Título: SARNEY IGNORA ULYSSES EM HOMENAGEM
Autor: Lydia Medeiros
Fonte: O Globo, 16/03/2005, O País, p. 12

Ex-presidente foi o centro das atenções nas comemorações do aniversário da redemocratização

BRASÍLIA.Vinte anos depois de tomar posse na Presidência da República, por causa da internação de Tancredo Neves na véspera, o ex-presidente da República José Sarney foi o centro das comemorações que marcaram o aniversário da redemocratização do país. Foram escassas, porém, as citações a Ulysses Guimarães, um dos principais articuladores da eleição de Tancredo. Sarney, que vivia às turras com o então presidente da Câmara, falou dele apenas de modo informal, citando reuniões, mas deixou-o de fora de sua lista de homenagens e não fez referência ao papel de Ulysses na redemocratização.

Bornhausen, Marco Maciel e ACM discursaram no Senado

Na sessão solene realizada no Senado, discursaram os três senadores do PFL ¿Jorge Bornhausen, Marco Maciel e Antonio Carlos Magalhães ¿ ex-integrantes do PDS, que, como dissidentes, fundaram a Frente Liberal e aliaram-se ao PMDB para eleger Tancredo no Colégio Eleitoral. O governador de Minas, Aécio Neves (PSDB), neto de Tancredo, compôs a mesa da sessão solene.

O outro lado da aliança que permitiu a vitória de Tancredo, o PMDB de Ulysses Guimarães, foi representado pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (AL), e pelo senador Pedro Simon (RS), outro ministro de Sarney escolhido por Tancredo. Sarney fez um balanço dos cinco anos de Presidência (1985-1990) e, num gesto de saudosismo, lembrou o bordão com que começava seus discursos: ¿Brasileiros e brasileiras¿. Disse que o maior legado daqueles anos foi a criação de uma sociedade democrática, não apenas de instituições. Ressaltou o papel conciliador de Tancredo, que permitiu uma transição sem conflitos. E lembrou das condições em que assumiu o cargo:

¿ Assumi com todas as condições para não terminar o mandato: não tinha um grande partido, não compus o Ministério, não conhecia o programa de governo. Dizia a Tancredo que me preparara para ser um vice fraco de um presidente forte.

Sarney relatou que, para se legitimar, traçou uma estratégia: a abertura do país, o fim das eleições indiretas, a legalização dos partidos. Na área econômica, a busca de solução para a inflação, o Plano Cruzado, em 1986. Segundo ele, a opção por um plano de estabilização não ortodoxo foi refletida:

¿ Sei que coloco a cabeça na guilhotina, mas vamos ousar ¿ discursou Sarney, relatando conversa com os economistas que fizeram o plano.

Na festa dos 20 anos, o governo petista foi figurante. O presidente Lula foi representado pelo ministro Aldo Rebelo (Coordenação Política), do PCdoB. Em 1985, o PT ficou fora da eleição de Tancredo, por discordar da eleição indireta. O partido tinha cinco deputados e expulsou três que desobedeceram à orientação: Beth Mendes, Airton Soares e José Eudes. O líder petista, senador Delcídio Amaral (MS), homenageou Sarney:

¿ Sarney teve que substituir um mito e afastou o fantasma do retrocesso.

Assessores, amigos e políticos ligados a Tancredo foram a uma missa ontem na Catedral de Brasília. Em 14 de março de 1985, no Santuário Dom Bosco, Tancredo foi à missa e leu trechos do Evangelho.