Título: 'Chávez abusou dos organismos e recursos estatais'
Autor: Renato Galeno
Fonte: O Globo, 29/11/2006, O Mundo, p. 32

BUENOS AIRES. Tudo parece indicar que o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, será reeleito no domingo. Mas a derrota do candidato opositor, Manuel Rosales, seria o começo e não o fim de um importante processo de recuperação da oposição venezuelana, afirmou ao GLOBO o professor da Universidade Central da Venezuela, Carlos Romero. "Hoje a oposição é liderada por políticos e não por representantes da sociedade civil, que no passado atuaram de forma improvisada", disse Romero, por telefone, de Caracas.

A grande maioria das pesquisas indica que Chávez será reeleito no próximo domingo...

CARLOS ROMERO: Há dois grupos de pesquisas no país. O primeiro e menos confiável afirma que os dois principais candidatos estão praticamente empatados, e o segundo mostra uma diferença expressiva a favor de Chávez, que oscila entre 10 e 30 pontos percentuais. O presidente é o favorito e a maioria das empresas de consultoria assegura que só um milagre daria a vitória a Manuel Rosales. Esse milagre seria que os eleitores indecisos e os que até o momento optaram pela abstenção, que juntos representam 40% dos 16 milhões de eleitores, mudem de idéia e votem no candidato opositor. As pesquisas de maior credibilidade indicam que Chávez tem entre 55% e 60% das intenções de votos, contra entre 35% e 40% de Rosales.

Há risco de violência no domingo?

ROMERO: Primeiro, esta não foi uma campanha normal. Chávez abusou dos organismos e recursos estatais, por exemplo, obrigando os servidores públicos a participar de atos eleitorais. Não podemos esquecer que o governo controla o Judiciário, o Legislativo, as Forças Armadas e tem as missões bolivarianas (programas sociais), usadas para manipular a população. Nunca tivemos na Venezuela um Estado tão politizado quanto hoje. Apesar disso, Rosales fez uma campanha razoável e seu principal mérito é ter reconstruído a oposição e devolvido aos políticos um espaço perdido. Hoje a oposição é liderada por políticos e não por representantes da sociedade de civil, que no passado atuaram de forma improvisada. Dito tudo isso, fica claro que esta não será uma eleição livre e transparente. O risco que corremos é que Rosales não confie no processo eleitoral, sobretudo no Conselho Nacional Eleitoral, controlado pelo governo, e decida renunciar a sua candidatura.

A utilização do Estado foi questionada durante a campanha?

ROMERO: Claro, foi denunciada pela oposição. Chávez chegou a dizer que as Forças Armadas venezuelanas deviam ser "vermelhas vermelhinhas" (um dos lemas da campanha chavista) e isso foi muito criticado.

Se Chávez for reeleito, terá outros seis anos de mandato pela frente. Como seria esse novo mandato?

ROMERO: O principal desafio do presidente será convencer os venezuelanos a aceitar um modelo socialista. Para mim, a reposta da maioria da população será negativa. Mas Chávez vai tentar aprofundar a revolução. Vamos ver se o preço do petróleo permitirá esse aprofundamento, porque os programas sociais custam fortunas. Outro desafio será obter a aprovação da comunidade internacional, que em geral não gosta de presidentes que buscam perpetuar-se no poder. Um dos projetos de Chávez é reformar a Constituição e aprovar a reeleição indefinida, mas será que isso será bem visto no exterior? O risco de isolamento é grande. (J.F.)