Título: ALTA PASSAGEIRA
Autor:
Fonte: O Globo, 06/01/2006, Opinião, p. 6

O consumo de álcool carburante andou estagnado por vários anos. Voltou a crescer a partir do aumento do percentual de mistura à gasolina para 25% e da fabricação de automóveis bicombustível. Ao fim de 2005, esse tipo de veículo já correspondia a 70% das vendas de automóveis novos no país. Além de recuperação do consumo interno, os produtores de etanol foram estimulados a exportar, para ocupar espaços abertos pelo Tratado de Kioto, pois vários países assumiram o compromisso de reduzir a emissão de gases que contribuem para o aquecimento global. O Japão, por exemplo, passou a recomendar uma mistura de 3% de álcool à gasolina usada em seus automóveis.

Como as cotações do açúcar também estão favoráveis no mercado internacional - a maior parte das usinas pode optar por produzir mais açúcar ou mais álcool - houve uma inevitável elevação dos preços do etanol.

Até que o período de entressafra da cana-de-açúcar se encerre, em abril, não há muito o que fazer para atenuar essa pressão, a não ser incentivar a desova de estoques. Se o Brasil suspender as exportações, estará alimentando os temores de que o abastecimento de álcool não seria mesmo confiável, e alguns países poderiam recuar da decisão de misturar etanol à gasolina.

Se o percentual de mistura de álcool à gasolina for reduzido de 25% para 20% no Brasil, o consumidor pagará mais caro da mesma forma, pois os derivados de petróleo estão custando bem mais. E como é cada vez maior a proporção de veículos bicombustível no país, com a gasolina mais cara os consumidores correrão em direção ao álcool, e desse modo a pressão de demanda sobre o produto se acentuará.

Não há nesse caso solução antimercado. O governo deveria reduzir temporariamente o valor da Cide (que hoje é de R$0,50 por litro de gasolina), mas, pelo volume de gastos programados para os próximos meses, é muito provável que as autoridades já venham contando com essa receita para 2006.

A produção de cana - e também a de açúcar e a de álcool - tende a crescer muito com os investimentos que estão em curso. Então, é preciso só ter calma.

Intervençãono álcool é a alternativa menos indicada