Título: ACUSAÇÕES DO COMEÇO AO FIM
Autor: Bernardo Mello Franco, Fellipe Awi e Maia Menezes
Fonte: O Globo, 09/10/2006, O País, p. 3

Discussão sobre corrupção domina debate entre Lula e Alckmin, que teve até ofensas

Oprimeiro confronto direto entre o petista Luiz Inácio Lula da Silva e o tucano Geraldo Alckmin, que se enfrentam no segundo turno, foi duro, com ataques, troca de acusações desde a primeira pergunta e até ofensas. Ao debaterem ontem na TV Bandeirantes, Lula e Alckmin chamaram-se de levianos. O tucano acusou o petista de mentiroso, omisso, fraco, de jogar responsabilidades nas costas de amigos, entre outros ataques. O petista chamou o adversário de bravateiro e leviano. Até nos detalhes os dois se atacaram: Alckmin fazia ironias com o fato de Lula ler as perguntas, e este o acusava de ter decorado respostas. O debate sobre corrupção dominou o encontro. Lula insistiu em comparar seu governo com o do ex-presidente Fernando Henrique, o que conseguiu em alguns ataques, mas Alckmin puxou o debate para o governo de São Paulo, que comandou até março deste ano.

Logo na primeira pergunta, do mediador, o jornalista Ricardo Boechat, Alckmin chamou Lula de fujão, por não ter comparecido a debates no primeiro turno das eleições. Ao responder sobre a necessidade de cortar despesas, já partiu para o ataque:

¿ Primeiro vou cortar gastos da corrupção. Vou cortar gastos dos cargos comissionados, dos companheiros de partido ¿ disse, referindo-se aos petistas que ganharam cargos no governo Lula.

O presidente reagiu à provocação, afirmando que Alckmin decora ¿chavões¿. Lula afirmou que os governos tucanos cortam ¿o salário do povo trabalhador¿.

¿De onde veio o dinheiro sujo?¿

O clima esquentou e Alckmin foi direto ao falar do escândalo da compra do dossiê contra tucanos por petistas:

¿ O presidente tem a Abin, é o chefe do ministro que comanda a Polícia Federal. É um dos homens mais bem informados do país. Candidato Lula, de onde veio o dinheiro sujo, R$1,7 milhão em reais e dólares, para comprar o dossiê fajuto?

¿ Eu não sou investigador. Possivelmente o governador tem saudade da tortura. Afastamos todos os envolvidos, mas não cometerei injustiça. Na hora em que a polícia tiver esclarecido os fatos, eles serão divulgados ¿ respondeu Lula.

Lula insinuou que quem planejou a compra do dossiê tinha intenção de prejudicar sua candidatura, e não a dos tucanos. E defendeu o desempenho da Polícia Federal no caso.

¿ Não só respondi (a essa pergunta) como vou responder a todas. Fomos vítimas de uma carga tributária aumentada pelo PSDB. Fazem exatamente 30 dias que ele (Alckmin) quer saber de onde vem o dinheiro. Eu quero saber mais. Quero saber quem arquitetou esse plano maquiavélico, porque o único beneficiado foi o meu adversário. A PF é muito competente e vai investigar. Ela vai descobrir. Mas não faz pirotecnia.

Alckmin foi ainda mais duro na réplica. Ele comparou o R$1,7 milhão apreendido pela PF no episódio da compra do dossiê com os recursos que os trabalhadores brasileiros ganham por ano.

¿ Veja, ele (Lula) não sabe de novo. Com R$1,7 milhão dá para o trabalhador viver 437 anos. Não teve curiosidade de perguntar ao churrasqueiro, para o presidente do Banco do Brasil, para o marido de sua secretária, para o coordenador do seu programa, de onde veio o dinheiro?

Ao reagir, Lula foi irônico e defendeu que a Polícia Federal continue a investigar o escândalo da compra do dossiê:

¿ Eu respondo com clareza. Mas não sou policial, sou presidente. A polícia tem regra para investigar. Aquilo que era pertinente a um presidente fazer, fiz. Agora cabe à Justiça e à polícia investigar. O senhor sabe que não tenho medo de debater. Não condenarei o inocente ou absolverei o culpado.

O presidente levou uma lista de perguntas por escrito e foi provocado pelo tucano, por estar lendo as questões. Lula, na primeira pergunta a Alckmin, devolveu o tom de denúncias que tomou conta do debate:

¿ O seu companheiro de partido Barjas Negri foi secretário-geral do Ministério da Saúde e depois ministro. Foi nessa época que os vampiros tomaram conta. Depois foi seu secretário de Habitação. O senhor sabia ou não? ¿ provocou o presidente.

Alckmin, o tempo todo com um meio sorriso nos lábios, responsabilizou o governo Lula pelos escândalos no Congresso:

¿ Não meça as pessoas pelas suas regras. Não tenho assessor ou ministro meu condenado. Tenho 32 anos de vida pública honrada. Os escândalos do sanguessuga e do vampiro são do seu governo. E, se começou antes, devia ser punido. Sou republicano, apure-se. Como é que compra ambulância superfaturada, roubo de sangue? Duvido que algum brasileiro saiba quem é o ministro da Saúde. O Brasil retrocedeu. Não fez hospitais. Quanto ao Barjas, no meu governo não tem absolutamente nada. Se há alguém que não tem moral para falar de ética é o governo Lula.

O presidente provocou mais uma vez o ex-governador de São Paulo ao insinuar que Alckmin agiu na Assembléia Legislativa de São Paulo para impedir a realização de CPIs contra o governo:

¿ Parece que o governador deve olhar para a cara do povo e dizer a verdade. Sessenta e nove pedidos de CPI foram arquivados. A que preço eu não sei. Não levantei um dedo para impedir CPI. Sou de formação pobre, mas de formação de que quem não deve, não teme. Barjas Negri tem 102 condenações dos tribunais de contas. Pelas informações da imprensa, o Abel estava lá (na negociação do dossiê). E o senhor diz que não sabia ¿ afirmou o presidente.

O tucano devolveu as acusações e disse que Lula mentiu. Ele afirmou que as denúncias contra o atual governo só vieram à tona por causa das revelações feitas deputado cassado Roberto Jefferson. Disse que a bancada do governo Lula na Câmara dos Deputados perdeu a batalha, porque era contra as CPIs.

¿ Quanta mentira! Como o Lula mudou. As CPIs só saíram porque o (ex-deputado) Roberto Jefferson contou tudo para o Brasil. O governo foi derrotado, por isso saíram as CPIs. Pela força dos fatos. Dinheiro vivo, dinheiro na conta ¿ disse Alckmin.

Lula também usou ironias ao dizer que Alckmin decorou os discursos para participar do debate:

¿ A impressão que eu tenho é que o meu adversário utiliza o hábito daqueles que decoram os chavões para participar do debate.

O candidato tucano, ainda no primeiro bloco, afirmou que o presidente está omitindo dos eleitores a intenção de aumentar os impostos, caso seja reeleito.