Título: Edemar, do glamour à reclusão
Autor: Daniel Hessel Teich
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/11/2005, Economia & Negócios, p. B15

Empresas na mira dos investigadores Dono do falido Banco Santos passa a maior parte do tempo em sua mansão, com a mulher e o filho caçula

Concebida para grandes festas e jantares, a imensa mansão do ex-banqueiro Edemar Cid Ferreira, dono do falido Banco Santos, tem passado a maior parte do tempo às escuras. A vasta galeria abarrotada de obras de arte, capaz de acomodar até 250 pessoas, e a sala de jantar para 20 convivas estão às moscas. Um ano após a intervenção no banco, a família Cid Ferreira - Edemar, a esposa Márcia e o filho caçula Eduardo - ocupa apenas a ala íntima da casa de cinco andares no bairro do Morumbi. Desde que perdeu o comando de seu banco, em 12 de novembro do ano passado, o ex-banqueiro montou um escritório improvisado nos dois quartos de hóspedes da mansão. Ali, passa os dias lendo cópias dos processos em que é acusado de quebrar seu próprio banco, de cometer fraude, de evasão de divisas, lavagem de dinheiro, entre outros crimes. Tenta montar uma estratégia de defesa convincente que o livre dos oito anos de prisão que está sujeito, caso seja condenado.

Nos últimos meses, a vida de Edemar tem sido a de um recluso. As visitas praticamente acabaram e as saídas da mansão se limitam a idas ao dentista, aos escritórios de seus advogados e às audiências judiciais. "Na verdade, acho que que ele tem medo de sair na rua, ir a restaurantes", conta um dos poucos amigos que mantém contato com o banqueiro. "Mas ele não demonstra nenhum abatimento. Edemar acredita que pode sair dessa."

Até que isso ocorra, a nova ordem determinada pelo patrão, na mansão avaliada em R$ 50 milhões, é economizar. A piscina aquecida foi desligada, as luzes exteriores da casa e dos jardins se mantêm apagadas à noite. O batalhão de empregados foi reduzido. Guarda-costas e seguranças foram dispensados.

Num de seus depoimentos à Justiça, Edemar declarou que vive com R$ 200 mil por mês provenientes de ajuda de amigos e de aluguéis. Também já disse que não tem pago nem mesmo seus advogados. O ex-banqueiro vive uma pendenga com a seguradora Unibanco AIG, que se recusou a custear sua defesa e a de outros diretores do banco. Antes da quebra do Santos, Edemar havia feito um seguro especial para executivos metidos em enrascadas jurídicas, em nome da Procid Participações e Negócios, a holding que controla os negócios financeiros do banqueiro, no valor de R$ 15 milhões. A seguradora não paga porque o seguro não cobre casos de fraude.

Apesar da aparente decadência, Edemar e família estão longe de serem pobres. Sua esposa, Márcia de Maria Cid Ferreira, com quem é casado em regime de separação de bens, tem diversas empresas no Brasil e no exterior, para onde a Justiça suspeita ter sido desviado dinheiro do banco. Entre elas está a Maremar, cujo capital na época da intervenção era de R$ 600 milhões. Márcia controla empresas que detêm todos os bens da família, da mansão à coleção de arte.Todas têm como sócias majoritárias empresas sediadas em paraísos fiscais.

O Ministério Público de São Paulo tenta estruturar uma medida legal que permita incluir no processo de falência outras empresas ligadas a Edemar e com isso arrecadar dinheiro para pagar os credores. É uma tarefa que não será nada fácil.

NOVA ETAPA: O Ministério Público Federal e a Polícia Federal se preparam para uma nova fase nas investigações sobre irregularidades praticadas no Banco Santos. A investigação será estendida às empresas que eram clientes e participaram das operações de reciprocidade em que o banco concedia recursos sob a condição de que parte do valor seria reinvestido na compra de títulos de coligadas à instituição."Todas essas empresas acabaram sendo coniventes com os crimes do banco", diz o procurador da República Sílvio Luís Martins de Oliveira, responsável pela denúncia criminal de Edemar e outros 18 diretores do banco.

As irregularidades são tantas que os próprios investigadores não sabem se um dia conseguirão dar cabo de todas as fraudes que foram cometidas no banco. É o que acontece, por exemplo, em operações em que o Santos e suas coligadas internacionais funcionavam como se fossem doleiros em operações maquiadas para a remessa de recursos do exterior para o Brasil sem tributação, conhecida como "dólar cabo". Cinco grandes empresas são suspeitas de terem recebido repasses de R$ 120 milhões, correspondentes a depósitos realizados em valores equivalentes em dólares nas contas das empresas offshore ligadas ao banco. Apesar das operações estarem registradas nos arquivos do banco, os investigadores consideram praticamente impossível saber o que aconteceu com o dinheiro depositado nas contas no exterior.