Título: Educação - segundo tempo
Autor: Di Franco, Carlos Alberto
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/03/2007, Espaço Aberto, p. A2

A mídia tem sido acusada por alguns segmentos partidários de estar dominada pela síndrome da hostilidade ao governo Lula. Para eles, a imprensa estaria sob o controle do ¿poder econômico¿. Queixam-se de que iniciativas governamentais bem-sucedidas têm, supostamente, recebido pouco destaque ou, quando muito, migram para o lusco-fusco das páginas interiores. Essa hipotética tendência, no entanto, acaba de ser derrubada pela força de uma boa notícia: o anúncio pelo presidente Lula do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). A iniciativa, inovadora e consistente, recebeu amplo destaque nos meios de comunicação social.

Passados os quatro anos do primeiro mandato, tempo em que o governo patinou numa agenda excessivamente ideológica e populista, o presidente Lula, finalmente, lançou as bases do Plano de Desenvolvimento da Educação. O projeto, perfilado com competência pelo ministro da Educação, Fernando Haddad, pretende estabelecer sistemas de definição de metas, de avaliação e de cobrança de resultados nas escolas de todo o País.

Da Provinha Brasil - uma avaliação que incluirá estudantes a partir dos 6 anos de idade para verificar se estão aprendendo e, afinal, alfabetizados - à ampliação do Bolsa-Família para incluir jovens de 15 a 17 anos, todas as ações passam pela idéia de aumentar o alcance e o resultado do sistema educacional, investindo dinheiro e recursos técnicos para tirar a educação do ¿pior dos mundos¿, conforme definiu o próprio presidente Lula ao apresentar o plano para uma platéia de educadores.

Hoje, os alunos são avaliados em exames nacionais a partir da quarta série do ensino fundamental, quando a maioria já fez 10 anos. O objetivo da Provinha Brasil é ter um diagnóstico mais precoce do processo de alfabetização para corrigir antes os equívocos. O objetivo é enfrentar o principal problema da educação brasileira: os resultados lamentáveis das últimas décadas, que criaram uma legião de crianças e jovens que estudam, mas não aprendem, e engordam as fileiras de adultos com baixíssima escolaridade.

O Ministério da Educação pretende identificar as cidades com pior qualidade de educação e propor a elas um plano de melhoria sob orientação técnica do ministério. Em quatro anos, a meta é investir nos piores municípios 0,4% do PIB, o que, nas contas do ministro Fernando Haddad, representaria R$ 8 bilhões em investimentos até 2010.

Em resumo, caro leitor, o programa, elogiado até por educadores da oposição, prevê o estabelecimento de metas para o ensino fundamental, de responsabilidade basicamente dos municípios; a ação federal não só no acompanhamento, mas na melhoria dos métodos de gestão; melhor remuneração e qualificação dos professores e retomada do conceito de Bolsa-Escola com a extensão do Bolsa-Família para jovens de 15 a 17 anos, onde há grave evasão escolar e existe abundante mão-de-obra à disposição do crime.

O plano ambicioso, mas realizável, é a melhor resposta à violência que atordoa a sociedade brasileira. A miragem do dinheiro fácil, principal ferramenta de aliciamento do crime organizado, prospera nos corações machucados pela falta de educação e pela agonia da esperança. A desestruturação da família, a exclusão social e a crise da educação, fenômenos perversos que costumam caminhar juntos, estão na raiz do problema da delinqüência. Se a crescente falange de adolescentes criminosos deixa claro algo, é o fato de que cada vez mais jovens são órfãos de um sistema educacional falido. Por isso, um programa que, com seriedade, pretende recolocar a educação na agenda nacional merece o apoio de todos os que têm uma parcela de responsabilidade na formação da opinião pública.

O presidente Lula, ademais, abandonou o discurso da grandiloqüência e adotou um tom admiravelmente realista e humilde. Em improviso a educadores de todo o País, Lula disse que tem ¿inquietações¿, mas nenhuma ¿solução¿ para melhorar a qualidade do ensino fundamental do País: ¿Eu vim aqui apenas para dizer a vocês das minhas inquietações. Não tenho solução. As soluções que eu tenho, possivelmente, algumas são válidas e outras, não. Mas o que eu sei, concretamente, é que estamos em dívida com a educação.¿

Lula mostrou-se perturbado com a situação da educação. Citou provas de avaliação aplicadas em alunos entre a quarta e a oitava séries. ¿O resultado não é animador¿, sublinhou. A educação, de fato, piorou nos últimos dez anos. ¿Junto com a universalização do ensino não houve um acompanhamento da melhoria da qualidade da educação. Então nós estamos no pior dos mundos.¿

Disse ser ¿o menos qualificado¿ para discutir o tema: ¿Esse é um problema em que nós vamos ter que nos debruçar, e eu quero que vocês se debrucem sobre isso porque talvez, de todos aqui, eu seja o menos qualificado para discutir a educação. Aqui, estou apenas representando uma demanda de que eu sinto necessidade, mas quem dará a resposta, certamente, serão vocês, e não eu.¿

As palavras do presidente da República, simples, despojadas e diretas, tocaram na fibra sensível da cidadania. É óbvio que um improviso não muda nada. É claro que não há dinheiro sobrando. O governo precisa escolher: ou continua despejando rios de recursos no ralo de uma Previdência falida e em gastos de impacto popular imediato, e estará arando no mar; ou investe onde deve - na educação, por exemplo. Um Plano de Desenvolvimento da Educação sólido, republicano e despido de viés ideológico pode virar o Brasil do avesso.

É por aí, presidente!