Título: Tapar os ralos
Autor: Cruvinel, Tereza
Fonte: O Globo, 02/06/2007, O Globo, p. 2

Reforma política e reforma orçamentária, pedem todos, sempre que a cobra mostra o rabo. Sempre que, como agora, ficam à mostra as relações danosas entre parlamentares, emendas orçamentárias e corrupção. Ambas, no fundo, são indesejadas, mas a reforma política tem seu charme, atrai inteligências. A outra, por sua tecnicalidade, nem isso. Integrante da Comissão Mista de Orçamento (CMO) há 16 anos, o senador Sérgio Guerra (PSDB-PE) é dos parlamentares que mais conhece o rito orçamentário. Está apresentando uma das propostas mais "redondas" sobre o tema.

Propõe ele, em resumo, que o Orçamento apresentado pelo Executivo seja fatiado no Congresso segundo os temas (educação, saúde, infra-estrutura etc.) e examinado por comissões técnicas mistas, formadas pelas comissões permanentes do Senado e da Câmara. A poderosa CMO seria extinta e substituída por uma Comissão Mista de Sistematização. Nela se dará o debate das metas fiscais e dos grandes números do Orçamento e será arrematado o trabalho das comissões temáticas. Estas é que cotejarão a receita com as despesas financeiras, de custeio e obrigatórias, em cada área. Examinarão também, acolhendo ou não, as emendas individuais e de bancadas. As de comissão deixam de existir, obviamente. As individuais terão que estar relacionadas com os programas prioritários de cada setor, e as de bancada terão que beneficiar projetos estruturantes nos estados. Como estamos vendo agora (com o caso Gautama), temos visto desde a CPI dos Anões, a insuficiência de parâmetros nas emendas ajuda os ladrões do dinheiro público. O senador adverte, entretanto, que o mal não está só no Congresso, que mexe geralmente em apenas 2% dos recursos de investimento.

- É na execução orçamentária, e portanto no Poder Executivo, que os esquemas de corrupção se concretizam, por meio da fraude na licitação, nas medições e nos cálculos. O uso fisiológico (para obter votos) das emendas pelo governo é facilitado pelo contingenciamento sem critérios objetivos - diz ele.

Contra isso, seria adotada a liberação impositiva das emendas, nos termos de um cronograma e de outros critérios a serem fixados para evitar o hiper-emendamento, negligenciando metas fiscais e prioridades.

Disciplinando-se, o Congresso passaria a ser também mais fiscalizador. O TCU, de viés político, seria substituído por órgãos técnicos de auditoria, compostos por servidores concursados. Há muito mais no projeto de Guerra, para o exame dos poucos que procuram a cola para tapar os ralos. Agora mesmo, os lobistas de empreiteiras atuam para evitar a CPI da Navalha, que ameaça jogar luz também sobre os corruptores. Eles agradecem o desvio de foco trazido pelo caso da pensão do senador Renan Calheiros.