Título: Alguém se move
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 28/07/2005, O Globo, p. 2

Quando a política fracassa, vamos à guerra. A crise tirou de cena o exercício da política. O incêndio não tem bombeiros, o presidente vai às ruas mas o governo se tranca e os partidos já não têm líderes. Sumiram. Chamuscados, todos fogem do sol. Vendo o fosso alargar-se, lá do vértice mais recuado da Praça dos Três Poderes, o presidente do STF, Nelson Jobim, vestiu sobre a toga o velho uniforme de político.

Foram dele os únicos movimentos para tirar da toca os amedrontados e da frente das câmeras os exibicionistas. Em conversas com petistas, tucanos, pefelistas, peemedebistas e tribos menores, vem advertindo sobre o cenário de um pós-impeachment com base no pressuposto da responsabilidade do presidente Lula pelas lambanças da cúpula petista, tendo ele ainda a confiança dos que elegeram. Por dez anos, tem dito Jobim, teremos acertos de contas nas ruas e entre os partidos. O resultado, mais alguns anos perdidos. Já se dizia ontem, até mesmo entre os que o ouviram, que Jobim aproveita o vácuo para pavimentar seu retorno à política e disputar a Presidência, seja em 2006 ou em 2010. Assim está o ambiente: todas as palavras e todos os gestos já foram interpretados antes de tomarem forma, seja como expressão de interesses ou como manobras para tirar o foco do ¿cão danado¿ ¿ a crise produzida pela queda do PT no desvão achava reservada só aos outros.

Jobim está cumprindo a tarefa a que os políticos não se habilitaram na crise, seja por incompetência, seja pela crença no pior ou por covardia, como fazem os que se penduram ao mastro quando o barco aderna, à espera de uma canoa salvadora.

Lula e o governo começam a sair da catalepsia. Talvez porque viram a oposição recuar da pregação de impeachment, à medida que a água suja começou a lhe tocar também os pés. Falando aos gaúchos, Lula declarou-se indignado com as denúncias de corrupção, embora dando ênfase maior à crucifixão de inocentes. A seu redor, trabalha-se agora para que ele, diretamente ou através de alguém com autoridade para falar em seu nome, diga solenemente o que ainda não disse: ignorava e condena as tramóias da cúpula antiga de seu partido, que não se restringiram ao caixa dois para financiar campanhas, como chegou a dizer em Paris.

Quanto à CPI, como diz o líder Rodrigo Maia, ¿agora acabou a espuma, é hora de trabalhar¿. A esperada lista de sacadores que estava em poder do STF não trouxe novidades importantes. Para quem acompanha a novela pela TV, ainda haverá cenas emocionantes, como a o depoimento de Dirceu, que antes falará ao Conselho de Ética, no dia 2. Mas o material essencial para o exame, os cruzamentos e o estudo detalhado do valerioduto, já está disponível. E está revelando um imenso volume de recursos privados, certamente para serem ¿esfriados¿, destinados ao financiamento do PT e dos aliados mas também à lavagem por outras vias.