Título: Assessor da Casa Civil diz que operação de retirada é irreversível
Autor: Taves, Rodrigo
Fonte: O Globo, 30/09/2007, O País, p. 4

Estratégia do governo é apreender as máquinas e os tratores de fazendeiro.

BOA VISTA. Chefe do comitê gestor montado pelo governo federal para a desocupação de Raposa Serra do Sol, José Nagib Lima, assessor especial da Casa Civil, diz que a operação de retirada dos não-índios é irreversível e que, antes do Natal, o arrozeiro Paulo César Quartiero e seus aliados não estarão mais na reserva.

A estratégia do governo é apreender as máquinas e os tratores de Quartiero, pois o fazendeiro não pagou multas aplicadas pelo Ibama por crime ambiental. Além de ter tomado posse de terras da União, Quartiero bombeia irregularmente a água do Rio Surumu para irrigar as plantações de arroz, e é ainda acusado de derrubar vegetação nativa.

- A operação vai sair, não há mais o que esperar. A personalidade de Quartiero é de conflito, é sanguinária. Ele apostava na divisão dos índios, mas hoje é pouco provável que as entidades indígenas estejam na linha de frente da resistência à operação. É claro que vai ter índio reagindo, mas não como movimento organizado - diz Nagib.

A situação está cada vez mais tensa. Nagib conseguiu que, no dia 12 de setembro, as oito comunidades indígenas de Raposa Serra do Sol assinassem, no Palácio do Planalto, uma carta-compromisso em que afirmam que não haverá confronto entre índios durante a operação da Polícia Federal. Logo em seguida, porém, o índio Lauro Barbosa, líder da Sodiur, usou o incêndio das malocas como pretexto para dizer que a Sodiur não se sente mais obrigada a manter o compromisso assinado.

De nada adiantou o coordenador do CIR, Dionito José de Souza, dizer a Lauro que os índios sob seu comando não são responsáveis pelo crime. Para o CIR, Quartiero e o deputado Junqueira, que teriam sido vistos na reserva no dia do incêndio, são os mandantes do crime. Mas não há provas do envolvimento dos produtores de arroz, nem no caso das malocas queimadas nem no incêndio que destruiu, há dois anos, o Centro de Formação Indígena construído pela Igreja Católica na aldeia Surumu.

Na ocasião, três grupos de homens encapuzados invadiram o prédio de madrugada e, enquanto estudantes e professores fugiam, atearam fogo em salas de aula, dormitórios, dispensas e escritórios. Um professor foi espancado e teve o carro queimado. Os padres tinham deixado a reserva um ano antes, após passarem alguns dias seqüestrados por índios ligados a Quartiero.

- Os homens gritavam muitos palavrões, xingavam os padres, e disparavam tiros para o alto - diz um aluno que estava na escola na noite do atentado.

Quartiero nega culpa nos incêndios e sustenta que seus seguranças não andam armados, mas não esconde a raiva pelos padres que ergueram o prédio:

- Quem manipula os índios é o Cimi (Conselho Indigenista Missionário, ligado à CNBB), a Igreja Católica e as ONGs. O que está havendo em Roraima é uma conspiração, que envolve interesses internacionais.

Outros 20 brancos continuam na reserva. A comerciante Maria Luiza Pereira, que não aceitou o valor da indenização estipulado pelo governo, é acusada de vender cachaça aos índios, inclusive aos adolescentes, apesar de ter recebido uma comissão de mães, que apelaram por seu bom senso. A embriaguez é um dos principais problemas sociais na reserva. Ela diz:

- Índio é uma peste que parece gente, mas não é.

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