Título: ALIADOS DE URIBE JÁ PENSAM EM NOVA REELEIÇÃO
Autor: José Meirelles Passos
Fonte: O Globo, 30/05/2006, O Mundo, p. 27

Membros de coligação estudam nova mudança na Constituição colombiana para permitir outros mandatos

BOGOTÁ. A julgar por articulações que começaram a ganhar corpo ontem no interior da coligação Primeiro a Colômbia - formada por seis partidos que apóiam o reeleito presidente Álvaro Uribe - é provável que a charge marota da edição da revista "Cambio" que chegou às ruas ontem se transforme em previsão realista. Nela, um senhor alquebrado, apoiado numa bengala e com a faixa presidencial diz: "Se voltarem a me apoiar com mais uma reeleiçãozinha, a pátria vai alcançar a paz e a segurança que tanto queremos". Aos pés do personagem, obviamente Uribe, lê-se a inscrição: "Pesadelo 2030-2034".

Os colombianos deram um mandato tão claro ao presidente - 62,2% dos votos - na eleição de domingo que os líderes da coligação começaram a intensificar ontem, durante um almoço, uma estratégia para que o Congresso eleito em março aprove uma mudança na Constituição, como a que permitiu em dezembro a reeleição de Uribe. A idéia agora é ampliar essa possibilidade indefinidamente.

Risco de divisões na coligação do poder

O vazio político deixado pelos enfraquecidos partidos tradicionais - Liberal e Conservador - e o surgimento de uma figura carismática - forjada em grande parte por se apresentar como uma força independente da ultrapassada política vigente no país - dão ao presidente a força de um monopólio.

- Uribe já havia cultivado na opinião pública a velha idéia do xerife do Oeste: estão comigo ou contra mim. As expectativas dos colombianos estão postas no presidente. Eles votaram com sede de autoridade. Os partidos estão atomizados, reduzidos a partículas. E os demais atores, inclusive constitucionais, têm apenas uma minguada capacidade reativa diante das iniciativas da nova Presidência - disse o historiador Marco Palacios.

O principal desafio do segundo mandato de Uribe, segundo analistas locais, é evitar que a coligação que bancou sua segunda vitória não passe a exigir compensações - de acordo com interesses próprios de cada uma - e que no fim das contas acabe dividindo o governo em vez de manter sua unidade.

Por outro lado, há dois fatores a considerar. Um deles é novo: o surgimento de um partido de esquerda, o Pólo Democrático Alternativo, que obteve 22% dos votos e poderá ser uma pedra no sapato do governo - se não no Congresso, onde Uribe tem maioria, certamente na forma de pressões que poderiam pôr os parlamentares contra a parede ao tomarem decisões.

O outro fator é antigo e, como se viu domingo, crescente: o desinteresse - praticamente um desprezo, ou no mínimo um desânimo latente - em relação à classe política: mais da metade dos eleitores (55%) não votaram.

Ciente dos desafios que tem pela frente - renegociar a dívida externa, criar empregos, distribuir melhor a renda para reduzir a pobreza (metade da população) - Uribe deixou claro que não aguardaria o dia 7 de agosto, data de sua posse, para começar o novo governo. O segundo mandato começou ontem mesmo, disse ele, acrescentando:

- Tenho que melhorar muito e peço a Deus que me ajude nisso.

Uribe encomendou uma missa em sua cidade natal, Medellín, em agradecimento à vitória e em memória de seus pais. Ao deixar a igreja, chorou.