Título: SOCIEDADE AINDA BUSCA SOLUÇÕES PARA O LIXO
Autor:
Fonte: O Globo, 29/10/2005, O Globo, p. 1

O meio ambiente é o maior prejudicado pela falta de medidas efetivas

Sempre que se vê uma referência a lixo, vem à lembrança coisa ruim, imprestável, inútil. Tudo que é ou está ruim, joga-se no lixo. Daí a conclusão: não se encontra nada de valor no lixo. Então, lixo é tudo que não presta. Se prestasse, não seria lixo e não teria sido jogado fora. Está certo isso?

Felizmente, esse entendimento das pessoas vem mudando ultimamente, por necessidade de sobrevivência da Humanidade. Disse sobrevivência e não exagero, pois é apenas questão de raciocinar sobre o assunto para concluir desse modo.

Pensei um dia, quando meu pai comprou uma geladeira: ¿Que bonita, novinha, brilhando, funcionando perfeitamente. Mas durante quanto tempo ela será novinha, bonita e funcionará como deve?¿

Não importa quanto tempo ela vai durar, pois é certo que dentro de um prazo ela será também um lixo e até ser consumida pela Natureza e ser reintegrada ao ambiente natural muitos anos vão passar.

Garrafas PET entopem rios

A conclusão fatal que se tira é que tudo que se fabrica é um lixo; futuro, mas é lixo. Quando se tornar imprestável para o uso original, habitará um monturo em algum ponto da Terra, aguardando o trabalho da Natureza de decompor os seus elementos e aproveitá-los em suas qualidades essenciais. Que fazer com as montanhas de pneus que existem em vários lugares? Já se pensou que a queima desse material se tornaria a solução, pois os pneus seriam consumidos. Hoje, entretanto, sabe-se que a fumaça decorrente da incineração é altamente nociva ao meio ambiente, envenenando a atmosfera e comprometendo não só a saúde de pessoas e animais, como transtornando a composição do ar.

Se queimar os pneus não soluciona o problema, resolveu-se esperar que a Natureza o faça, transformando a matéria-prima em outros elementos absorvíveis. Deve-se registrar que há experiências relativas ao aproveitamento da borracha dos pneus para fazer concreto e utilizá-lo nas construções de imóveis.

As garrafas PET também têm sido usadas para fazer objetos de utilidade e até paredes de casas ou imóveis estilizados. Mas esse esforço de resolver o problema é ainda muito pequeno, pois absorve uma pequena quantidade desse lixo. É preciso fazer muito mais pelo nosso planeta.

Fiquei intrigado. Até quando a natureza vai suportar esse acúmulo de serviços que o homem está atribuindo aos meios naturais de recomposição dos materiais de nosso planeta? Mais cem anos ou mil e até mais? Parece que é forçoso admitir que um dia esse limite se esgotará, não antes de causar muitos percalços à Humanidade.

Há o lixo que se decompõe rapidamente, como o de material orgânico. Mas outros precisam de muitos anos ou séculos para sua reciclagem natural, como os plásticos. Aquelas garrafas de refrigerante, que tornaram muito prático o serviço de entrega de bebidas sem o retorno das embalagens, têm toda a aparência de que resolveram um grande problema.

Ainda me lembro das velhas garrafas de vidro que eram devolvidas ao vendedor com o nome curioso de casco. Era um trabalho a mais, pois as garrafas deviam ser devolvidas e depois lavadas e rotuladas novamente, gastando dinheiro de carreto e com o risco de quebrar.

Pois as embalagens chamadas de PET, tão práticas, tão higiênicas, tão baratas, são um encargo pesado para a sociedade, causando entupimento em rios, lagos e canais, a ponto de torná-los inúteis.

Coleta seletiva é um passo inicial

Por enquanto, só os técnicos têm tomado conhecimento do problema e estão reclamando soluções. Mas isso é muito pouco para resolver o problema. A conscientização deve ser coletiva, de toda a sociedade, para que as medidas necessárias à solução do problema sejam adotadas.

O povo já está aprendendo a selecionar o lixo, separando o material orgânico dos metais, dos plásticos e dos vidros. É um começo de jornada. É um pouco do que se precisa fazer, mas ainda serão necessárias medidas mais efetivas para resolver o problema.

É preciso que as fábricas adotem medidas no próprio processo industrial para evitar que se fabriquem além do lixo, que é o próprio material industrializado, os resíduos poluentes, que ajudam a deteriorar a Natureza.

Tudo parecia muito simples. Fabricar um produto e jogar fora o resíduo, imprestável e nocivo à Natureza. Que fazer com o resíduo nocivo? Isso não era problema das fábricas, mas da Natureza. Com o tempo tudo se resolvia. Era o que pensavam, quando a situação ainda apresentava os primeiros sinais.

Mas hoje, quando tomamos conhecimento de que rios estão morrendo; de que florestas estão sendo extintas; de que se tira o mineral nobre da terra, deixando-a inteiramente desvirtuada e inútil, infértil para plantação de qualquer espécie, é preciso pensar mais no assunto.

E pensar no assunto importa em sugerir medidas mais efetivas para obedecer às leis da Natureza. É preciso, em primeiro lugar, esquecer os lucros financeiros que resultam em prejuízos para a Natureza.

Ao legalizar um estabelecimento industrial, deveria ser exigido dos responsáveis que comprovassem a adoção de processo de fabricação que não deixasse qualquer resíduo que possa causar danos ao ambiente natural.

Cada indústria deve produzir os bens úteis que fabrica, mas sem causar danos ao meio ambiente. Na impossibilidade de fabricar determinado produto sem causar prejuízo à Humanidade, a empresa não deveria ser legalizada.

Pode parecer mais fácil de falar do que de fazer. Mas gradativamente é possível que se caminhe nesse sentido, até que um dia consigamos atingir o ponto ideal.

A Natureza espera dos homens essas providências, que agradecerá, com certeza, embora os maiores benefícios sejam mesmo para a Humanidade. Fazer o bem é sempre bom. Ainda mais quando o benefício atinge a todos.

Que não se esqueça, entretanto, de apoiar os catadores de lixo, que agem com eficiência para favorecer a todos, embora recebam apenas uma pequena parte do benefício, traduzido em dinheiro para a sua sobrevivência.

Falta apoio para catadores

O catador de material para reciclagem deve ser apoiado pelo governo, por formas e modos variados. Podem receber um estímulo mensal, sob a forma de gratificação. Podem ser isentos de impostos e ter incentivos para a organização de cooperativas.

A utilidade dos catadores, que vivem dos lixões, precisa ser reconhecida urgentemente, para que essa atividade se multiplique, mas em condições mais higiênicas, evitando o risco de adquirir doenças.

Vamos reconhecer o valor dessa gente e ser beneficiados por ela.

Para fazer esse texto, fui buscar os ensinamentos de pessoas mais vividas, que me transmitiram boas idéias para esta reportagem.

REPORTAGEM de Ivan Langone Francioni Coelho, 11 anos, da Tijuca, no Rio