Título: Caldo de galinha
Autor: Vidor, George
Fonte: O Globo, 09/04/2007, Economia, p. 18

A reação dos mercados financeiros no exterior diante dos números revisados da economia brasileira (queda da dívida pública como proporção do Produto Interno Bruto, aumento do PIB potencial etc.) deixaram as nossas taxas de juros mais defasadas no tempo. As taxas de juros de equilíbrio de médio prazo parecem mais próximas de 5%, e elas hoje ainda se mantêm em 8%.

Como as taxas de juros no Brasil sempre foram excessivamente altas, agora que recuaram para 12,75% ao ano as autoridades monetárias se sentem como se estivessem andando por terreno desconhecido - e de fato trata-se de um ambiente completamente novo, pois a economia brasileira nunca tinha se visto diante da possibilidade de conviver com juros naturalmente civilizados, sem artificialismo. Daí o discurso oficial repetir palavras e expressões como parcimônia, cautela, ajuste de longo prazo. O Banco Central está convencido de que a política do devagar e sempre é a que trará mais benefícios para o país, e alguns dos números revisados pelo IBGE jogam a favor das autoridades.

Por exemplo: os investimentos estão se expandindo em ritmo mais acelerado do que se supunha, o que amplia o chamado PIB potencial. Portanto, a economia brasileira pode crescer mais do que os 3,5% ao ano, antes tidos como patamar recomendável para evitar desequilíbrios.

Mas, se no conjunto os números da economia melhoraram, existem problemas específicos preocupantes. O crescimento da indústria de transformação está acanhado demais, e bem abaixo da média. E dentro da indústria, os segmentos que mais empregam estão na lanterna.

O BC acredita que a queda gradual na taxa de juros trará alívio para esses setores. O maior beneficiado por esse corte será mesmo o Tesouro Nacional, cujo maior item de despesas são os encargos financeiros da dívida pública interna. Então, o país como um todo sairá ganhando porque as taxas de juros se tornaram um canal de transferência de renda, concentrando-a ainda mais naqueles que têm possibilidade de acumular capital financeiro.

De todo modo, uma redução mais forte (0,5 ponto percentual) nas taxas de juros básicos já na próxima reunião do Comitê de Política Monetária teria razões técnicas. É preciso ajustar a curva interna de juros às taxas de captação de moeda estrangeira, que caíram para 6% em dólar nos últimos dias. Se os juros básicos forem novamente cortados a conta-gotas, as apostas em uma apreciação no real continuarão se multiplicando, forçando uma valorização, hoje indesejada, da moeda nacional.

Esse ajuste técnico não seria encarado pelo mercado como um abandono da parcimônia, até porque isso pode ficar bem claro na ata do Copom.

Diz-se popularmente que cautela e caldo de galinha não fazem mal a ninguém, mas da autoridade também se espera senso de oportunidade. No fim de maio, o impacto da queda acentuada do prêmio de risco cobrado do Brasil no exterior já terá se diluído e provavelmente deixará de fazer sentido um corte de 0,5 ponto percentual nos juros básicos. Então, o momento apropriado para o corte seria mesmo agora, nesta reunião de abril, pois existe a justificativa que a inflação pode ficar abaixo do piso (2,5%) da meta.