Título: `Já esgotei minha dose de erros¿
Autor: Liane Thedim e Aguinaldo Novo
Fonte: O Globo, 13/03/2005, Economia, p. 34

De Nova York, onde trabalha como consultora, a ministra da Economia do governo Collor, Zélia Cardoso de Mello, destacou, por e-mail, as falhas e qualidades do plano que ajudou elaborar. Para ela, o tempo mostrará que o plano foi mais do que o confisco da poupança.

Hoje, 15 anos depois do Plano Collor, o que a senhora aponta como as principais falhas e qualidades do plano? A senhora faria alguma mudança?

ZÉLIA CARDOSO DE MELLO: Não acho que existam dúvidas hoje sobre as qualidades do Plano, no que se refere à radical mudança estrutural da economia, liberalização comercial, privatização, fim da reserva de mercado da informática, lei das patentes, regras para o capital estrangeiro. A principal falha foi conjuntural e neste ponto é que faria mudanças: na renegociação da dívida externa e na administração da reforma monetária logo após o anúncio do plano. Refiro-me às torneiras de liquidez abertas e outros, como transferência de titularidade.

E por que o Plano não deu certo?

ZÉLIA: Mas deu certo. Do ponto de vista estrutural, o objetivo era mudar o modelo econômico, e isso foi feito. Do ponto de vista conjuntural, um dos objetivos era evitar a hiperinflação, o que também foi feito. Infelizmente, as pessoas esquecem que a inflação era superior a 80% ao mês.

O Plano ficou conhecido como o que confiscou a poupança. Esse bloqueio era indispensável?

ZÉLIA: Acredito que a avaliação dos historiadores do futuro será diferente. Mas isto só o tempo dirá. A reforma monetária era indispensável. Situações dramáticas requerem medidas dramáticas. A caderneta de poupança não era inicialmente o alvo, mas pouco antes do início do governo, os rumores se intensificaram e começamos a observar uma migração para as cadernetas (os ¿novos poupadores¿) e isto nos obrigou a repensar a medida.

No livro ¿Zélia,uma paixão¿, a senhora conta que o limite para saques (50 mil cruzados novos) foi sorteado...

ZÉLIA: Infelizmente, a maneira como o autor (Fernando Sabino) relatou deu margem a esta interpretação, alimentada pelos detratores do plano e da minha pessoa. A escolha foi feita baseada em detalhados estudos sobre dados do Banco Central.

Qual sua opinião sobre o Plano Real?

ZÉLIA: O Plano Real foi favorecido por todos os planos de ajuste da economia e, particularmente, pelo Plano Collor. O Real foi inteiramente bem-sucedido em seu único objetivo: debelar a inflação, sem dúvida uma conquista histórica.

A senhora voltaria à vida pública?

ZÉLIA: Parafraseando um grande amigo meu, já esgotei minha dose de erros...