Título: O apagão da mão-de-obra
Autor: Oliveira, Ribamar
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/06/2007, Economia, p. B2

Com milhões de desempregados, o Brasil vive hoje uma triste realidade: sobram vagas que não conseguem ser preenchidas por falta de trabalhadores qualificados para as funções. No ano passado, o Sistema Nacional de Emprego (Sine) e os demais centros de atendimento aos trabalhadores captaram um milhão e 869 mil vagas oferecidas pelas empresas, mas só 877 mil delas conseguiram ser preenchidas, informa o presidente do Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat), Ezequiel Souza do Nascimento, em conversa com este colunista.

'O Brasil está à beira de um apagão muito mais grave do que o do setor elétrico', adverte o presidente do Codefat. 'Estou falando do apagão de mão-de-obra', explicou. 'O Brasil não tem trabalhadores qualificados para atender a demanda das empresas e isso poderá ficar pior se o crescimento do País se acelerar'. A situação poderá se agravar se o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) realmente deslanchar.

O PAC prevê, por exemplo, a construção de 10 navios em Pernambuco, mas não existe pessoal qualificado na região para trabalhar nos estaleiros. 'Teremos que qualificar os trabalhadores de lá, pois não faz sentido importar mão-de- obra de outros Estados', disse. Ele informou que a importação de trabalhadores especializados já está ocorrendo na construção do primeiro alto forno no pólo siderúrgico do Rio de Janeiro. Também no Rio será implantado um pólo petroquímico e a Petrobrás iniciou o treinamento de 30 mil pessoas, pois não há mão-de-obra especializada.

O principal projeto de investimento previsto para Brasília é a construção da chamada 'cidade digital', que reunirá empresas de alta tecnologia. Mas não existem profissionais qualificados para o empreendimento. 'Corre-se o risco de que os trabalhadores que moram na capital da República fiquem apenas com o trabalho de limpeza e segurança da área', observa o presidente do Codefat. Está prevista a construção de um Pólo de Papel e Celulose em Minas Gerais, na região próxima a Santa Luzia, que deverá absorver cerca de 3 mil trabalhadores. Ezequiel do Nascimento nota que não existe escola técnica nessa área para a formação dos trabalhadores.

A demanda por recursos para a qualificação de pessoal chega de todas as partes. Recentemente, conta Ezequiel, a ministra do Turismo, Marta Suplicy, apresentou ao Codefat um pedido para o treinamento de pessoas em infra-estrutura de turismo - pequenos empreendedores, camareiras, garçons, etc - em 63 cidades do País, escolhidas entre as mais promissoras na área turística. Um representante da prefeitura de Salvador, que é a campeã brasileira do desemprego, esteve com o presidente do Codefat solicitando recursos urgentes para a formação de pessoal, pois foram oferecidas 45 mil vagas na capital da Bahia no ano passado e somente 17 mil foram preenchidas.

Mesmo com toda essa demanda por qualificação profissional, o governo pouco fez nessa área no primeiro mandato do presidente Lula. Na verdade, os gastos do FAT com a qualificação de trabalhadores caíram no ano passado, em termos reais, na comparação com 2005. O retrato das despesas do FAT mostra um governo preocupado, principalmente, com a transferência de renda para os trabalhadores e menos com sua formação. Preocupado mais em dar o peixe, do que em ensinar a pescar.

As despesas com o abono salarial, que são sustentadas com recursos do FAT, subiram 40,7% em 2006, em termos reais, em relação ao ano anterior. Os gastos com o seguro desemprego aumentaram 25,1%, em termos reais, no mesmo período. Enquanto isso, as despesas com a qualificação da mão-de-obra caíram de R$ 87,8 milhões em 2005 para R$ 83,1 milhões no ano passado. Os valores estão a preços de dezembro de 2006. Os dados constam da avaliação financeira do FAT, encaminhada ao Congresso junto com o projeto de lei de diretrizes orçamentárias para 2008.

O atual ministro do Trabalho e Emprego, Carlos Lupi, quer mudar esse quadro, segundo informa Ezequiel do Nascimento. O ministro pediu ao Codefat um estudo para ampliar substancialmente os recursos destinados à qualificação de mão-de-obra. A primeira proposta que será encaminhada a Lupi, informa o presidente do Codefat, prevê a aplicação de R$ 900 milhões em 2008, nessa área. Se aprovada, significará um aumento de quase nove vezes no montante a ser investido este ano, que é R$ 106 milhões.

O Ministério do Trabalho e Emprego não está, atualmente, estruturado para enfrentar esse desafio, adverte o presidente do Codefat. Antes de mais nada, diz Ezequiel do Nascimento, é preciso elaborar uma política de qualificação e estabelecer controle e fiscalização dos convênios que serão realizados. Tudo isso para que não se repitam os problemas registrados em passado recente nessa área.