Título: Tatão, o faz-tudo, trabalhou 40 anos
Autor: Thomé, Clarissa
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/02/2012, Vida, p. A12

No hospital-colônia, ele casou e teve 8 filhos

Sebastião Rosa Ricardo, de 84 anos, conhecido como Tatão, é o mais antigo remanescente do hospital-colônia que havia em Itaboraí, na região metropolitana - hoje, um hospital-geral - e trabalhou por mais de 40 anos ali. Foram muitas funções: "curativeiro", encarregado de transportar caixões da fábrica que havia na colônia até a enfermaria, bilheteiro do cinema do hospital, funcionário da caixa beneficente, jardineiro, carregador de roupa suja para a lavanderia. "Com 14 anos, eu levava na cabeça trouxas de lençol defecado." Tatão chegou ali aos 11, numa época em que lei federal determinava o isolamento compulsório das pessoas com hanseníase.

Foi Rita, uma vizinha de Campos dos Goytacazes, quem o denunciou. "Um dia, chegou um rapaz de nome Maneta. Vinha numa carrocinha como a de pegar cachorro e me tirou da minha mãe." Foi internado a 229 quilômetros de casa. "A cada três ou seis meses, eles davam um dinheirinho para esses serviços que a gente fazia. Eu juntava para visitar a família", lembra.

Na colônia, conheceu a mulher, Zélia Klein Ricardo, de 70 anos, filha de paciente. Tiveram oito filhos. Os mais velhos foram entregues aos cuidados dos tios, até Tatão poder alugar uma casinha ali perto. Zélia morava com as crianças, ele continuava internado. "Às vezes deixava de comer, para levar algum alimento para casa. Eu saía escondido. As crianças vinham me visitar escondidas".

Tatão conta que o preconceito era grande - o comércio local se recusava a empregar seus filhos, por exemplo. "Na escola, um dos meus filhos pediu para ir ao banheiro e a professora disse: 'Não pode, porque você é filho de leproso'. Ele sujou as calças."

Com o dinheiro da indenização, seu Tatão quer reformar a casa em que vive. / C.T.