Título: Nas áreas irrigadas, falta orientação técnica
Autor: Angela Lacerda
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/05/2006, Nacional, p. A14

Para conseguir sobreviver, famílias arrendam terras aos empresários de grande porte, que vão bem

Não é só a paralisação dos projetos de irrigação que afeta os pequenos agricultores na região de Juazeiro, na Bahia. Mesmo em áreas em que a irrigação funciona, eles enfrentam dificuldades por falta de orientação técnica e por não conseguirem se organizar em cooperativas, dependendo de atravessadores na comercialização de seus produtos. Passados 25 anos, desde sua integração ao chamado Perímetro Irrigado Maniçoba, a quase totalidade das 242 famílias daquele projeto está endividada e sem crédito na praça. Para conseguir sobreviver, arrendam terras aos empresários de grande porte, que vão bem, garantindo à região o título de Califórnia brasileira, e reclamam do governo por outro motivo: a falta de continuidade nos projetos de irrigação.

"Na verdade eu sou mesmo é peão de empresário, que é quem compra os insumos, colhe, vende a produção e, se tiver consciência, divide alguma coisa comigo", diz Josival Nascimento Pereira, o Vavá, 48 anos - 20 deles como assentado no perímetro. Há quatro anos ele assinou um contrato de compra do lote, que só será efetivamente dele se conseguir pagar as prestações de R$ 1,2 mil/ano, até 2018.

O maior problema dos pequenos agricultores é o custo da agricultura irrigada. Na média, pagam R$ 800/ano pela infra-estrutura de irrigação, R$ 300 mensais pela água e outros R$ 70 para o distrito de irrigação. Eles também patinam em débitos bancários.

"Em 1995, conseguimos empréstimo para plantar manga, coco e goiaba, num projeto feito com ajuda de técnicos", conta Aderaldo Ribeiro, de 61 anos. Mas foi um fracasso. A goiaba pegou fungo; o coco, sem mercado, foi vendido a 5 centavos a unidade; e os agricultores passaram a ser vistos como caloteiros.

A situação não é diferente nos outros três perímetros irrigados da região: Curaçá, Mandacaru e Tourão. "A gente morre de trabalhar na roça e não vê futuro", diz a agricultora Luzinete Barbosa, enquanto conta os sacos de maracujá colhidos no dia. "Acho que hoje ainda é pior, porque antes a gente não devia."

Quando conseguem levar adiante alguma lavoura por conta própria, os pequenos produtores acabam deixando o grosso dos ganhos nas mãos dos atravessadores. Só agora as famílias decidiram criar uma associação, chamada Manga Brasil. "Queremos montar um sistema de trabalho para vender direto e ter lucro", diz Vavá, o coordenador da iniciativa.

Desiludido, ele prevê a falência de todos os perímetros irrigados do Vale do São Francisco se não houver uma ação firme e integrada do governo federal que atenda às necessidades do pequeno produtor. "Por enquanto, o governo federal está jogando dinheiro em um saco sem fundo."