Título: BC rachado
Autor: Flávia Oliveira
Fonte: O Globo, 15/12/2005, Economia, p. 30

O corte de meio ponto percentual na Selic era mais que esperado. A novidade da longa reunião de ontem foi a falta de consenso. Foi a primeira vez que isso aconteceu desde setembro de 2004, quando o que estava em jogo era o tamanho da alta dos juros. A taxa básica caiu para 18% ao ano com seis votos. Dois membros do Copom preferiam a redução de 0,75 ponto percentual. E expuseram a preferência num momento em que o BC vem sendo criticado pelo excesso de austeridade.

Tanto a ata da 114ª reunião do Copom, em novembro, quanto o discurso do presidente do BC, Henrique Meirelles, na semana passada deixavam poucas dúvidas sobre o resultado de ontem. Nem a variação negativa do PIB no terceiro trimestre alterou a mediana das expectativas do mercado em relação à queda da Selic ontem. Há 18 semanas, os analistas apostavam no recuo de 0,5 ponto percentual.

Sobravam evidências de que não haveria ousadia. Mas, em entrevistas nos dias seguintes à divulgação do PIB pelo IBGE, dois diretores do BC ¿ Alexandre Schwartsman, da Área Internacional, e Rodrigo Azevedo, de Política Monetária ¿ deram a entender que havia espaço para uma flexibilização maior.

Desde o início da semana, pairava entre os analistas a dúvida sobre a possibilidade do dissenso. Com o BC sob a avalanche de acusações de exageros na política monetária, muitos duvidavam que a delicada reunião de dezembro, a última do ano, chegaria ao fim sem unanimidade.

Foi o que aconteceu. Dois integrantes do Copom defenderam um corte maior nos juros. É certo supor que acreditam que a meta de 2005 está assegurada e a de 2006, sob controle. Seria hora, então, de apressar o alívio à atividade econômica.

Foram votos vencidos, mas deixaram claro ao país que, pela primeira vez em 15 meses, o Copom rachou. A divergência na equipe do BC se soma a tantas outras dentro de um governo também rachado em que ministros de Estado já não fazem questão de esconder suas diferenças.

A última reunião do Copom de 2005 trouxe mais incerteza para a economia. Dúvidas que só serão esclarecidas no primeiro bimestre de 2006, quando os números da atividade econômica de novembro e dezembro deste ano dirão se a hora era de gradualismo ou de ousadia.