Título: Alta do etanol acaba na semana que vem
Autor: Pereira, Renée
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/04/2011, Economia, p. B9

O Estado de S.Paulo

Marcos Jank, Presidente da União da Indústria da cana-de-açúcar

A escalada do preço do etanol nos últimos meses provocou reações no governo e na população, que deixou de abastecer com o combustível renovável. Mas, segundo o presidente da União da Indústria da Cana-de-açúcar (Unica), Marcos Jank, o problema vai acabar na semana que vem. "Já temos 90 usinas moenda cana."

Em entrevista ao Estado, o executivo criticou a tentativa do governo de taxar o açúcar e disse que não vê problemas em ser regulado pela Agência Nacional de Petróleo e Biocombustíveis (ANP). "O que não pode é haver medidas que afugentem o investidor."

Como o sr. avalia as medidas cogitadas para o setor?

A insensatez tomou conta. Não entendo como se pode falar em incentivar e crescer e, ao mesmo tempo, pensar em intervenção. Investidor foge disso. Já temos um preço de gasolina artificialmente congelado desde 2005 e estamos concorrendo com esse monopólio na bomba (de combustível). Agora vão taxar o açúcar. Quem vai querer pôr dinheiro nessa indústria?

A crise atual, de falta de etanol e preço alto, não prejudica a imagem do setor?

Lá atrás o consumidor era refém do etanol. Hoje, ele não tem de usar o combustível. Se o preço sobe, ele pode mudar. Tem coisa melhor do que ter dois combustíveis e poder escolher? É o único lugar do mundo que tem isso. Durante anos, o etanol foi mais barato. Aí, durante um mês o produto fica mais caro porque houve uma quebra de safra e porque a indústria parou de crescer. Vão dizer que o produto não serve?

Qual o efeito de uma taxação do açúcar para o setor?

Hoje, temos três produtos. Um é o açúcar, que somos líder no mundo, com 20% da produção mundial e 50% do mercado. É um produto estratégico na alimentação mundial. Taxar o açúcar tem efeito mundial. Acabaria com nossa reputação. Seria taxar alimento para fazer combustível, como eles criticam. Além disso, é o quinto produto da pauta brasileira. É um produto livre, que se financia e hoje funciona sem intervenção do governo. É bolsa. Do outro lado, vendemos eletricidade, altamente controlada pelo Estado. No meio tem o etanol, onde o anidro é regulado e o hidratado, livre. Quem faz a regulação é o consumidor que tem carro flex. Agora parece que a presidente (Dilma Rousseff) e alguns reguladores querem alterar o mecanismo. Caminhar para algo onde tudo é regulado vai afastar os investidores. Mas alguma regulação é possível, como a criação de linhas de financiamento e programas de bioeletricidade para construir usinas essencialmente energéticas.

O que é possível fazer para evitar a flutuação de preços?

Um dos fatores que causaram a flutuação de preços foi a instabilidade climática. Tivemos uma quebra de safra que tirou 5 bilhões de litros de etanol do mercado. Isso foi superior à migração de etanol para açúcar. De fato, no último ano a remuneração para usar a cana para açúcar foi mais alta, mas de 2000 a 2008 foi maior para fazer álcool. Em 2000, 50% era álcool e 50%, açúcar; de 2000 a 2008, 60% álcool e 40% açúcar; de 2008 para cá, 55% álcool e 45% açúcar. Agora temos de voltar a crescer a taxas maiores e plantar muita cana. Uma coisa que assustou foi que o consumidor demorou muito para trocar o etanol pela gasolina. Isso fez com que houvesse um certo desequilíbrio de preço. Mas tudo isso vai acabar na semana que vem. Mais uma ou duas semanas e tudo volta ao normal. Já temos 90 usinas moendo.

Mas teremos de importar álcool anidro?

É uma importação pequena, dos Estados Unidos. É algo em torno de 200 milhões de litros, 0,8% da produção anual. Exportamos 1,5 bilhão de litros.

Mas nosso principal objetivo era exportar para os EUA.

Não vejo nenhum problema de haver importação. Numa commodity a agrícola, faz todo sentido. Como podemos imaginar que vamos suprir totalmente o mercado num produto que está ligado ao clima. Temos de ter mercados abertos.

Existe alguma sinalização de retomada de investimentos?

Neste momento, temos apenas três usinas entrando em operação. Já tivemos 30. Até 2020, há um déficit de 400 milhões de toneladas de cana para atender 66% da frota flex. Isso dá 133 nova usinas, 15 por ano. Agora qual o desenho para elas aparecerem eu ainda não sei.

Ser regulado pela ANP preocupa o setor?

Isso não é problema pra gente. Se isso implica ter maior controle sobre o que vem pela frente, não tem problema. O importante é saber quais as medidas que vão de fato incentivar o crescimento da indústria.