Título: PARA AMORIM, SÓ MILAGRE SALVA RODADA DA OMC
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Fonte: O Globo, 13/12/2005, Economia, p. 25

Resistência da UE em apresentar nova proposta sobre setor agrícola gera consenso de que reunião fracassará

HONG KONG. Às vésperas do início da 6ª Reunião Ministerial da Organização Mundial do Comércio (OMC), o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Celso Amorim, expressou o pessimismo geral que tomou conta dos principais interlocutores do encontro, que nos próximos seis dias tentarão destravar em Hong Kong as negociações para a abertura do comércio mundial.

¿ Agora ficou claro que, a menos que ocorra um milagre, não teremos um acordo final em Hong Kong ¿ afirmou o chanceler brasileiro.

Após inúmeras reuniões preparatórias para este encontro, as principais potências comerciais ¿ os Estados Unidos, a União Européia (UE) e o G-20 (grupo de nações em desenvolvimento lideradas por Brasil, Índia, China, Argentina e África do Sul) ¿ não conseguiram sequer definir um esboço de acordo. O impasse se dá sobretudo na resistência dos países em abrir seus mercados sem uma contrapartida equivalente.

O G-20 e os EUA pressionam a UE a eliminar seus subsídios agrícolas, mas o bloco europeu enfrenta resistência interna, sobretudo de agricultores franceses. O governo dos EUA, por sua vez, pressionado pelos crescentes déficits comerciais e em conta corrente, também sofre resistência do Congresso americano para fazer concessões nas negociações.

Líderes já trabalham para nova negociação em 2006

Por fim, países como o Brasil resistem em abrir setores como serviços, onde empresas européias e americanas são competitivas, sem um contrapartida das nações ricas. Segundo Amorim, sem uma melhor oferta por parte da UE no sentido de reduzir subsídios e alíquotas no setor agrícola, o milagre não acontecerá em Hong Kong.

¿ A agricultura é o motor e o que liga esse motor é o acesso ao mercado agrícola ¿ disse Amorim.

Um pouco antes das declarações do chanceler brasileiro, o representante de Comércio dos EUA, Rob Portman, afirmou, referindo-se à proposta da UE para o setor agrícola, que fazer um acordo raso, não é fazer um bom acordo. Os europeus, por sua vez, afirmaram que não pretendem aprofundar em Hong Kong a proposta feita anteriormente, de redução das barreiras tarifárias em 39%.

O comissário de Comércio da UE, Peter Mandelson, afirmou que não será possível alcançar um acordo na China e acrescentou que os 148 países-membros da OMC devem aproveitar o encontro para preparar uma nova rodada de negociações para o início do ano que vem.

Em uma reunião preliminar, Amorim, Mandelson, Portman, o diretor-geral da OMC, Pascal Lamy, os ministros da Índia e Japão, e delegados da Austrália deram início às negociações de uma nova reunião da OMC em 2006. Segundo Amorim, não se falou em números e menos ainda em uma data para início do compromisso europeu de eliminação dos subsídios.

¿ Não desistimos. Isto não é uma partida de futebol que, após os 90 minutos, acaba definitivamente. Aqui (nas negociações em Hong Kong) o árbitro tem o poder de prorrogar o jogo ¿ disse Amorim. ¿ Os próprios ministros podem decidir convocar novas reuniões e estabelecer novos prazos.

Negociadores tentam acordo para integrar países pobres

Ao mesmo tempo que a UE era pressionada por todos os demais blocos, vários líderes prometeram ontem ajudar as nações mais pobres a obter uma fatia maior do comércio. Portman disse que foi ao encontro para trabalhar e estava buscando progresso em áreas litigiosas das problemáticas negociações.

¿ Acho que isso (ajudar os países pobres) poria as negociações em um nível realista ¿ disse Mandelson. ¿ Isso daria a elas uma face mais humana.