Título: Brasil a passos lentos
Autor: Luciana Rodrigues, Cássia Almeida e Demétrio weber
Fonte: O Globo, 10/11/2006, Economia, p. 25

Sem melhora na educação, país cai para 69º lugar no ranking do IDH da ONU

A melhora na saúde e na renda do Brasileiro em 2004, quando a economia cresceu 4,9%, na maior taxa dos últimos dez anos, não foi suficiente para fazer o Brasil galgar posições no ranking dos índices de desenvolvimento humano (IDH) do mundo. O IDH do Brasil subiu de 0,788 para 0,792, segundo relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) divulgado ontem. Mas o país piorou, saindo da 68ª para a 69ª posição entre os 177 avaliados pela ONU. Em 2004, o Brasileiro vivia mais (70,8 anos, ante 70,5 em 2003), com uma renda 3,1% maior. Mas os indicadores de educação (terceiro pilar do IDH, ao lado da saúde e rendimentos) não tiveram melhora.

A parcela da população adulta alfabetizada (88,6%) e de crianças e jovens na escola (85,7%) era a mesma de 2003. Sem avanços na educação, o Brasil perdeu espaço para a Bielorússia, ex-república soviética, que o ultrapassou e chegou a 67º lugar, e ficou entre a ilha caribenha de Dominica (68ª) e a Colômbia (70ª). O país tem caminhado a passos cada vez mais lentos rumo ao alto desenvolvimento, padrão que exige um IDH de pelo menos 0,80. O Pnud mostrou que, após subir o IDH a um ritmo de 0,94% ao ano entre 1995 e 2000, o acréscimo do Brasil foi só de 0,22% anual de 2000 a 2004.

O economista Sergei Soares, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), explica que as pequenas mudanças de posição no ranking são até esperadas diante da proximidade dos índices entre os países de médio desenvolvimento, como o Brasil. Porém, a velocidade menor no avanço tem um culpado claro, na sua opinião: o Ministério da Educação (MEC).

- A educação é um serviço oferecido pelo Estado. A renda e a saúde têm outras implicações. A educação, não. O governo vacilou na aprovação do Fundeb (fundo que vai financiar a educação básica) e a evasão aumentou. Nos anos 90, houve a universalização do ensino fundamental, que fez o país acelerar no IDH.

Noruega lidera e Níger é o último

A matrícula de Juliana Bispo Santos, de 14 anos, não foi renovada este ano. Ela desistiu dos estudos temporariamente, antes de completar a 4ª série do ensino fundamental. Numa família de seis filhos, os três mais velhos, de 16, 14 e 13 anos estão fora da escola. Já casada, Juliana, que mora numa favela do Complexo da Maré, espera se matricular numa escola noturna:

- Quis parar de estudar, não estava gostando. Mas vou me matricular de novo.

A alfabetização de adultos também deixou a desejar, afirma Naércio Menezes Filho, economista da USP:

- Isso é um problema para o MEC, que gastou muito dinheiro com o programa Brasil Alfabetizado, mas os resultados não estão aparecendo.

Apesar da estagnação nos indicadores de ensino, a educação ainda é a variável na qual o Brasil é mais bem avaliado. Nesse quesito, o IDH chega ao nível de alto desenvolvimento, com 0,88. Considerando apenas a renda ou apenas a saúde, o índice Brasileiro é menor: 0,74 e 0,76, respectivamente.

Para a economista Lena Lavinas, da UFRJ, o pequeno crescimento da economia também explica a lentidão do país nos indicadores:

- Estamos deixando para a população a responsabilidade por um investimento que é tipicamente do governo, como saneamento.

O acesso a água e esgoto tratado, aliás, é o tema do Relatório de Desenvolvimento Humano deste ano, que critica o saneamento no Brasil. Mas a ONU também elogia o país, citado como exemplo de que é possível reduzir a desigualdade de renda.

O assessor de Desenvolvimento Humano do Pnud no Brasil, José Carlos Libânio, avalia que a perda de posições do Brasil não significa que o país retrocedeu:

- O IDH mede coisas acumuladas em prazos mais longos. Mas o fato de ter subido significa que o Brasil está nessa trajetória de aumento paulatino do bem-estar.

A Noruega, mais uma vez, liderou o ranking, com 0,963. Na lanterninha ficou Níger, país africano cujo IDH é 0,281.