Título: SÍNDROME DE DOWN TEM DEBATE EMOCIONANTE
Autor: Fábio Vasconcelos
Fonte: O Globo, 20/10/2005, Rio, p. 18

Em auditório do GLOBO, lotado, portadores sobem espontaneamente ao palco para falar sobre suas vidas

O debate sobre a inclusão social dos portadores de síndrome de Down, promovido anteontem pela série Encontros do GLOBO, não foi apenas um bate-papo sobre o tema proposto, mas também um evento emocionante. Portadores da síndrome mudaram a dinâmica do encontro ao subirem espontaneamente ao palco para dizer o que pensam sobre suas vidas e as dificuldades, por exemplo, para encontrar um emprego. Além de pais e especialistas, o evento, que lotou o auditório do jornal, contou com a presença do cineasta Evaldo Mocarzel. Ele apresentou seu documentário ¿Do luto à luta¿, aplaudido por mais de um minuto pela platéia.

O filme mostra o drama dos pais quando descobrem ainda na maternidade que os filhos são portadores de Down. Mas o documentário também conta como essas crianças podem levar uma vida igual à de outras. Por várias vezes o público sorriu e encheu os olhos de lágrimas com os depoimentos dos parentes de portadores da síndrome de Down. Os jovens foram filmados em atividades no dia-a-dia, no trabalho e deram entrevistas contando seus planos para o futuro e seus relacionamentos amorosos.

Pais criticam despreparo de professores

Após a exibição do documentário, o jornalista do GLOBO Mauro Ventura mediou o debate entre o cineasta Mocarzel; a coordenadora do Instituto Meta Social, Helena Werneck, responsável pela campanha, ¿Ser diferente é normal¿; Cláudia Pires, do Instituto Helena Antipoff; e Rodrigo Oliveira, portador da síndrome de Down e que participou do filme. Mocarzel contou que quis fazer um documentário para mostrar ao público que portadores podem levar uma vida normal. Ele explicou também que o filme ajuda a acabar com os preconceitos que muitas pessoas ainda têm contra homens e mulheres com Down. O cineasta confessou ter sofrido ao saber que a filha tinha a síndrome.

¿ Sofri muito, e depois percebi que era pura falta de informação. Acho que o filme tem essa intenção, dar informações aos pais, para que desde cedo eles percebam que o conhecimento pode ajudar a acabar com os preconceitos.

Rodrigo Oliveira, que aparece no documentário surfando, disse que decidiu praticar o esporte depois que viu seu irmão em cima de uma prancha. Helena Werneck explicou que o país precisa avançar muito para acabar com o preconceito em relação aos portadores da síndrome. Ela lembrou de uma recente declaração de um deputado federal e de um canal de TV que usaram a palavra ¿mongolóide¿ de maneira pejorativa.

¿ Acho que avançamos, mas ainda falta muito. Acredito que, quanto mais a sociedade tiver informações, a tendência é o preconceito diminuir. A MTV, por exemplo, teve que se retratar e pedir desculpas pela maneira grosseira com que usou a palavra mongolóide ¿ avaliou Helena, que também é mãe de uma jovem portadora da síndrome de Down.

A educadora Cláudia Pires respondeu a perguntas de pais que criticaram as escolas públicas do município. Para eles, muitos professores não estão preparados para receber crianças com síndrome de Down. O Instituto Helena Antipoff, ligado à prefeitura, foi criado há quase 31 anos e promove cursos de atualização para professores que trabalham com a educação especial. Além de críticas, Cláudia também ouviu elogios de uma mãe que contou como seu filho passou a ter um melhor desenvolvimento educacional quando migrou para a rede pública de ensino.

Rio tem 1.700 crianças com algum tipo de deficiência

O vice-prefeito do Rio, Otávio Leite, assistiu ao filme. Segundo ele, a cidade tem hoje cerca de 1.700 crianças com algum tipo de deficiência.

¿ Pedimos dez cópias desse filme para o Mocarzel e já estamos exibindo nas salas de aula do município ¿ informou.

Antes que o debate terminasse, quatro portadores da síndrome de Down subiram ao palco e contaram suas experiências de vida. A disputa foi grande pelo monopólio do microfone, mas, no fim, todos conseguiram dar o seu recado. Breno Viola, de 24 anos, por exemplo, além de falar do preconceito que sofreu dos pais de uma ex-namorada, aproveitou para pedir ajuda da platéia para patrocinar um viagem para a Inglaterra, onde participará de uma campeonato de lutas marciais.

Bem-humorado, Breno arrancou risos do público e acabou recebendo o convite para se sentar à mesa dos debatedores. Mãe de Wagner, de 25 anos, portador da síndrome de Down, Conceição Calabrim elogiou a iniciativa do jornal de discutir a inclusão social dos portadores da síndrome:

¿ Estou muito feliz. A idéia de mostrar o filme e trazer pessoas para discutir o assunto é fundamental.