Título: O ABANDONO DAS ESCOLAS NO CAMPO
Autor: Demétrio Weber
Fonte: O Globo, 30/05/2005, O País, p. 8

Só prédios depredados restam de projeto de ensino técnico

BRASÍLIA. Prédios abandonados, obras inacabadas e todo tipo de desvio de finalidade ¿ até mesmo uma funerária funcionando no lugar de salas de aula. Esse foi o destino de pelo menos 64 escolas de ensino fundamental financiadas pelo Ministério da Educação (MEC) num dos mais ambiciosos programas nacionais de ensino no campo.

Lançado em 1986, no governo Sarney, o Programa de Expansão e Melhoria do Ensino Técnico (Protec) tinha como objetivo construir 150 escolas no interior do país. Mas um levantamento concluído pelo MEC no ano passado mostrou que apenas 77 (51%) delas funcionavam conforme o previsto.

Em Alcântara (MA), restam apenas paredes depredadas e o ¿esqueleto¿ de salas de aula, refeitório e cozinha num prédio. De acordo com o relatório de inspeção do MEC, a escola chegou a ser inaugurada, mas nunca funcionou. O abandono foi agravado por furtos de portas, janelas, pias, vasos sanitários e até do telhado.

Dono do mais baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do país, o Maranhão tem outro caso explícito de desperdício ¿ ou desvio ¿ do dinheiro público. Em Presidente Sarney (MA), a equipe do MEC não encontrou sequer escombros, apesar de o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) ter liberado recursos para a obra de outra escola.

¿ É um pecado haver escolas paradas ¿ diz o secretário de Educação Profissional e Tecnológica do MEC, Antônio Ibañez.

O ministério não sabe o tamanho do prejuízo. O Protec foi lançado em 1986, mas em 1996 ainda havia escolas sendo inauguradas. Os repasses, portanto, foram feitos ao longo de uma década e os processos estão arquivados numa garagem, segundo a assessoria de imprensa do FNDE. Agora o MEC busca parcerias com estados, municípios e entidades como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) para aproveitar a infra-estrutura já construída.

Em 2003, equipes dos Centros Federais de Educação Tecnológica foram mobilizadas em 21 estados para levantar a situação do Protec. O balanço mostrou que pelo menos 18 estabelecimentos permanecem inacabados. Outros 15 ficaram prontos, mas não estavam funcionando quando inspecionados, enquanto 31 eram usados para outros fins.

Ao lançar o Protec, o governo federal tinha como público-alvo os filhos de pequenos produtores rurais. O problema é que o governo só bancava a construção dos prédios e a compra de equipamentos e móveis. O resto era por conta das prefeituras. E muitas não tiveram fôlego para pagar salários e demais despesas de custeio.

Em Alexânia (GO), o convênio do MEC com a prefeitura resultou em doze prédios com salas de aula, refeitório, alojamentos, garagem e galpões, totalizando cerca de 2 mil metros quadrados. Tamanha infra-estrutura, no entanto, nunca foi utilizada.

A escola ficou pronta em 1996. Nesse período, foi alvo de saques e sofreu a ação do tempo. Chuveiros, vasos sanitários e pias foram levados.

¿ É uma irresponsabilidade, um desperdício do dinheiro público ¿ diz o presidente da Câmara de Vereadores de Alexânia, Adair Rabelo Neto (PTB).

No dia 20, 13 famílias de sem-teto passaram a morar nos alojamentos da escola agrícola, onde não há água encanada nem luz.