Título: A escolinha de quem agora tenta ser prefeito
Autor: Lima, Ludmilla de; Borges, Waleska
Fonte: O Globo, 14/09/2008, O País, p. 3

Candidatos, que prometem investir na educação, contam como eram nos bancos escolares.

Amerenda, o primeiro ou a primeira namorada, os colegas de turma, o professor inesquecível. Eduardo Paes (PMDB), Marcelo Crivella, Jandira Feghali (PCdoB), Fernando Gabeira (PV), Solange Amaral (DEM), Alessandro Molon (PT), Chico Alencar (PSOL) e Paulo Ramos (PDT) fizeram questão de dar uma pausa na campanha para relembrar como eram na escola. Cinco dos oito primeiros colocados estudaram em escola pública. Três se tornaram professores. Todos são unânimes em defender a educação pública de qualidade.

Quem for eleito terá de gerir uma rede de ensino que reúne 727.776 alunos em 1.061 escolas e 250 creches. Para administrar tudo isso, a prefeitura gastará este ano, segundo a Secretaria de Educação, R$1.996.126.942.

Ao revelarem o passado, os candidatos mostram que guardam mais semelhanças do que as promessas para a prefeitura. Paes, com 38 anos, e Molon, com 36, receberam, em épocas diferentes, a mesma educação: os dois estudaram boa parte da vida no Colégio Santo Agostinho, no Leblon. Mais tarde, os dois cursaram Direito na PUC, na Gávea.

Acompanhado do irmão mais velho dos primos, Paes morava no Jardim Botânico ia de ônibus para a escola. Os primeiros anos de estudo foram no Colégio São Patrício, em Botafogo, e depois no Santo Agostinho. Paes disse que era bom aluno. As suas matérias preferidas eram história, geografia e português, mas confessa que não gostava de matemática, física e química.

O candidato diz que não era de fazer bagunça, mas recorda que quando recebia alguma punição contava com a cumplicidade da avó materna.

¿ Se eu tivesse que levar algum responsável à escola, minha avó ia e dizia que os meus pais estavam viajando ¿ diverte-se Paes.

Segundo ele, as lembranças do Santo Agostinho vão desde a merenda (hambúrguer com guaraná) até o baleiro que imitava o cantor Roberto Carlos. Paes, que começou a prestar atenção em política nas aulas de história, diz que gostava de defender "as causas dos outros".

¿ Na época do Cruzado, tinha 16 anos, fui fiscal do Sarney e acabei prendendo um comerciante que estava vendendo guaraná com aumento. Fui parar na 14 ª DP(Leblon) ¿ lembra Paes, dizendo que o ensino da sua época mais rígido do que o atual.

Até a sétima série do ensino fundamental, o estudante Alessandro Molon gostava de se sentar na última carteira da escola. Falador, ele tirava boas notas e sempre passou de ano. O primário foi feito na antiga Escola Isa Prates, no Arpoador, e o segundo grau no Colégio Santo Agostinho.

¿ As minhas notas nunca foram ruins ¿ disse Paes.

Molon conta que não matava aulas. Ele lembra que teve muitas namoradas na escola, mas ¿uma de cada vez¿. Do Santo Agostinho, Molon entrou para uma banda na qual tocava tarol. Segundo ele, durante os ensaios para apresentação do sarau na casa de um amigo, o grupo recebeu uma ameaça anônima: ¿ O som não tinha boa qualidade ¿ brinca Molon.

Em 1994, Molon se formou em história na UFF. Logo depois, passou a dar aulas em escolas quando começou a se interessar por política. Com boa classificação no vestibular da PUC, Molon ganhou bolsa integral e cursou Direito.

Chico Alencar, 58 anos, também se tornou professor de História após estudar na UFF. O menino Francisco Rodrigues de Alencar Filho foi estudante do Colégio Marista São José, na Tijuca ¿ onde só se aceitavam homens. Ainda hoje, Chico imita o professor de francês do Marista. No Colégio de Aplicação da Uerj, foi presidente do grêmio até ser expulso por ¿subversão¿.

¿ A gente agitava muito, ia às passeatas. Eu fui ao velório do Edson Luís, depois à Passeata dos Cem Mil ¿ lembra Chico.

Da educação tradicional católico-tijucana, o estudante foi então parar nas carteiras do Colégio Israelita Brasileiro, cujo diretor era identificado com a esquerda. Depois fez vestibular para Comunicação na USP e para História na UFF. Como o convento dominicano ¿ onde moraria em São Paulo ¿ foi invadido pelos militares, Chico acabou seguindo carreira na História.

Já Crivella, 51 anos, desde cedo trilhou o caminho das ciências exatas. Ele fez o primário na Escola Municipal Manoel Cícero, na Gávea, na década de 60. Da época, a lembra da merenda ¿ ¿mingau de manhã e arroz com peixe no almoço¿ e da professora:

¿ Eu era apaixonado pela Tia Arlete. Até emagreci de paixão.

Crivella era um menino bem comportado, que freqüentava a Igreja Metodista. Com a mudança dos pais para São Paulo, foi estudar no Instituto estadual de Educação Fernand Dias Paes, em Pinheiros. Foi difícil a adaptação: estranhou o jeito paulista e era ¿zoado¿ pelos coleguinhas, que o apelidaram de Carioca.

Para ele, o ensino naqueles tempos era melhor, principalmente porque havia menos alunos em sala de aula. Perguntado se na época já gostava de cantar, fez graça:

¿ Já cantava as menininhas todinhas ¿ ri o candidato.

Sua preferência já eram as ciências exatas. Por isso, ao retornar para o Rio, foi estudar na Escola Nacional de Ciências Estatísticas (Ence) do IBGE, que na época ainda oferecei o antigo segundo grau. A escolha pela instituição também foi influenciada pelo tio Edir Macedo, fundador da Igreja Universal do Reino de Deus, que era aluno do curso superior de estatística. Ele fez faculdade de engenharia civil na Santa Úrsula.

Solange Amaral, 55 anos, também estudou em escola pública até entrar na universidade. Era uma boa aluna, mas bagunceira. O primário foi feito num colégio estadual, em Niterói, e o ginásio e científico no Colégio Estadual Alencastro Guimarães, em Copacabana.

¿ Um dia estava matando aula quando caí do balanço. Fui parar no hospital e levei sete pontos na testa ¿ diverte-se Solange, que ia para escola levada de bicicleta pelo irmão.

Do Alencastro Guimarães, Solange lembra que não gostava da matéria estatística descritiva. Ela confessa que quando tirava notas ruins recorria à irmã mais velha, Maria Emília: ¿ Ela assinava a minha caderneta.

¿ Fui a oradora da turma do ginásio. Tenho um amigo que conta que, aos 15 anos, eu dizia que seria política ¿ diz.

Solange acredita que sofreu influência da mãe, uma militante que combateu a ditadura, ao optar pela política. Antes, cursou psicologia na PUC. Na faculdade, ela ganhou meia bolsa por ser do time de vôlei.

O mineiro Gabeira, 67 anos, morador do Rio há cerca de 40 anos, começou sua vida escolar em Juiz de Fora. Das lembranças da escola municipal, o suco de groselha vendido num botequim ao lado.

¿ Ia a pé e sozinho para a escola ¿ conta Gabeira, que lembra ter sido ávido pela leitura: ¿ Algumas vezes, me fechava no banheiro para ler.

Gabeira depois tornou-se líder estudantil e deixou a escola para trabalhar em um jornal. Exilado, em 1974, fez dois anos de antropologia na Universidade de Estocolmo.

Jandira Feghali, 50 anos, foi uma estudante precoce e aplicada. Aos 9 anos, já cursava o colegial. E, aos 16, entrou na faculdade. O antigo primeiro grau Jandira fez numa escola particular em Irajá, onde morava:

¿ Sempre fui a primeira da turma.

Jandira conta que depois foi estudar no Instituto Lafayette, na Tijuca. Lá conheceu o primeiro namorado, de quem diz ser amiga até hoje.

¿ Minha vida era muito integrada à escola. Com 9 anos, comecei a me identificar com a bateria. Meu irmão me ensinou ¿ conta Jandira, que teve uma banda.

Jandira também estudou na Associação Cristã de Moços, na Lapa, e no Instituto Marques. Aos 16 anos, passou para Medicina na Uerj e deixou a carreira de baterista.

Já Paulo Ramos, 63 anos, estudou escolas públicas na Zona Oeste:

¿ Eu era bom em bola de gude e canto orfeônico ¿ diverte-se Ramos lembrando que fugia da escola para ir à praia e escutar rock.

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