Título: DIÁLOGO ESSENCIAL
Autor:
Fonte: O Globo, 18/07/2006, Opinião, p. 6

Em um momento de civilidade em meio aos embates político-eleitorais em torno da questão da segurança, afinal o governo de São Paulo e o Palácio do Planalto entenderam-se sobre questões objetivas. Em entrevista coletiva conjunta, na sexta-feira, o governador Cláudio Lembo e o ministro Márcio Thomaz Bastos, da Justiça, anunciaram a liberação de R$100 milhões dos cofres federais para a reconstrução dos presídios destruídos na onda de rebeliões. O governo federal reiterou a oferta da Força Nacional, colocou à disposição do Palácio dos Bandeirantes o presídio federal de Catanduvas, recém-concluído, e acenou com uma colaboração mais estreita via Polícia Federal, Forças Armadas e Polícia Rodoviária.

Menos mal. A questão agora é saber se a remessa do dinheiro e o próprio gesto de aproximação terão seqüência concreta. Pois é da administração pública brasileira ter acessos de hiperatividade nas horas de tensão, para tudo voltar à estaca zero quando o pior passa. Mesmo que tenha sido apenas o refluxo de uma crise que voltará à tona mais adiante e com força.

É um clichê dizer que se aprende com os momentos críticos. Mas é verdade. Os dois surtos de violência em São Paulo e a degradação do quadro de segurança pública em praticamente todas as regiões metropolitanas já devem ter ensinado às autoridades que os investimentos nessa área não podem se resumir à compra de viaturas e armas. Se não houver um programa bem articulado, e de abrangência nacional, fuzis e radiopatrulhas de nada valem.

Também é necessário tratar especificamente do falido sistema penitenciário. O terrorismo de bandidos serviu para chamar de vez a atenção para cadeias superlotadas, em que se misturam condenados por pequenos delitos com marginais perigosos, já formados e prontos para adestrar seguidores. Aqui também não se trata apenas de gastar mais dinheiro. Sem uma reforma em leis e na Justiça para manter preso quem de fato é perigoso, punindo com penas alternativas os delitos menores, a superlotação será um problema quase insolúvel.

Há uma árdua tarefa à frente de administradores públicos e legisladores. É essencial que o diálogo e a cooperação entre governos e poderes ocorram como norma, e não apenas na tensão da emergência.