual na Selic reforça que o descompasso entre oferta e demanda continua sendo a questão principal. Isso porque os dados divulgados também na quarta-feira sobre PIB mostraram que o ritmo da oferta cresce a 6% ao ano, enquanto que o da demanda, a 8%.

Além disso, o processo de desvalorização cambial também pode afetar. Com o dólar ganhando força frente ao real, as importações acabam ficando mais caras. Ontem, a moeda americana fechou a R$1,818. E são justamente esses produtos comprados lá fora que, até então, ajudavam a suprir parte da demanda, como vinha sendo ressaltado pelo BC nas últimas atas do Copom.