Título: 95 milhões de brasileiros não têm coleta adequada de esgoto
Autor: Pereira, Renée
Fonte: O Estado de São Paulo, 22/04/2007, Economia, p. B6

O Brasil ainda registra números alarmantes de excluídos dos serviços públicos, considerados essenciais para o bem-estar da população. Apesar dos programas de universalização criados pelo governo, milhares de brasileiros ainda não sabem o que é ter luz e água - seja tratada ou não - dentro de casa. Telefone e coleta de esgoto são serviços que nem passam pela cabeça dessas famílias, que, muitas vezes, não têm nem banheiro em suas residências.

De acordo com um levantamento feito pela Associação Brasileira da Infra-Estrutura e Indústrias de Base (Abdib), 95 milhões de pessoas não têm coleta de esgoto de forma adequada no País, 35 milhões vivem sem abastecimento de água, 6 milhões não têm luz elétrica e 53 milhões estão excluídos dos serviços de telefonia. O trabalho foi feito com base em dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNDA) referente ao ano de 2005 e lançada no ano passado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

¿A infra-estrutura é um requisito fundamental para haver qualidade de vida e dar condições mínimas para que as pessoas ultrapassem a linha de pobreza com as próprias mãos¿, destacou o presidente da Abdib, Paulo Godoy. Segundo ele, a escassez sempre atinge as regiões menos favorecidas e, portanto, as pessoas mais pobres.

De acordo com o levantamento, entre 60% e 85% dos brasileiros sem acesso adequado a serviços públicos são pobres. Entre os brasileiros com renda mensal domiciliar de até um salário mínimo, 74,7% não têm coleta adequada de esgoto; 36,5% não têm acesso à água tratada; 10,7% vivem sem energia elétrica; e 69,3% não têm telefone fixo ou celular.

Já entre a população de classe média (entre 3 e 10 salários mínimos) apenas 1% não tem luz e 12% não têm telefone fixo ou móvel. Já na população mais rica, o serviço de energia está praticamente universalizado e apenas 1% não tem acesso a telefone fixo ou móvel. Na área de saneamento básico, a situação tem se mostrado difícil para todas as classes sociais.

¿Essa dura realidade do País somente irá mudar com a retomada de investimentos em áreas esquecidas, como saneamento¿, afirma Godoy. Segundo ele, a criação da Lei Nacional do Saneamento Básico foi um grande passo para o País. Agora é preciso colocá-la em prática, diz . ¿Para isso, Estados e Municípios terão de se adequar às regras estabelecidas na lei.¿

Na avaliação do superintendente-técnico da Associação das Empresas de Saneamento Básico Estaduais (Aesbe), Walder Surini, o que se vê hoje na área de saneamento básico é o resultado da falta de decisão política do Estado nos últimos 50 anos. ¿O atraso no setor só não é mais vexatório por causa do antigo Banco Nacional de Habitação (BNH), que tinha um sistema de financiamento para a área. Nesse período, tivemos um fluxo importante de recursos e foram criadas as empresas estaduais. A partir daí, saneamento nunca mais foi prioridade.¿

Segundo dados da Abdib, apesar de um aumento, os investimentos na área de infra-estrutura ainda estão muito aquém das necessidades do País. No ano passado, por exemplo, a área de energia recebeu 71% do exigido. E, mais uma vez, o setor de saneamento básico teve um desempenho discutível: recebeu apenas 37% do necessário. Para garantir universalizar os serviços de saneamento, são necessários investimentos de 0,63% do PIB por ano ao longo de 20 anos. Isso significaria algo em torno de R$ 10 bilhões por ano, ou R$ 200 bilhões no período.

No caso da energia elétrica, o governo mantém o Luz para Todos, iniciado em 2004. De acordo com o programa, as famílias sem acesso à energia estão majoritariamente nas localidades de menor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e nas famílias de baixa renda. Cerca de 90% destas famílias têm renda inferior a três salários mínimos e 80% estão no meio rural. ¿Sabemos que o acesso pleno aos serviços de infra-estrutura é condição fundamental para superar a pobreza¿, explica Godoy.