Título: `SE FOR EXIGIR REGISTRO, FALTA ALUNO NA ESCOLA¿
Autor: O País
Fonte: O Globo, 31/05/2005, O País, p. 11

Colégios aceitam cartão de vacinação para a matrícula das crianças

A falta de registro civil das crianças levou as escolas do distrito de Santa Tereza, no município pernambucano de Água Preta, a adotarem uma medida que se repete em outras cidades do Nordeste: usar o cartão de vacinação como documento de matrícula na rede oficial. Foi o que aconteceu com Leandro Vicente da Silva, de 9 anos. Sua mãe, Maria de Lourdes da Conceição, de 28, nunca registrou o menino.

¿ Eu tinha registro, mas a enchente levou. Não consigo registrar o menino. O pai dele morreu, e eu também não tenho documento ¿ diz a mãe.

Para a professora Edilene Maria da Silva, do colégio municipal Terezinha Pessoa de Queiroz, a situação de Leandro é comum.

¿ Se a gente for exigir registro de todo mundo, falta aluno. A escola exige certidão de nascimento, mas como pouca gente tem, aceita cartão de vacinação para fazer as matrículas ¿ disse ela.

Na casa da lavradora Maria José da Silva, o filho e as duas filhas já adultos ¿ Evandson, Edivânia e Márcia ¿ estudaram usando como documento o cartão de vacinação. O mesmo acontece hoje com seus três netos, Josimário, de 10 anos, Jodelson, de 7, e Julião, de 1 ano.

Pais devem procurar Conselho Tutelar

Em Caucaia, no Ceará, na Rua das Flores, quando chove, o caminho de terra vira lama. Por lá passam diariamente seis dos sete filhos de Valdeniza e Pedro Nunes rumo à escola. Nágila, de 13 anos, Wesley, de 11, Wasley, de 8, Wisley, de 7, Aline, de 6, e Nara, de 5, são alunos da escola de educação infantil e ensino fundamental Antônio Miranda de Melo, em Caucaia, na Região Metropolitana de Fortaleza.

Os três últimos ¿ Wisley, Aline e Nara ¿ foram aceitos em condição especial. A escola aceitou como documento o cartão de vacinação, em vez do registro ¿ que eles não têm.

Valdeniza explica que não pôde registrar os quatro últimos filhos porque perdeu o documento de identidade. Não tirou segunda via porque perdeu a certidão de nascimento.

Na escola, Wisley, Aline e Nara não são os únicos sem documento. Segundo a diretora Ana Maria Saboya, cerca de 50 alunos, do total de 1.587, foram matriculados com o cartão de vacinação.

¿ Aceito porque não vou deixar criança fora da escola ¿ disse.

Ela pede aos pais que procurem o Conselho Tutelar, que os orienta a procurar o cartório.

Segundo Maria Rubenísia de Almeida, do Conselho Tutelar, as escolas não podem rejeitar alunos por falta de registro. Se isso acontecer, os pais podem denunciar a instituição no Conselho.

¿ Se eu não matriculo, as mães vão ao conselho me denunciar ¿ confirmou a diretora Ana Maria Feijó Saboya.

Mesmo freqüentando aulas, a falta de registro pode causas problemas para as crianças. Segundo a diretora, sem o documento não é possível fornecer a transferência do aluno, que serve de comprovante para outra escola de que a criança estava regularmente matriculada. A maioria dos alunos sem registro é de família muito pobre.

A comissão estadual de erradicação do sub-registro no Ceará tem estimulado os cartórios a abrirem postos de atendimento nas maternidades. Em Caucaia, isso já ocorre no hospital municipal e em outro, filantrópico. Mas de nada adianta se os pais não tiverem seus documentos de identidade. Segundo a coordenadora da Comissão estadual de Erradicação do Sub-Registro, Elis Regina Coelho, está previsto para o segundo semestre o relançamento de uma campanha em que, com a parceria das prefeituras, agentes de saúde vão fazer o mapeamento dos bolsões de sub-registro no estado.