Título: Após aumento, médicos aparecem
Autor: Costa, Célia; Borges, Waleska
Fonte: O Globo, 08/04/2008, Rio, p. 12

Cremerj entrega lista de 271 que decidiram trabalhar depois de equiparação salarial

Os médicos do Rio que se dispuserem a trabalhar nas tendas de hidratação receberão a mesma remuneração que os profissionais que estão chegando de outros estados. A decisão do secretário estadual de Saúde, Sérgio Côrtes, pôs fim à polêmica sobre a diferença salarial entre os médicos. Ontem, a presidente do Conselho Regional de Medicina (Cremerj), Márcia Rosa de Araújo, entregou ao secretário uma lista com os nomes de 271 profissionais - entre eles, 114 pediatras - dispostos a reforçar o atendimento a pacientes com dengue.

Os médicos do Rio, assim como os de outros estados, receberão R$500 por plantão de 12 horas. A proposta inicial era que eles ganhassem R$400. Em cada uma das tendas de hidratação, com capacidade para atender 400 pessoas por dia, trabalharão quatro médicos por plantão. Segundo Sérgio Côrtes, com a ajuda dos profissionais do Rio, os de outros estados poderão ter a sua estada na cidade reduzida.

- Passamos 20 dias suplicando para conseguir aumentar o número de médicos. Agora, vamos começar a chamar os pediatras que constam da lista - disse Côrtes.

Questionada sobre a demora na oferta de médicos, a presidente do Cremerj admitiu que eles só aceitaram trabalhar pela quantia que foi oferecida agora.

- Antes não tinham oferecido esses valores - disse Márcia Rosa.

Médicos são treinados no Rio

Médicos de outros estados, que chegaram ao Rio domingo e ontem para reforçar o atendimento às vítimas da dengue, começam a trabalhar hoje. Ao todo, já estão na cidade 89 profissionais de saúde. Apenas de São Paulo, vieram 48 médicos, cerca de 40 deles do Hospital Albert Einstein. Todos vão trabalhar na tenda de hidratação que será aberta no quartel do Corpo de Bombeiros do Méier para receber pacientes do Hospital Salgado Filho.

- A quantidade de médicos de outros estados superou as expectativas. Os médicos que vêm do Hospital Albert Einstein vão trabalhar sem qualquer ônus para o estado - disse o secretário Sérgio Côrtes, lembrando da importância da criação da Força Nacional de Saúde.

Segundo Côrtes, a mobilização da Força Nacional de Saúde aconteceria em situações de crise, como a enchente que está ocorrendo no Nordeste do país. Sobre a participação dos médicos de fora, o secretário elogiou a disposição dos profissionais:

- O momento agora é de solidariedade. Os médicos estão largando suas famílias e empregos privados para trabalhar aqui - disse.

No domingo, chegaram ao Rio 18 médicos vindos do Rio Grande do Sul, sete do Mato Grosso do Sul e dois do Amazonas. Ontem, além dos paulistas, chegaram seis profissionais de Pernambuco, cinco do Paraná, dois do Rio Grande do Sul e um do Amapá. Ainda são esperados profissionais de Minas Gerais.

Na manhã de ontem, os médicos de fora do Rio participaram de um treinamento no quartel do Corpo de Bombeiros. Eles receberam orientações para a identificação rápida de casos graves de dengue e para manter um bom fluxo do atendimento de pacientes nas filas.

- Esse é um momento de salvar vidas. Mas, depois, todo cidadão deve refletir onde foi que errou. Não podemos mais continuar vivendo essas epidemias de dengue - disse o médico Rivaldo Venâncio da Cunha, de Mato Grosso do Sul, que já morou 13 anos no Rio.

Depois do treinamento, os profissionais tiveram que cumprir uma exigência do Cremerj. Foram à sede do órgão para conseguir uma autorização para trabalhar na cidade.

Côrtes afirmou que outros médicos do próprio estado estão respondendo a uma convocação para o trabalho na epidemia. Com isto, devem ser abertas, além da tenda do Méier, outras três unidades de hidratação: no Iaserj da Gávea, no Hospital Albert Schweitzer, em Realengo, e no Hospital Eduardo Rabelo, em Campo Grande. O secretário avalia ainda a hipótese de abrir mais tendas na Baixada Fluminense, uma delas em Duque de Caxias. Para Côrtes, com as chuvas, entre os próximos sete e dez dias, podem eclodir novos ciclos do mosquito Aedes aegypti, transmissor da dengue.

Alunos do sexto ano do curso de Medicina da UFRJ também atuarão no atendimentos aos doentes nas tendas de hidratação. Roberto Medronho, professor de epidemiologia da universidade, se reuniu ontem com o secretário estadual de Saúde para discutir a participação dos estudantes. Segundo Medronho, todos têm treinamento em emergência, mas não podem fazer atendimentos. Ficou acertado que eles trabalharão como estagiários dos médicos e terão como principal função fazer a triagem de pacientes e detectar os casos mais graves.

- A classificação de risco é importante para evitar que os pacientes mais graves fiquem um longo tempo esperando nas filas - disse Roberto Medronho.

Para os alunos, segundo o professor, será um grande aprendizado. É a chance de lidar com uma doença que encontrarão depois de formados, mas que não aprendem nos bancos escolares. Ficou acertado que os alunos receberão uma bolsa de R$300 mensais pelo serviço, pagos pela Secretaria estadual de Saúde.

A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) criticou a convocação da Secretaria estadual de Saúde de médicos de outros estados. O presidente da sociedade, Dioclécio Campos Júnior, afirma num documento que o fato de as autoridades atribuírem o grande número de mortes de crianças à falta de pediatras no Rio é "uma distorção inescrupulosa dos fatos". Segundo a nota, o estado tem sete mil pediatras e a epidemia é muito mais conseqüência de uma crise de todas as áreas, como a de saneamento básico e a de educação, do que exclusivamente da saúde. Sobre a carta, Sérgio Côrtes preferiu não criar polêmica:

- Eu só polemizo com o mosquito. A Sociedade Brasileira de Pediatria é parceira do estado.

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