Título: Apelo ao fim de subsídios a biocombustível
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Fonte: O Globo, 23/05/2008, Economia, p. 21

Secretário-geral da OEA diz que produzir etanol de milho é uma "barbaridade"

GENEBRA e WASHINGTON. O relator especial da ONU para o Direito à Alimentação, Olivier de Schutter, afirmou ontem que a crise dos alimentos é uma violação aos direitos humanos e pediu que os investimentos em biocombustíveis, bem como a concessão de subsídios à sua produção, sejam congelados para forçar a queda de preços de grãos. O apelo foi pouco antes da sessão extraordinária do Conselho dos Direitos Humanos da ONU, em Genebra, e se referia à meta da União Européia de adicionar 10% de etanol ao combustível usado pelo setor de transportes até 2010.

- Estes objetivos (a meta de adição de 10%) não são realistas. Abandonando-os, enviaremos um forte sinal ao mercado de que os preços dos grãos não seguirão crescendo indefinidamente - afirmou Schutter, que assumiu o cargo há cerca de três semanas, em substituição ao suíço Jean Ziegler, que havia qualificado a política a favor dos biocombustíveis de "crime contra a humanidade".

Schutter lembrou que, desde 2004, o aumento da produção de milho nos Estados Unidos foi destinado aos biocombustíveis e que 25% da produção deste grão devem ter o mesmo fim este ano. Ainda segundo o relator, cem milhões de hectares seriam necessários para produzir 5% dos biocombustíveis em 2015, e "isso é simplesmente insuportável", disse.

Além dos biocombustíveis, o relator também atribuiu a crise dos alimentos "às políticas que estão sendo postas em prática atualmente" por países desenvolvidos e que são "legitimadas pela Organização Mundial do Comércio (OMC)". Tais políticas são baseadas em concessão de subsídios aos produtores nacionais, reduzindo a competitividade dos produtores de países em desenvolvimento.

Petróleo também pesa na alta de grãos

Na extensa lista de críticas de Schutter, não ficaram de fora o preço do petróleo nem os direitos de propriedade intelectual dos produtores de sementes, fertilizantes e pesticidas. Ele defendeu que novas políticas voltadas para os países pobres comecem a ser adotadas.

- Garantir acesso a sementes e fertilizantes (especialmente na África Subsaariana) requer urgente atenção, antes que termine a temporada de safra em junho - disse Schutter, lembrando que a crise dos alimentos agravará a situação de precariedade de 854 milhões de pessoas no mundo, das quais 60% estão na África Subsaariana e no Sul da Ásia.

Os biocombustíveis também foram alvo de críticas do secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), José Miguel Insulza. Ele afirmou que produzir etanol a partir do milho, e principalmente do milho subsidiado como fazem os Estados Unidos, é "uma barbaridade" e que, durante a próxima assembléia do órgão, na Colômbia, pedirá que se "concentrem esforços" entre diferentes agências mundiais para solucionar a crise dos alimentos.

- Produzir etanol a partir desses produtos é uma barbaridade, principalmente nos Estados Unidos, onde se subsidia (a produção) - disse Insulza à agência de notícias France Press.

Para ele, "não há dúvida" de que os subsídios à agricultura nos EUA são, em parte, causadores da crise alimentar mundial. Assim como o relator da ONU, o secretário se disse a favor de "acabar com algumas barreiras artificiais que os seres humanos impõem" ao comércio de alimentos, como os subsídios.