Título: Argentina inicia o abate de gado
Autor: Ariel Palacios
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/02/2006, Economia & Negócios, p. B1

No fim de semana, foram mortos 234 animais suspeitos de contaminação com aftosa, na província de Corrientes

O Serviço Nacional de Sanidade e Qualidade Agroalimentícia da Argentina (Senasa) começou o abate de animais contaminados pela febre aftosa no município de San Luis del Palmar, na Província de Corrientes, no nordeste do país, próximo às fronteiras com Paraguai e Brasil. No fim de semana, as autoridades sanitárias eliminaram 234 cabeças de gado. Hoje, devem abater mais 570. O foco inicial, encontrado há nove dias, era de 70 animais infectados.

As autoridades não descartam a hipótese de, nos próximos dias, matar os mais de 3 mil bovinos existentes na fazenda San Juan, onde foi encontrado o foco, além de dezenas de animais das fazendas vizinhas.

Os animais eliminados foram enterrados na própria fazenda San Juan, do ex-caudilho José Romero Feris, um dos mais famosos do país por estar envolvido em corrupção.

O Senasa considera a possibilidade de o ressurgimento da aftosa na Argentina ter sido causado pela entrada, no país, de gado infectado contrabandeado. Associações ruralistas concordam e sustentam que o foco em Corrientes vai afetar a imagem de toda a produção bovina do país.

José Latorre, diretor do Centro de Virologia Animal do Conselho Nacional de Pesquisas Técnicas e Científicas (Conicet), uma das instituições científicas mais respeitadas da Argentina, sustentou que o foco de aftosa deve ser resultado de contrabando.

O veterinário que localizou o foco em Corrientes, José Buongiorno, afirmou que podem existir mais focos de aftosa no resto da província que não foram notificados pelos fazendeiros. Ele suspeita que a aftosa estava presente na região, mas que "alguém escondeu".

Fontes citadas pelo jornal dominical portenho Perfil afirmam que o surgimento da aftosa, logo na época em que o governo está travando uma dura batalha com os pecuaristas para conseguir redução do preço da carne no mercado interno, "não é coincidência". A queda do preço seria inevitável, já que as exportações vão despencar.

Na sexta-feira, o presidente Néstor Kirchner definiu o aparecimento da aftosa em Corrientes como "um problema que às vezes acontece". Para os produtores locais, a notícia teve tons de catástrofe. Analistas calculam que o "problema ocasional" custaria ao país perdas entre US$ 250 milhões e US$ 500 milhões em exportações de carne bovina. Além disso, eliminaria a chance de vender mais de US$ 300 milhões em carne para mercados que analisavam a abertura de negócios com a Argentina, como Estados Unidos e Canadá.

Segundo a Confederação Rural de Buenos Aires e La Pampa (Carbap), o fechamento dos mercados internacionais resultará em prejuízos de mais de US$ 700 milhões neste ano. O presidente da Sociedade Rural, José Miguens, declarou ontem que os produtores perderão US$ 100 milhões por mês por causa da aftosa.

Desde quarta-feira, quando o governo anunciou oficialmente a volta da aftosa ao país (onde havia sido erradicada em 2003), 11 países já declararam a suspensão parcial ou completa das importações de carne argentina. Para evitar o que os produtores definem como "uma catástrofe", os negociadores argentinos em Bruxelas tentarão convencer a União Européia a suspender só a compra de carne produzida em Corrientes, poupando do embargo o produto proveniente do resto do país.

Existe grande expectativa em relação à decisão das autoridades sanitárias da União Européia esta semana, sobre a continuidade ou não da autorização da entrada de carne argentina. Os europeus compraram em 2005 US$ 430 milhões de carne desse país, o equivalente a 38% das vendas do produto argentino ao exterior.

NÚMEROS

70 animais

era o foco inicial da doença

3 mil cabeças

pode ser o total de abates por causa da febre aftosa

US$ 500 milhões é quanto a Argentina vai perder por deixar de exportar carne, calculam analistas

US$ 300milhões

era quanto o país pretendia ganhar vendendo carne para os EUA e Canadá

US$ 430 milhões foi quanto a UE comprou de carne argentina em 2005

38% das exportações de carne da Argentina foram para a Europa em 2005