Título: Battisti: apesar da carta de Lula, Itália vai à Justiça
Autor:
Fonte: O Globo, 24/01/2009, O País, p. 5

Presidente brasileiro defende soberania do país para dar refúgio ao ex-ativista; colega italiano anuncia medidas legais.

BRASÍLIA. Após receber ontem carta do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o presidente da Itália, Giorgio Napolitano, determinou que a chancelaria do seu país adote todas as medidas legais, tanto no Brasil como em instâncias internacionais, para garantir a extradição do ex-ativista político Cesare Battisti. Na carta que enviou ontem à Itália em resposta à mensagem que recebera de Napolitano, Lula reafirmou que a concessão de refúgio político a Battisti seguiu a legislação brasileira. Lula elogia a Justiça italiana e diz que o Brasil reconhece a legitimidade do ordenamento jurídico da Itália, mas afirma que a soberania brasileira de tomar a decisão pelo refúgio deve ser respeitada.

Na carta, Lula diz: "Desejaria expressar a plena consideração ao Poder Judiciário italiano e ao estado democrático de direito vigente nesse país, bem como afirmar minha confiança no caráter democrático, humanista e legítimo do ordenamento jurídico italiano". E alega que, ao conceder o refúgio político, o ministro da Justiça, Tarso Genro, levantou "fundado temor de perseguição por opinião política".

Logo em seguida, Lula diz que "a concessão da condição de refugiado ao senhor Battisti representa um ato de soberania do Estado brasileiro". O presidente afirma que a decisão se baseia na Constituição e na Convenção das Nações Unidas relativa ao Estatuto dos Refugiados: "A concessão do refúgio e as considerações que a acompanharam restringiram-se a um processo concreto, tendo sido proferida com fundamento nos elementos e documentos constantes num procedimento específico".

A carta foi entregue na manhã de ontem pela embaixadora Maria Edileuza Reis, diretora do Departamento de Europa do Itamaraty, ao embaixador italiano no Brasil, Michele Valensise. O conteúdo da carta de Lula foi divulgado pelo governo italiano e, mais tarde, pelo Palácio do Planalto. No texto, Lula diz que a decisão brasileira não deveria abalar as relações entre os dois países: "Os laços históricos e culturais que unem o Brasil e a Itália continuarão a inspirar nossos esforços com vistas a aprofundar ainda mais nossas densas e sólidas relações".

Itália pede ao STF que país seja ouvido sobre caso

A embaixada da Itália entrou ontem com recurso no Supremo Tribunal Federal (STF) formalizando pedido para que o país seja ouvido antes que a Corte decida o caso Battisti. O italiano permanece preso em Brasília, mas sua defesa sustenta que, por conta do refúgio, já deveria ser posto em liberdade e o processo de extradição, extinto.

O advogado do réu, Luiz Eduardo Greenhalgh, contestou a decisão do presidente da Corte, ministro Gilmar Mendes, de solicitar parecer do procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, antes de decidir se solta ou não Battisti. O pedido de libertação foi feito no dia 14, um dia após o italiano receber a condição de refugiado. O pedido feito ontem, que também pretende a imediata libertação de Battisti, foi encaminhado ao relator do processo, ministro Cezar Peluso. A tendência é que o STF só decida se o italiano será ou não solto a partir de 2 de fevereiro, quando termina o recesso da Corte.

O secretário-geral da Presidência, Luiz Dulci, defendeu a decisão brasileira. Ele citou o mesmo argumento de Tarso Genro, lembrando que a Itália negou o pedido de extradição do banqueiro Salvatore Cacciola para o Brasil e se recusou a entregá-lo às autoridades brasileiras. Cacciola tem cidadania italiana.