Título: POR UM PAÍS MAIS ÉTICO E JUSTO
Autor:
Fonte: O Globo, 29/10/2005, O Globo, p. 1

Corrupção deve ser combatida para pôr fim a desigualdades

Depois de tantos escândalos, discussões, afirmações e negações sobre o assunto, há quem diga que a corrupção já está, fatalmente, incutida em nossa política, representando apenas um dado a ser aceito. No entanto, devo dizer que tal visão é equivocada, na medida que favorece, única e exclusivamente, a impunidade. Ainda que se possa argumentar que os desvios de conduta são próprios da natureza humana, não podemos nos esquecer de que eles não deixam de ser erros, e o mínimo que se pode fazer é não aceitar a sua continuidade. Compreensão é diferente de conformismo, e corrupção é sinônimo de mau-caratismo.

Refletindo sobre o suborno e a compra de votos, que são algumas das faces dessa ação infame, pode-se notar a violação que é feita aos valores éticos. As práticas citadas, além de injustas, contrariam a liberdade e, principalmente, a veracidade de expressão, pois elas invalidam a autenticidade opinativa do indivíduo ¿comprado¿. Este, diga-se de passagem, faz um verdadeiro papel de tolo, senão melhor dizer de marionete. Portanto, tais manipulações semeiam a mentira e a desonestidade.

Desvio de verbas atinge os pobres

Além disso, há uma outra prática na qual reside o maior prejuízo que a corrupção acarreta na sociedade. Trata-se do desvio de verbas, ato que traz conseqüências ruins e diretas, principalmente sobre as camadas mais pobres da população; e que representa uma grande alienação por parte dos políticos, que ignoram os efeitos de suas ações ilícitas.

O procedimento consiste na apropriação de dinheiro a ser usado para benefício público e sua respectiva utilização para outros fins, que, em geral, correspondem a gastos individuais, grandiosos e, comumente, supérfluos dos apropriadores, os quais usufruem situação social privilegiada. O resultado, por conseguinte, é a ausência de manutenção ou mesmo a não realização de obras públicas, como a construção de hospitais, escolas e redes de esgoto. Dessa forma, é agravada, cada vez mais, a carência das populações de baixa renda, havendo o aumento da fome, das doenças da mendicância e, até mesmo, da violência, sendo esta, nesse caso, um grito dos oprimidos.

Dizer que a corrupção é a causa fundamental dos problemas sociais seria um exagero, mas não é errado dizer que ela acentua em muito as desigualdades. Pelo menos, quanto à questão da moradia, parece que ¿não temos do que reclamar¿. Afinal, não há ¿nada de errado¿ no fato de as verbas serem usadas preferencialmente nas reformas das casas de deputados, senadores e outros instigadores da corrupção, enquanto mendigos e favelados têm de se conformar em permanecer esquecidos. Deixando de lado a ironia, concluo que, além de desonestos e egoístas, os corruptos são covardes.

Logo, pode-se ver que a corrupção é um ato injusto, que, como o próprio nome diz, corrompe em muito a própria sociedade. Portanto, não devem ser poupados esforços no seu combate, sendo a correta investigação e a demissão dos criminosos o mínimo que pode ser feito. O ideal é que todos participemos desse processo, transformando idéias em palavras, como faço neste artigo, e palavras em ações, ainda que sejam apenas cobranças. Afinal, se o brasileiro realmente não desiste nunca, deve ser perseverante também na procura pelos culpados, pois esta seria a busca pelos seus próprios direitos e, possivelmente, o início do fim das marcantes desigualdades sociais que assolam o país.

REPORTAGEM de Kristian Andrade Paz de la Torre, 15 anos, do Flamengo, no Rio