Título: Governo proíbe anestésico suspeito
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Fonte: O Estado de São Paulo, 22/03/2006, Vida&, p. A18

Dois medicamentos da empresa Hipolabor teriam provocado a morte de duas mulheres nos últimos sete meses

O Ministério da Saúde proibiu a distribuição, o comércio e o uso em todo o País de dois anestésicos produzidos pela empresa Hipolabor Farmacêutica. Uma mulher morreu no sábado depois de receber os medicamentos numa cirurgia no hospital de Santa Luzia, cidade da região metropolitana de Belo Horizonte. Outras sete mulheres passaram mal na semana passada sob condições semelhantes e no mesmo hospital. Todas haviam sido submetidas a cesarianas ou cirurgias no útero.

As proibições cautelares foram publicadas ontem no Diário Oficial da União e valem para o cloridrato de bupivacaína (lote AR 001/05) e o cloridrato de lidocaína 2% (lote LL 239/05). Ambos são fabricados pela Hipolabor, que tem sede em Sabará, na região da capital mineira.

Ainda não se sabe se a responsabilidade foi dos anestesistas, do hospital ou do laboratório farmacêutico. Os casos estão sendo investigados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e pela Vigilância Sanitária de Minas Gerais. Os resultados da investigação - que inclui a análise dos medicamentos e o exame médico do cadáver da mulher - devem sair até o fim de abril. O laboratório diz que os dois anestésicos "atendem rigorosamente a todas as exigências técnicas".

ANTECEDENTES

Essa não foi a primeira vez que os anestésicos da Hipolabor causaram problemas. No segundo semestre do ano passado, uma mulher morreu e outras nove passaram mal no Estado de São Paulo depois de serem anestesiadas com o cloridrato de bupivacaína. Em todos os casos, as pacientes estavam em trabalho de parto.

A morte ocorreu em agosto, em Mairiporã, na Grande São Paulo. As outras mulheres tiveram náuseas, vômitos, tremores, cefaléia e diminuição de consciência. Na época, a Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo divulgou um alerta aos médicos destacando os riscos do uso do cloridrato de bupivacaína. Amostras do anestésico suspeito foram enviadas ao Instituto Adolfo Lutz, mas não foi encontrado nenhum problema.

De acordo com a Anvisa, existem mais quatro casos suspeitos de reações adversas no Estado de São Paulo em decorrência do uso desse medicamento. E outros quatro no Amazonas envolvendo o outro anestésico. Os lotes interditados são compostos por 14 mil doses de lidocaína e 8 mil de bupivacaína.

No fim do mês passado, a Secretaria de Saúde do Amazonas também notificou a Anvisa de reações alérgicas que quatro pessoas tiveram após serem anestesiadas. Os casos ocorreram em uma clínica particular de Manaus e envolveram o cloridrato de lidocaína da Hipolabor. Procurada pelo Estado, a Vigilância Sanitária não informou se os pacientes eram mulheres e estavam grávidas, como em São Paulo.

No dia 26, a suspeita era de que as quatro pessoas que passaram mal estivessem com meningite porque apresentaram convulsões. A UTI do hospital chegou a ser interditada. Depois dos exames, constatou-se que era uma reação alérgica, por fim atribuída ao anestésico.

CONFUSÃO MENTAL

A mulher que morreu em Minas no sábado foi a dona de casa Zélia Ferreira Elpídio, de 30 anos. Ela passou mal no Hospital São João de Deus, em Santa Luzia, após uma cesariana. Seu filho nasceu e passa bem. Ela teve de ser transferida para o Hospital Evangélico, de Belo Horizonte. Morreu uma semana depois.

Das sete mulheres que sobreviveram, duas continuam internadas na capital e devem ter alta logo. A babá Rosângela Porto, que já não corre risco de vida e foi liberada, disse que sentiu fortes dores na nuca e teve confusão mental. "Só comecei a melhorar depois que fui medicada", conta.

EXPLICAÇÃO

O Hospital São João de Deus, o único de Santa Luzia, é filantrópico e atende cerca de 7 mil pessoas por mês. Passa por reformas e, mesmo assim, mantém o atendimento normal. A direção criou uma comissão para investigar o caso. "Não há a mínima hipótese de infecção hospitalar", afirmou Paulo Auais, diretor clínico do hospital.

A empresa Hipolabor só comentaria o caso após os resultados da investigação da Vigilância Sanitária. Em nota, disse que os problemas "podem estar ligados a outros fatores que não o medicamento". Afirmou também que seus produtos têm registro na Anvisa. "Possuímos qualidade assegurada."