Título: Uma boa experiência
Autor: JULITA LEMGRUBER
Fonte: O Globo, 22/12/2005, Opiniao, p. 7

Em Minas Gerais, polícias militar e civil começama trabalhar deforma integrada

Que a situação da segurança pública no país é dramática, todos sabemos. No entanto, é preciso, mais do que nunca, que críticas e cobranças venham acompanhadas de sugestões e de uma reflexão séria sobre alternativas e experiências exitosas que podem e devem ser replicadas.

O GLOBO publicou (28/7) artigo sobre a experiência vitoriosa de Diadema que, em 4 anos, reduziu sua taxa de homicídios em 47%. Aqui, gostaria de ressaltar o que vem sendo feito em Belo Horizonte, onde o governo estadual está desenvolvendo alguns programas dignos de nota, entre eles: Fica Vivo, Juventude e Polícia e Integração e Gestão em Segurança Pública.

O Programa Fica Vivo, que acontece em áreas pobres como o Morro das Pedras, Cabana, Pedreira Prado Lopes e outras, já registra resultados muito positivos, tendo provocado queda de 22% no índice de homicídios nessas localidades, se comparados os primeiros oito meses de 2004 e 2005. O programa alia ações preventivas (oficinas educativas, culturais e profissionalizantes), dirigidas a jovens entre 12 e 24 anos e ações de patrulhamento ostensivo do Grupamento Especializado de Áreas de Risco da Polícia Militar.

O Projeto Juventude e Polícia, desenvolvido em parceria com o Afro Reggae e o CESeC da Universidade Candido Mendes, vem aproximando a Polícia Militar de Minas Gerais dos jovens pobres dos chamados "aglomerados" da cidade de Belo Horizonte e quebrando resistências que, ao longo de uma relação cheia de conflitos, sempre impediram qualquer aproximação saudável entre esses dois grupos. A desconfiança inicial tem dado lugar a experiências tocantes entre jovens e policiais que se descobrem como seres humanos com as mesmas emoções e angústias. Através de oficinas de música, teatro, grafite e dança, o Afro Reggae "treina" policiais que, por sua vez, estão "treinando" a garotada dos bairros pobres.

Finalmente, o Integração e Gestão em Segurança Pública, a mais recente e inovadora iniciativa na área gerencial das polícias, que já começa a produzir resultados. Inspirada no Compstat, da polícia nova-iorquina, o Igesp começou a funcionar em julho deste ano. Para os que acreditam que os índices de criminalidade de Nova York caíram por causa da política de tolerância zero, seria muito interessante conhecer o Compstat e a revolução gerencial que provocou. Esta, sim, fundamental para a derrubada das taxas de criminalidade, inclusive daquela dos homicídios.

O Compstat (sigla em inglê para Computerized Statistics) é como se convencionou chamar os encontros semanais que reúnem toda a cúpula da Polícia de Nova York, tanto aquela do segmento uniformizado, quanto a dos investigadores. Tive a oportunidade de assistir a uma dessas reuniões e fiquei impressionada com o grau de profissionalismo e seriedade com que são analisados os resultados do trabalho policial nas diferentes regiões da cidade, a partir de análises estatísticas abrangentes e precisas. Considera-se que o fluxo de informações seja fundamental para competentes diagnósticos, planejamento e monitoramento do trabalho.

Pois bem, Belo Horizonte já criou o seu Compstat: na versão local, o Igesp. Exatamente como acontece em Nova York, as reuniões se realizam numa grande sala, com cerca de 170 metros quadrados, onde, ao redor de uma grande mesa em formato de U, encontram-se figuras chave das Polícia Militar e Civil - comandantes de batalhões e os responsáveis por delegacias especializadas (homicídios, roubos e furtos, etc), além de representantes do Ministério Público. Na base do "U" se sentam o comandante da Polícia Militar e o chefe da Polícia Civil, ladeados por um representante da Secretaria de Segurança e pelo diretor do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública da Universidade Federal de Minas Gerais (Crisp). E, ali, são discutidas as metas e resultados de ações em várias regiões da cidade de Belo Horizonte, através da utilização de sofisticados softwares utilizados com competência por policiais militares e civis treinados.

Trocando informações, rompendo com a lógica de duas polícias que sempre trabalharam disputando espaço e poder (o que, de resto, é a marca das polícias estaduais no país), as polícias militar e civil de Minas Gerais começam a, efetivamente, atuar de forma integrada. Estive em Belo Horizonte e acompanhei uma reunião do Igesp. Aconselho a todos os Secretários de Segurança do país que o façam. Há muito a aprender com os mineiros.

JULITA LEMGRUBER é diretora do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Cândido Mend