Título: BRIGA NO PMDB TEVE ATÉ GRAMPO
Autor: Adriana Vasconcelos e Gerson Camarotti
Fonte: O Globo, 02/04/2005, O País, p. 3

Espionagem e disputa de poder por trás da demissão de Lando da Previdência e de Bezerra do INSS

Troca de acusações e uma guerra de espionagem marcaram os últimos meses do ex-ministro da Previdência Amir Lando e do ex-presidente do INSS Carlos Bezerra, ambos do PMDB, no governo. A disputa nos bastidores da Previdência foi comunicada à cúpula do partido e assustou o Planalto, que decidiu demitir os dois ao mesmo tempo. Os principais dirigentes do partido foram informados que pelo menos 132 fitas teriam sido gravadas com conversas telefônicas de Bezerra e assessores próximos.

A investigação foi feita pelo serviço de inteligência para o combate a fraudes do Ministério da Previdência, com autorização do então ministro Amir Lando. Também foram mobilizados a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência (GSI). Poucas pessoas tiveram acesso ao conteúdo das gravações. Mas o episódio causou uma crise no PMDB.

Renan: ¿A situação era insustentável¿

Bezerra procurou a cúpula do partido para reclamar da perseguição e denunciar que estava sendo alvo de espionagem feita com autorização de um outro integrante do partido. Procurado pelo GLOBO, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), tentou negar a crise no partido num primeiro momento, mas depois confirmou a guerra de espionagem na Previdência. Garantiu, contudo, que nunca ouviu as gravações.

¿ A situação estava insustentável. A investigação foi feita pelo serviço secreto do Ministério da Previdência. Mas nunca ouvi o conteúdo dessas gravações e nem tive acesso a nada ¿ ressaltou Renan.

O líder do PMDB no Senado, Ney Suassuna (PB), também acompanhou a guerra de bastidores no partido e se mostrou assustado com os relatos de companheiros de partido. Há três anos, ainda no governo Fernando Henrique, a Polícia Federal chegou a grampear, com autorização judicial, os telefones de John Kirchhoffer Cabral Filho, que era o auditor regional do INSS no Rio e afilhado político de Suassuna. Nas investigações, ele foi citado como um dos participantes da rede de fraudes no INSS fluminense.

¿ Todos nós estamos sendo gravados. Não escapa ninguém. Isso é um absurdo! ¿ disse Suassuna.

Lando nega ter dado qualquer ordem para grampearem Bezerra. Mas confirma que a Abin fez ampla investigação para tentar mapear fraudes contra a Previdência. Com a ajuda de técnicos do Ministério da Previdência, chegou a ser produzido relatório identificando os 20 principais tipos de fraudes contra o INSS, que apontava inclusive os locais de maior incidência de cada uma delas.

Lando fez denúncias contra Bezerra

Lando e Bezerra travam uma disputa política desde que entraram no governo. Sem poder para indicar o presidente do INSS, Lando teve que engolir a nomeação de Bezerra, seu ex-colega de Senado. Ele se recusou a defender o presidente do INSS, que assumiu o cargo tendo que se explicar sobre várias denúncias contra ele.

Em seguida, o próprio Lando passou a fazer denúncias, nos bastidores do governo, contra as indicações políticas de Bezerra no INSS. Assim que assumiu o cargo, o ex-presidente do INSS decidiu exonerar o procurador Henrique Gabriel, escolhido por Lando, para nomear Jeferson Carus, que era próximo do antecessor Ricardo Berzoini, e que já havia ocupado cargo de confiança no ministério. Foi a gota d¿água na relação de Lando e Bezerra. Desde então, eles entraram em confronto direto.

Na tentativa de contornar a guerra dentro do PMDB e mesmo abrir espaço para a nomeação do senador Romero Jucá (PMDB-RR) na Previdência, a cúpula do partido ofereceu a Lando uma vaga no Tribunal de Contas da União (TCU). Para isso, o senador Luiz Otávio (PMDB-PA) abriria mão de sua indicação para o mesmo cargo, já aprovada pelo Senado, mas ainda não votada pela Câmara. Irritado com as gestões que culminaram com sua demissão da Previdência, Lando recusou a oferta insinuando que alguém teria interesse em vê-lo calado. O ex-ministro confirmou o convite recebido.

¿ Não aceitei. Não tenho vocação para julgador. Como político e advogado, sou um homem das partes. Tenho lado e convicções e um juiz tem de ser abstrato ¿ disse.

Procurado pelo GLOBO, o ex-presidente do INSS respondeu, em nota, que desconhece ¿a existência de qualquer pedido ou autorização para que efetuassem gravações auditivas de linhas telefônicas de meu uso, até o presente momento¿. Na nota, ele diz não acreditar que ¿tais desatinos partiriam de pessoas de minha convivência pessoal, política e partidária¿. E conclui: ¿Convivi e continuo sempre ao lado daqueles que sempre lutaram pelo estado de direito e contra todas as exceções comuns dos períodos autoritários, quando os mais elementares direitos são massacrados¿.