Título: A FÚRIA DAS TSUNAMIS
Autor:
Fonte: O Globo, 28/12/2004, O Mundo, p. 22

Ondas atingiram 13 países

Número de mortos já ultrapassa 23 mil. Mar devolve à praia milhares de corpos

Países do sul e do sudeste da Ásia iniciaram ontem uma dura batalha contra o gigantesco rastro de destruição deixado pelo mais devastador maremoto desde o final do século XIX, que varreu a região domingo. O número de mortos foi calculado em mais de 23 mil, mas autoridades indonésias disseram que só na província de Aceh poderia chegar a 20 mil. Enquanto o mar devolvia às praias milhares de corpos, equipes de socorro vasculhavam terra e água em busca de outros, em meio ao temor de epidemias. A ONU anunciou o início da maior operação de ajuda humanitária que já realizou.

- Este pode ser o maior desastre natural da História recente, porque está afetando muitas áreas costeiras populosas e inúmeras comunidades vulneráveis - disse Jan Egeland, coordenador de socorro de emergência das Nações Unidas.

Causadas pelo maior terremoto dos últimos 40 anos (9 graus na escala Richter), tsunamis (ondas gigantes) de mais de dez metros de altura devastaram em poucos minutos zonas costeiras principalmente de Índia, Sri Lanka e Indonésia. Mas percorreram milhares de quilômetros, atingindo pelo menos 13 países: na Ásia, além daqueles três, Malásia, Maldivas, Mianmar, Bangladesh e Tailândia; e na África, Somália, Quênia, Seicheles, Maurício e Reunião (ilha da França).

"Aparentemente nunca antes houve uma tsunami que atingisse todo o Oceano Índico", disse ao "Wall Street Journal" o oceanógrafo Eddie Bernard, do laboratório de estudos oceanográficos do Pacífico, em Seattle, estado de Washington.

Os paredões de água mataram desde modestos pescadores até um neto do rei Bhumibol Adulyadej, da Tailândia, que passeava de jet ski quando foi engolido pelas águas. Dezenas de milhares de pessoas saíram ontem em busca de desaparecidos, muitos deles turistas de inúmeros países que passavam o feriado de fim de ano em praias pardisíacas. Centenas de milhares de pessoas ficaram desabrigadas. Cortes de linhas telefônica e de energia elétrica dificultaram o socorro.

Aceh, dramático retrato da catástrofe

No Sri Lanka, o número de mortos mais do que dobrou de um dia para o outro, chegando a 11 mil, dos quais 200 seriam turistas estrangeiros.

- É uma grave tragédia para a qual não estávamos preparados - disse a presidente Chandrika Kumaratunga.

Na Indonésia, onde foram registradas quase cinco mil mortes, um dos mais dramáticos retratos da tragédia era Aceh, na ilha de Sumatra, perto do epicentro do terremoto. Nas ruas da capital, Banda Aceh, dezenas de cadáveres se espalhavam entre escombros e carros destruídos.

- O cheiro é tão ruim... Os corpos humanos estão misturados a animais mortos, como cachorros, peixes, gatos e cabras - lastimou o coronel Buyung Lelana, que comandava as operações de socorro.

Em toda a região, moradores reviravam destroços e percorriam hospitais, muitos com fotos de desaparecidos na mão e narizes cobertos com lenços, devido ao mau cheiro dos cadáveres. Pilhas de corpos desfigurados eram descarregadas de caminhões militares em hospitais, onde corpos de crianças eram enfileirados e cobertos com sarongues. Outros eram postos em caixas de pescados.

- Espero que haja caixões em número suficiente - disse o prefeito de Banda Aceh, Mustofa.

No sul da Índia, mais de 6.600 pessoas morreram. Um das regiões mais devastadas é a das ilhas Andaman e Nicobar, onde cinco cidades foram engolidas pelas águas, pelo menos três mil pessoas morreram e 30 mil estavam desaparecidas. Até na distante Somália, 38 pessoas foram tragadas pelas tsunamis. Na Tailândia, mais de 800 pessoas morreram.

- Nosso paraíso se transformou num inferno - disse a americana Moira Lee, na ilha de Phuket.