Título: Concessão de ferrovias terá garantia do governo
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Fonte: O Estado de São Paulo, 10/03/2013, Economia, p. B3

Contratos têm duração de 35 anos; mercado quer evitar o risco de não receber de estatal

O governo prepara novos mecanismos para afastar dos investidores o temor de um eventual "calote" da estatal Valec nas concessões de ferrovias. Os Ministérios dos Transportes e da Fazenda trabalham na construção de uma solução, que deve ser a escolha de um ativo da União a ser dado como garantia dos pagamentos futuros.

O modelo proposto para as concessões ferroviárias prevê que as empresas privadas construirão e farão a manutenção das novas linhas férreas, mas a Valec comprará, toda a capacidade de carga. Dessa forma, mesmo na hipótese de a ferrovia ser pouco utilizada, o concessionário faturará como se ela estivesse operando com lotação de 100%.

Ainda assim, o mercado está desconfiado. Os empresários querem garantias de que a estatal terá recursos para pagar a eles ao longo dos 35 anos da concessão. "Existe o risco Valec", disse o presidente da Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários (ANTF), Rodrigo Vilaça. Ele questiona como será possível confiar na capacidade administrativa da estatal. Ela é responsável pela construção da Ferrovia Norte-Sul, que é alvo de processos no Tribunal de Contas da União (TCU) por superfa-turamento e erros de projeto.

Há um mês, o Estado informou sobre um estudo elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) que aponta para a mesma direção. O trabalho diz que, num cenário de crise fiscal, que não está colocado hoje mas pode surgir no futuro, a Valec poderia sofrer fortes restrições orçamentárias ou, até mesmo, ser privatizada.

""Vamos mitigar totalmente esse risco", informou o presidente da Empresa de Planejamento e Logística (EPL), Bernardo Figueiredo, que admite ter recebido ponderações de empresas sobre o problema, Mas a insegurança não seria em relação à Valec, e sim em relação aos recebíveis, ou seja, como eles receberão os pagamentos durante o contrato.

Ele avalia que o governo já avançou bastante nas garantias e medidas adicionais seriam até desnecessárias. Porém, como o temor persiste, o governo decidiu dar segurança adicional.

O governo já anunciou que vai pagar antecipadamente 15% das receitas do concessionário. Em vez de recebê-las ao longo dos 35 anos, quem vencer o leilão terá acesso a esses recursos entre o segundo e o quinto ano da assinatura do contrato. Isso já diminui bem o risco de um eventual calote, avalia Figueiredo.

Além disso, o governo permite que os recebíveis, ou seja, os pagamentos que a concessionária terá a receber da Valec, sejam dados como garantia dos empréstimos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Sociai (BNDES). Com esse desenho, se a Valec não pagar ao concessionário, o calote será transferido ao banco oficial.

O instrumento adicional em estudo pelo governo é a definição de um ativo que garantiria os pagamentos da Valec. Figueiredo observa que existe um fundo garantidor das Parcerias Púbiico-Privadas (PPP), É justamente um dinheiro que serve para honrar pagamentos ao setor privado que o governo, por alguma razão, deixe de fazer.

Contratos. Além do "risco Valec", o presidente da ANTF aponta também para a insegurança jurídica das concessões ferroviárias. "Gomo confiar num contrato de 35 anos, se eu estou na metade do prazo da minha concessão e eles já mudaram as regras?", questiona Rodrigo Vilaça. A entidade reúne os atuais concessionários de ferrovias.

A principal queixa da ANTF é a adoção do modelo aberto de ferrovias, tecnicamente chamado de "open access".