Título: Um ano depois, nem emprego como caseiro Nildo consegue
Autor: Gripp, Alan
Fonte: O Globo, 11/03/2007, O País, p. 17

Acusador de Palocci vive de bicos e mora num barraco.

BRASÍLIA. Enquanto conta as moedas para a passagem do ônibus, Francenildo dos Santos Costa esnoba a fama meteórica que experimentou. Um ano depois de ter desmentido publicamente o então ministro da Fazenda, Antonio Palocci, iniciando o processo de fritura que derrubou o homem forte da economia no governo Lula, o ex-caseiro só conta derrotas desde então. Nildo, como é conhecido, diz que perdeu o emprego, foi abandonado pela mulher, que também temia ficar sem trabalho, e acabou sendo obrigado a se mudar do quarto em que vivia para um barraco na periferia de Brasília, onde divide um banheiro coletivo com outras 30 pessoas.

- Que diabo de fama é essa? Fama tem que ser igual à do Big Brother, que você ganha dinheiro e vai a um monte de festa. Tudo só piorou - disse o ex-caseiro.

O surgimento de Nildo foi o tiro de misericórdia em Palocci, que à época era apontado até como o provável sucessor de Lula em 2010. Nildo confirmou que Palocci freqüentava a chamada "casa do lobby", onde ex-assessores de Ribeirão Preto supostamente fechavam negócios escusos. Após a revelação, teve o sigilo bancário de sua conta quebrado, numa operação ilegal que envolveu Palocci e o então presidente da Caixa, Jorge Mattoso, que também perdeu o cargo.

"Limpo piscina, corto grama. Dá R$350 ao mês"

Nildo não quer, porém, saber do passado. Diz que os holofotes só lhe causaram problemas. Hoje, o ex-caseiro vive de bicos, fazendo serviços esporádicos em casas do Lago Sul, bairro nobre de Brasília. Quando não lhe reconhecem:

- Quando aparece alguma coisa, limpo piscina, corto grama, assento cerâmica. Dá, no máximo, R$350 por mês. Mas o pior é que não tenho carteira fichada (assinada). Quando vou procurar emprego, algumas pessoas ficam com medo. Elas dizem: "Você foi envolvido com a Polícia Federal" - conta.

Nildo aproveita todas as chances para se queixar das pessoas que o acusaram de ter recebido dinheiro para delatar Palocci. A quebra ilegal do sigilo revelou que o caseiro tinha recebido, meses antes, cerca de R$25 mil, dinheiro que ele alegou ter recebido de seu pai, o empresário Eurípedes Soares da Silva, em troca de seu silêncio sobre a paternidade. Eurípedes confirmou a versão, que nunca foi desmentida.

O ex-caseiro revelou que, durante o terremoto provocado pela revelação dos depósitos, até o senador tucano Antero Paes de Barros (MT), responsável por levar o caseiro a público, desconfiou dele.

- Até ele desconfiou de mim, pediu para eu ficar quieto - relata.

"Hoje eu queria mesmo era um emprego fixo"

O dinheiro, segundo ele, evaporou. Foi gasto na compra de dois lotes de R$2 mil cada em Nazário, cidade do Piauí onde vive a mãe; em ajudas periódicas à família; e em cópias dos processos de indenização que move contra os envolvidos no episódio da quebra ilegal de seu sigilo bancário. O sonho de comprar um Chevette usado, revelado na ocasião, ficou condicionado a vitórias nos processos judiciais, apesar da pouca fé:

- Hoje eu queria mesmo era um emprego fixo, porque essa indenização, se tiver, meu filho é que vai ver.

Antes de se despedir rumo a mais um biscate, Nildo diz que só ficou sabendo recentemente da eleição de Palocci para a Câmara - tentativa até então discreta do ex-ministro de reconstrução da carreira política. Nildo se recusa a comparar sua situação com a dele, mas não resiste a uma alfinetada:

- Não quero me comparar a ele. Mas não entendo como Palocci conseguiu (se eleger deputado). A não ser que aquelas notícias não passaram na TV em Ribeirão Preto. Se fosse eu, estaria preso até agora. Hoje, ele está aí andando em carro de luxo.