Título: SEM RISCO, MAIS CRÉDITO
Autor: Wagner Gomes e Fabiana Parajara
Fonte: O Globo, 01/11/2004, Economia, p. 23

Volume de empréstimos com desconto em folha de pagamento já ultrapassa R$10 bi

Ocrédito consignado, aquele cuja prestação é descontada em folha de pagamento, atrai cada vez mais os consumidores, por causa dos baixos juros, e os próprios bancos, que têm reduzido risco de inadimplência. Segundo dados do Banco Central, o volume destes financiamentos no país cresceu 5,8% em setembro e atingiu R$10,152 bilhões, valor que já equivale a 78,6% do montante total de empréstimos pessoais.

De olho neste filão, que já foi criado pelo governo para ser uma opção mais barata para o trabalhador, os bancos vêm reduzindo ainda mais as taxas e, assim, torná-lo mais atraente. De janeiro a setembro deste ano, os juros do crédito em consignação caíram de 42,5% para 39,1% ao ano. Enquanto isso, os juros do crédito pessoal variaram de 79,1% para 73,9% ao ano, no mesmo período. A taxa mensal no crédito consignado não costuma passar de 2,8%, enquanto no crédito pessoal atinge 6%.

¿ O crédito consignado é a vedete do mercado. O risco para os bancos é muito menor, já que o negócio se expande com segurança, sem aumento da inadimplência ¿ afirma Denilson Molina, gerente-executivo para a área de crédito do Banco do Brasil (BB).

Grande procura de aposentados

Molina explica que o BB concentra a sua carteira de crédito consignado no setor público, mas pretende aumentar a sua clientela nas empresas privadas. Segundo ele, o volume de financiamentos com crédito consignado deve chegar a R$1,5 bilhão em 2004. No início do ano, o volume era de R$550 milhões. O banco tem atualmente 2.500 convênios com empresas. O limite de crédito varia de acordo com a capacidade de pagamento do trabalhador.

Na Caixa Econômica Federal (CEF), chega a um milhão o número de operações através do sistema de desconto em folha, segundo José Humberto, superintendente nacional de Empréstimo de Pessoa Física e Microfinanças da instituição. Em 2003, eram 493 mil operações. Humberto explica que a CEF tem convênio com 12 mil empresas. A carteira da instituição soma este ano R$3,143 bilhões, 58% a mais do que o mesmo período do ano passado. Segundo o superintendente da Caixa, o limite de empréstimo é de R$100 mil e a prestação não pode exceder a 30% da renda líquida do trabalhador.

No montante emprestado pela Caixa, estão incluídos os financiamentos concedidos a aposentados e pensionistas do INSS, que ficam entre os que mais procuram este tipo de empréstimo. Segundo balanço da Dataprev, empresa de tecnologia e informações da Previdência Social, mais de 361 mil segurados já usaram o crédito em todo o país. São Paulo é o estado com maior número de pedidos.

A Caixa e o Banco de Minas Gerais (BMG) já emprestaram R$1,112 bilhão aos aposentados. Recentemente, o Banco Bonsucesso também passou a dar crédito para os segurados do INSS. Estão em homologação no instituto para participar do processo o Banco Cacique, Cruzeiro do Sul, BGM e Banco Paraná. O Banco Mercantil já fez um pedido para ter mais informações sobre a modalidade de crédito.

Já a carteira de crédito consignado do ABN Amro Real soma R$1,5 bilhão. No Sudameris e no Bandepe, recém-adquiridos pelo banco, são outros R$605 milhões. Segundo Maria Eugênia López, superintendente-executiva da instituição, o Real vai aumentar em cerca de R$500 milhões esta carteira até dezembro de 2004, com os convênios que estão sendo fechados. O banco tem 850 postos de atendimento dentro de empresas.

¿ Os empréstimos consignados para funcionários de empresas privadas representavam 7,35% da nossa carteira em novembro passado. Agora essa participação mais que dobrou e chega a 18% ¿ diz ela.

As taxas de juro do Real variam de 1,75% a 2,6% ao mês, dependendo do índice de rotatividade de mão-de-obra da empresa conveniada. Os prazos de pagamento vão de três a 36 meses. Maria Eugênia explica que muitos buscam o crédito consignado para cobrir outras dívidas, mas os tomadores usam o crédito principalmente para a compra de carro ou complementar a compra de imóveis. Para os clientes de faixa de renda mais baixa, o dinheiro serve ainda para compra de produtos.

Natal deve aumentar número de pedidos

Edson Monteiro, vice-presidente de Varejo do BB, afirma que as compras de Natal devem incentivar os correntistas a pedir mais dinheiro emprestado. Para Álvaro Musa, diretor da Partner, consultoria especializada em serviços financeiros para consumidores, as taxas são vantajosas, mas os consumidores precisam ser bem orientados para não abusarem do recurso e acabarem com mais dívidas.

Foi o que aconteceu com a funcionária pública Mara Lúcia de Oliveira. Há alguns meses ela obteve crédito com desconto na folha de pagamento, mas, para arcar com dívidas contraídas por problemas de saúde, acabou tendo que buscar mais três empréstimos em financeiras, apesar dos altos juros cobrados pelas empresas. No financiamento mais recente, tomado em outubro, ela passou mais de 15 dias pesquisando taxas antes de assinar o contrato:

¿ Os juros variam de 12,5% a 14% ao mês, mas, como preciso quitar essa dívida, não tenho alternativa a não ser arcar com essas taxas abusivas. Numa dessas linhas, vou pagar cerca de R$1.200 em oito vezes para quitar uma dívida de R$600.