Título: Adeus, Mônaco
Autor: Duarte, Fernando; Éboli, Evandro
Fonte: O Globo, 05/07/2008, Economia, p. 25

Príncipe Albert autoriza extradição de Cacciola, e ex-banqueiro deve chegar ao Brasil em 15 dias.

Fernando Duarte* e Evandro Éboli

Quase dez meses depois de ser detido num dos endereços mais nobres de Mônaco, Salvatore Cacciola enfim deverá ser entregue em breve às autoridades brasileiras: o príncipe Albert II ratificou a decisão tomada pelo judiciário em abril de extraditar o ex-banqueiro brasileiro, foragido há oito anos. O governo brasileiro, agora, aguarda procedimentos burocráticos e o chamado da polícia de Mônaco para trazer Cacciola de volta ao Brasil. O secretário nacional de Justiça, Romeu Tuma Júnior, acredita que isso ocorrerá em, no máximo, 15 dias. Mas fontes afirmam que o processo pode ser encerrado ainda na próxima semana.

- O príncipe destronou o rei da impunidade - disse o secretário.

Embora, em teoria, os advogados de Cacciola ainda possam questionar o parecer no Supremo Tribunal de Mônaco, tal recurso nunca foi utilizado antes em casos do gênero. Até o representante legal do ex-dono do Banco Marka no principado, Frank Michel, ontem já parecia ainda mais resignado que na semana passada, quando um recurso apresentado à Corte Européia dos Direitos Humanos também foi indeferido.

- Caberá ao senhor Cacciola a decisão de apresentar ou não um recurso. Ele vai pensar no assunto durante o fim de semana - disse Michel, lacônico.

O ministro da Justiça, Tarso Genro, afirmou ontem, porém, que não cabem mais recursos e não há como a extradição ser postergada:

- Já recorreram a todas instâncias possíveis - disse o ministro.

Ele foi comunicado da decisão do príncipe pelo diretor-geral de Justiça de Mônaco (equivalente ao de ministro da Justiça), Philippe Narmino. Tarso Genro comemorou a decisão e disse que é a prova de que o pedido de extradição foi corretamente instruído:

- Mônaco deixou claro que não é um território de proteção de pessoas procuradas ou que tem penas a cumprir em outros países. A decisão representa também o prestígio que tem nosso país - disse Tarso.

Ex-banqueiro virá em vôo de carreira

No Brasil, a defesa de Cacciola informou que vai recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra a prisão do cliente, alegando motivação política, segundo o portal G1.

Cacciola deverá ser levado de Mônaco até Nice, no Sul da França, e, de lá, seguirá para Paris, já que não há aeroportos em Mônaco. Haverá uma escolta de agentes da Interpol. Da capital francesa, o ex-banqueiro viajará para o Brasil, num vôo de carreira. O diretor-geral da Polícia Federal, Luiz Fernando Corrêa, afirmou que será uma ação normal.

- Será como o transporte de qualquer outro preso. Uma operação de rotina - minimizou.

Tarso Genro disse que o governo brasileiro está pronto para buscar Cacciola logo que a polícia de Mônaco colocá-lo à disposição:

- Assim que derem o sinal verde, em 48 horas, no máximo, Cacciola estará de volta.

Um delegado federal e dois agentes deverão buscar Cacciola na França. Ele seguirá direto para o Rio, onde foi condenado e de onde partiu seu mandado de prisão. Romeu Tuma Júnior afirmou que a Justiça do Rio é que decidirá onde Cacciola cumprirá a pena. O governo quer evitar passar pela Itália, já que Cacciola tem cidadania italiana, por receio de que ele se livre da prisão.

Segundo informações do Ministério das Relações Exteriores de Mônaco, os trâmites burocráticos da extradição deverão ser relativamente simples, ainda que o anúncio da ratificação numa sexta-feira impeça que as autoridades brasileiras consigam cumprir o plano original de embarcar Cacciola de volta para o Brasil 48 horas depois de obtida a permissão de Albert II. Ainda não se sabe se ele viajará algemado ou não.

Romeu Tuma Júnior também não acredita que caibam mais recursos para impedir a extradição:

- Mas a defesa dele é de respeito. Passaram dez meses fazendo chicana jurídica. É preciso ter cautela porque envolve um terceiro país (Mônaco).

Para Tarso Genro, a extradição é uma conquista de toda a sociedade:

- É um alento para quem resguarda sua vida dentro da lei. Não é porque se trata do Cacciola. Não interessa quem seja, desde que seja alguém que presta contas à Justiça brasileira.

Cacciola foi preso por agentes da Interpol em Mônaco em 15 de setembro de 2007, graças a uma checagem de rotina dos visitantes do principado. O nome do banqueiro, que fora jogar num cassino, estava na lista de procurados. Em 1999, para evitar a falência do Marka, o Banco Central (BC) socorreu a instituição numa operação que gerou um rombo de mais de R$1 bilhão aos cofres públicos.

Embora desde o início Mônaco tenha mostrado interesse em atender ao pedido de extradição, as manobras da defesa - que incluíram até críticas à tradução dos documentos para o francês - adiaram um parecer sobre o caso.

(*) Correspondente

www.oglobo.com.br/economia