Título: 15 ANOS DO CONFISCO: QUEM TENTOU SACAR ANTES DA POSSE DE COLLOR FOI SURPREENDIDO COM O FERIADO BANCÁRIO
Autor: Liane Thedim e Aguinaldo Novo
Fonte: O Globo, 13/03/2005, Economia, p. 34

Bloqueio deixou traumas que não se apagam

Da noite para o dia, poupadores tiveram que mudar seus planos e adiar projetos por falta de dinheiro

SÃO PAULO e RIO. De uma hora para outra, as economias de uma vida inteira, inacessíveis. Para muita gente, foi o que significou o confisco do saldo das cadernetas. Nas ruas, as histórias se repetiam: alguém que vendeu seu imóvel ou carro dias antes do bloqueio para, com o dinheiro, comprar outro e ficou sem os dois, viagens canceladas, sonhos interrompidos.

A paulista Patrícia Pinesi, 30 anos, está entre os que sofreram com o plano. Ela contava com o dinheiro depositado mês a mês pelos seus pais, desde seu nascimento, para pagar sua faculdade. Por conta da poupança, prestou e passou no vestibular de Direito de uma universidade particular, cuja mensalidade, em valores de hoje, equivalia a R$520.

¿ Minha poupança daria para pagar pelo menos dois anos ¿ lembra.

A rotina de toda a família foi alterada. Como a irmã mais velha, Cristiane, já fazia faculdade particular e o orçamento da casa não passava do equivalente a R$1,5 mil, o pai, aposentado, foi trabalhar como representante comercial. A mãe passou a fazer e vender artesanato.

Já o microempresário David Marques Netto, 65 anos, teve que se desfazer de vários bens para sobreviver ao confisco. Ele conta que, com medo do que poderia acontecer com a posse de Collor, pediu ao banco o saque do saldo de sua poupança três dias antes do anúncio do bloqueio das contas. David calcula que seria o equivalente hoje a R$80 mil. O banco pediu prazo até o dia seguinte para tornar o dinheiro disponível. No mesmo dia, à noite, foi decretado feriado bancário por três dias.

¿ Passei por um período horroroso. Não vivi, apenas sobrevivi entre 1990 e 1994. Foi uma covardia com o povo ¿ diz.