Título: 26 mil à espera de perícia no INSS
Autor: Paulo Baraldi
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/11/2005, Nacional, p. B5

Número é só do Estado de São Paulo, o mais afetado pela paralisação de médicos credenciados da Previdência desde 25 de outubro

Eram quase 7 horas da manhã e Priscila Vieira da Cruz era só mais uma entre centenas de pessoas numa enorme fila em volta do quarteirão do posto do INSS na Avenida Santa Marina, zona oeste de São Paulo. Ela tentava remarcar uma perícia médica para o seu marido, Wanderley, agendada para segunda-feira da semana passada. Mas o médico não o atendeu. Como o marido de Priscila, 26 mil pessoas ficaram sem passar pelos médicos credenciados do INSS desde o dia 25 no Estado de São Paulo, segundo estimativa da recém-criada Associação de Médicos Peritos Credenciados pelo INSS (Ampci). Em situação igual à do médico que deveria atender Wanderley, há outros 340 no Estado, conforme a associação. Eles querem receber as perícias que fizeram de julho até agora, ainda não pagas pela Previdência por falta de verba.

Segundo o INSS, os números da Ampci estão superestimados. O órgão calcula que aderiram ao movimento 51 médicos na capital, onde foram remarcadas 2.650 perícias. Ontem, os 12 profissionais credenciados de Santo André, no ABC paulista, aderiram a paralisação. No posto local, a estimativa é que a consulta seja remarcada em dez dias. Em São Paulo, onde o movimento é mais forte, conforme o instituto - nem a Ampci tem dados de todo o País -, a previsão é de um mês.

Wanderley, que era mecânico autônomo, levou dois tiros durante um assalto e teve de parar de trabalhar. Para cuidar do marido, Priscila também pediu demissão do emprego de telemarketing. Desde então, eles não têm renda. "Está tudo atrasado em casa", diz ela, se referindo até ao aluguel de R$ 300.

O casal tem um filho de quatro anos. Enquanto o mecânico não passar pela perícia, não poderá receber o auxílio-doença. Wanderley esperava há um mês pela consulta. "Na outra vez, cheguei às 5h30 e só saí 16h30", conta Priscila.

"Tem dia que procuro arroz para comer e não tem", afirma Glória Maria da Costa Cândido, que tem quatro filhos e foi afastada da atividade de serviços gerais há seis anos. Glória, que recebe R$ 450 de auxílio-doença, sofre de problemas na coluna, pressão alta e varizes. "Eu quero que me aposentem por invalidez logo, não agüento mais isso." Sua perícia estava agendada, há seis meses, para o dia 27 de outubro. "Tem dia que nem levanto da cama."

Os médicos peritos que não integram o quadro do INSS (os credenciados) se movimentam porque não recebem desde julho. A dívida do governo, que paga R$ 21 por cada perícia, é de R$ 33 milhões. As consultas feitas em junho foram pagas no fim do mês passado, depois de um manejo na receita para conseguir R$ 9 milhões.

O problema é que a dotação orçamentária para pagar os 2.749 médicos credenciados da Previdência, de R$ 77 milhões, acabou em maio. "As greves fizeram com que as perícias dos médicos do quadro de funcionários passassem a ser atendidas pelos credenciados, o que aumentou muito o volume", diz o secretário-geral da Ampci, João Baptista Baptistella Junior. Cada médico credenciado pode fazer 24 perícias por dia.

A partir de 18 de fevereiro, os médicos credenciados serão dispensados. O governo tem de contratar mais 1,5 mil concursados e atender à demanda, de acordo com a Lei 10.876/04. Segundo o presidente do INSS, Valdir Moysés Simão, desde outubro, 65% das perícias são feitas pelos 3.537 médicos do quadro.

"Agora, com a paralisação, eles terão de assumir um número maior. Em troca, vamos oferecer gratificação de produtividade", diz Simão. Ele prevê um transtorno no postos. "Mas eles (peritos credenciados) estão no direito deles", admite. Em outubro, a Previdência concedeu 194 mil auxílios e pagou R$ 1 bilhão a todos os ativos no cadastro.